Dona Lucilia formou seu filho na mentalidade contrarrevolucionária que proporciona a respeitabilidade e o verdadeiro equilíbrio no relacionamento com os outros. Bem o contrário da mentalidade igualitária, segundo a qual a amizade consiste em vulgarizar-se.
Havia uma coisa curiosa na respeitabilidade de Dona Lucilia: era tão evidente que, a bem dizer, saltava aos olhos. Porém, de outro lado, a maior parte das pessoas via essa qualidade de modo muito diminuído, muito embaçado.
Elevar-se para ver com mais profundidade
Seria mais ou menos como uma pessoa que sofresse de uma doença na vista e, olhando para os objetos, visse tudo embaçado. Perceberia, por exemplo, haver quadros numa sala, mas já não saberia distinguir as figuras neles representadas.
Assim se dava em relação a mamãe: as pessoas, em geral, viam a figura global dela, nada mais do que isso.
Não a vendo senão assim e, nas conversas, tratando de temas alheios aos que ela levantaria, tais pessoas, por assim dizer, empurravam involuntariamente muito para dentro o que ela tinha de melhor, habituando-a a não manifestar aquilo diante delas, porque se Dona Lucilia fosse se afirmar como era, romperia as condições de convívio com elas.
Assim como um rei, enquanto transcende seu reino, se assemelha a Deus, também uma pessoa, no círculo de suas relações privadas, pode, neste sentido da palavra, transcender os demais.
Ora, o princípio que eu sustento é o de que quem transcende verdadeiramente, quanto mais se eleva, tanto mais tem profundidade para querer bem aos outros, para descer até eles, ser um só com eles, afagá-los e protegê-los.
Um exemplo lindo disto é a gaivota que quanto mais sobe, melhor prepara o mergulho para pegar o peixe. Do alto ela vê, no fundo do mar, o peixe que ela quer pescar, numa afirmação de que é subindo que se vê com profundidade.
Um simulacro de afeto
Este é o ponto que os conceitos igualitários da Revolução Francesa fizeram esquecer por completo. Trata-se de uma verdade não só negada, mas ignorada, eliminada do mapa humano e tirada, subtraída do equilíbrio afetivo do homem. Ora, é no reto relacionamento entre estes dois aspectos — elevação e profundidade — que se encontra o equilíbrio afetivo.
A Renascença negou isso a ponto de as pessoas se esquecerem de que se possa ser assim.
Há uma necessidade, até para ter bons nervos, de sentir as coisas dessa maneira. Quando o sujeito não tem isto em vista, ele não encontra o fundamento, o ponto de apoio verdadeiro no afeto dos outros; é um afeto puramente consuetudinário, o hábito quase animal de conviver com certas pessoas que lhe dá um simulacro de afeto.
Resultado: torna-se muito inseguro, sentindo a necessidade de viver se afirmando diante dos outros sob pena de ser posto de lado, e vê-se na contingência de não poder confiar em ninguém. Como consequência desata-se uma série de desastres morais que eu nem sei medir!
Seria preciso considerar isso em Nosso Senhor para que, então, as pessoas pudessem encontrar paz para suas almas.
Entretanto, criou-se uma tão abominável ignorância a este respeito, que as pessoas ficam não como um cego, mas como alguém de quem se tenha arrancado os olhos de dentro das órbitas.
O próprio tema do igualitarismo — que está no centro do problema da Revolução e da Contra-Revolução — está relacionado com isso.
A bondade não consiste em vulgarizar-se
Embora já explicada do ponto de vista metafísico, a questão do igualitarismo não foi ainda devidamente elucidada em seu aspecto psicológico. A meu ver, o modo pelo qual a psicologia do anti-igualitarismo se descreve é o seguinte:
A mentalidade do anti-igualitário é construída na negação da gnose, a qual odeia o Deus transcendente e quer afirmar um “pan-deus” imanente em tudo. E esse modo de ser que descrevi há pouco afirma o Deus transcendente, em todo seu fausto e em toda sua bondade, e nega a imanência igualitária de uma divindade em todas as coisas.
Assim, psicologicamente falando, enquanto o indivíduo não tiver chegado a este ponto de que estou tratando, não saberá impostar-se contrarrevolucionariamente. Porque, se ele tem a ideia de que a bondade, a amizade consiste em vulgarizar-se, está tudo arrasado.
Quem tem a ideia de que ser transcendente em relação a alguém — no sentido de participar da transcendência de Deus, único ser verdadeiramente transcendente — significa desprezar a outrem, desejar não ter parte com ele, querer afirmar a distância, esse é um revolucionário.
Pelo contrário, se ser transcendente é ir ao fundo do outro, dar o maior fundamento à verdadeira amizade, à autêntica união, ao verdadeiro carinho, então compreende-se que a Revolução é maldita e o contrarrevolucionário encontra o equilíbrio para sua alma.
Portanto, é muito explicável, muito belo e muito bom que minha mãe me tenha formado nessa mentalidade. Qualquer alma católica só pode achar isso bonito, adequado, congruente.
(Extraído de conferência de 20/4/1985)