sábado, noviembre 23, 2024

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Proclamando as verdades sem rebuços

Em suas pregações, o Beato Ângelo de Acri increpava os pecados praticados por muitos de seus ouvintes, e depois os animava para terem muita confiança em Nossa Senhora. Como na Vendée, também na região evangelizada pelo Beato Ângelo surgiu um movimento contrarrevolucionário que lutava a favor da Santa Sé.

No dia 30 de outubro, temos a festa do Beato Ângelo de Acri. Os dados biográficos que serão comentados foram tirados da obra Vida dos Santos, do Padre Rohrbacher1.

Infatigável apóstolo do Sul da Itália

Ângelo, que seria o grande e infatigável apóstolo do Sul da Itália no decorrer do século XVIII, nasceu no dia ١٩ de outubro de ١٦٦٩, em Acri, na Calábria. Filho de operário, ingressou na Ordem dos capuchinhos, onde foi missionário por cerca de quarenta anos.

Seus sermões atraíam milhares de ouvintes e o número de conversões era impressionante. Recebeu uma especial graça para conduzir os infiéis à Fé, e previu os males que a Filosofia do seu século faria à Religião.

Contam seus biógrafos que o seu primeiro sermão deveria ser pregado na Quaresma. Ângelo preparou-se longamente, estudando e planejando. Foi um fracasso. Entristecendo-se sobremaneira, implorou a Deus que o socorresse, fazendo-lhe ver o que Ele queria.

Ouviu então uma voz misteriosa que lhe disse: “Eu sou Aquele que é. Nada temas, Eu te concederei o dom da palavra e teus trabalhos jamais serão inúteis. Para o futuro, pregarás somente num estilo simples, a fim de que todos possam compreender bem as tuas palavras.”

O Bem-aventurado compreendeu, então, o que era importante realmente. Queimou os sermões que preparara e desde aquele dia só consultou a Bíblia, não abandonando também o seu Crucifixo.

Guardião do convento de Acri, Ângelo mais tarde foi provincial. Sua vida foi toda de grandes e frutuosos trabalhos apostólicos, e cheia de milagres. Atravessava correntes de água a pé enxuto e, muitas vezes, em tempo incrivelmente curto, venceu longas distâncias para confessar um doente ou pregar em longínquas aldeias. Cego, durante um período de sua vida, recuperou a vista para celebrar a Missa e rezar o Ofício.

Aos 30 de outubro de 1739, com setenta anos, entregou a alma ao Criador, que servira sem descanso. Foi beatificado por Leão XII, em 1825.

O século da elegância, da distinção, do bom gosto…

Vemos resumida aqui a vida de um desses padres famosos que deram o perfil ao missionário da Ordem dos capuchinhos, os quais constituíram um dos exércitos mais adiantados e eficientes da causa contrarrevolucionária da Igreja, no século XVIII.

Para compreendermos bem isto, precisamos ter uma ideia do século XVIII, quais eram seus desmandos, como também suas qualidades, e nos colocarmos um pouco em face do que era a Ordem Capuchinha e sua missão especial naquele tempo.

Aquele foi o século no fim do qual se deu a Revolução Francesa, em 1789, estendendo-se, conforme se queiram contar os prazos, até 1821, com a morte de Napoleão. Foram, portanto, mais ou menos trinta anos de revolução contínua, uma das maiores revoluções da História. Mas esta enorme Revolução, durante todo o século XVIII, não deixou de fermentar continuamente, de maneira que, tendo recebido maus fermentos de protestantismo do século XVI, e no século XVII, no século XVIII, estes fermentos chegaram a uma espécie de intumescimento enorme que se fixava de preferência em determinadas classes sociais e se caracterizava com traços especiais.

O século XVIII foi, de um lado, a época na qual certos predicados de civilização, nascidos da Igreja Católica, chegaram ao seu pleno apogeu. Foi o século da elegância, da distinção, do bom gosto, das belas maneiras, de grandes literatos, de grandes artistas, da vida de corte levada ao seu mais alto grau de florescimento.

Mas como todas as coisas neste mundo, mesmo quando são boas, só conseguem evitar a sua própria deterioração e putrefação quando são profundamente unidas à Igreja, e como, infelizmente, no século XVIII havia um divórcio cada vez maior entre a sociedade e a Igreja, aconteceu que essas qualidades nascidas da Civilização Cristã eram deterioradas pela impiedade do século.

…deteriorou-se pela fragilidade, moleza, sentimentalismo

Temos, então, este paradoxo: foi o século da delicadeza por excelência, mas de uma excelência deteriorada até a fragilidade, a moleza e a uma espécie de exagero de sentimentalismo. Foi o século da distinção, mas também da sensualidade. Nós poderíamos colocar em colunas as várias qualidades e as antíteses destas. Uma espécie de protuberância da luz primordial2 e, ao mesmo tempo, de explosão do pecado capital da Europa. No final do século XVIII, naturalmente, as qualidades deterioradas estavam sobrepujando de muito as boas. Como resultado, eclodiu a Revolução Francesa.

As classes sociais principalmente afetadas por esta deterioração eram as elites. Há um provérbio antigo o qual diz que o apodrecimento do peixe começa pela cabeça. Assim também a putrefação de qualquer sociedade tem seu início nas classes mais altas.

Naquele tempo, quais eram essas classes? O clero, que era a primeira; a nobreza, segunda classe social; e depois a alta burguesia, muito rica e, por isso, muito chegada à nobreza, tendendo mesmo a se misturar com ela.

Clero, nobreza e burguesia entraram em decadência

É doloroso dizer, mas o clero estava tão trabalhado pelo espírito do tempo, pelo ateísmo, pela libertinagem, pelo gosto dos costumes depravados, que não era raro encontrar padres, bispos e até cardeais declaradamente ateus. Recebiam cargos eclesiásticos que, na sociedade daquele tempo, eram considerados muito rendosos, e levavam depois uma vida absolutamente como qualquer civil.

Os conventos de freiras eram um pouco mais moralizados do que os de frades. Mas mesmo aqueles eram uns depósitos de solteironas. As famílias eram muito numerosas, e as da nobreza muitas vezes não tinham dinheiro para manter no estado nobiliárquico todas as suas filhas. Então, empurravam para as Ordens religiosas as filhas que não tinham condições financeiras para manter. Estas, portanto, ingressavam nas Ordens religiosas sem vocação. Eram conventos ricos que proporcionavam uma vida muito farta e cômoda às freiras que, podendo manter relações sociais, levavam uma vida mundana e tranquila, sem preocupações econômicas.

Alan Curto (CC3.0)
Basílica dedicada ao Beato Ângelo, Acri, Itália

Os homens da nobreza conservavam a valentia dos antigos tempos, sendo habitualmente muito bons guerreiros. Na sociedade, eram fidalgos brilhantes, mas também profundamente afastados da prática da Religião e entregues aos prazeres da vida.

A alta burguesia procurava macaquear a nobreza como podia, meter-se nela por meio de casamentos com membros da nobreza empobrecida, de maneira a subir. Assim, a burguesia, que fora no século XVII uma classe muito moralizada, estava se contaminando com todos os defeitos da nobreza.

Deus suscita Ordens religiosas para preservar o povo dos erros da Revolução

Contudo, o povo ainda não tinha sido penetrado a fundo por todas essas deformações inerentes à impiedade, ao ateísmo, ao enciclopedismo e aos erros filosóficos e morais do século XVIII. Sobretudo, quando se tratava do povinho que morava nas cidades médias e pequenas ou no campo.

Tratava-se, portanto, de realizar a contraofensiva na Igreja, num sentido contrarrevolucionário, em duas linhas completamente diferentes: na alta sociedade e no povo.

Atuando junto à alta sociedade houvera antigamente a Companhia de Jesus que, de fato, nos tempos heroicos da Contra-Reforma, prestou altos serviços designando seus membros para serem confessores de reis, príncipes, cardeais, papas, grandes senhores feudais, burgueses influentes e, com isto, concorrendo para orientar bem a alta sociedade. Os jesuítas possuíam grandes intelectuais, escritores, oradores e muito bons políticos. Porém, ao longo do século XVII, a Companhia de Jesus entrou em decadência e no século seguinte foi fechada, em parte por suas qualidades, em parte por seus defeitos.

A alta sociedade rolava, assim, para o caminho da apostasia, não sendo suficiente a ação de grandes Santos, como Santo Afonso Maria de Ligório e o Bem-aventurado Inocêncio XI, para conter a avalanche da impiedade.

Fazia-se necessária uma Ordem religiosa que tratasse de segurar pelo menos o povinho dentro da prática da Religião. Para isto, Deus Se utilizou, em boa medida, da Ordem dos capuchinhos, que constituía o ramo mais austero da família franciscana, e cujos pregadores eram missionários voltados principalmente a evangelizar o povo. Para isso, deveriam ser pregadores populares, dizer as verdades claramente e representar, por todo o seu modo de ser e de agir, a Religião Católica nas virtudes que o século negava. De fato, no século XVIII, a Ordem capuchinha brilhou por vários missionários dotados dessas qualidades, os quais concorreram muito para evitar que o povinho se tornasse revolucionário.

Beato Ângelo operou um número enorme de conversões

Vemos, por esta narração da vida do Beato Ângelo de Acri, como ele era um homem extraordinariamente adornado de qualidades para isso. Deus o suscitou para uma parte da Europa até havia pouco tempo era a menos desenvolvida da Itália, ou seja, o Sul do país, a Calábria, a ilha de Sicília. Um território montanhoso, com acessos difíceis, levando-se muito tempo para as locomoções, com muito banditismo que atacava os transeuntes quando se deslocavam de um lugar para outro, dificultando as missões se exercerem corretamente.

Ele, um homem do povo, quis começar como pregador fazendo uma grande homilia, mas a Providência lhe deu uma grande lição. Nada de sermões rebuscados. Estes devem ser simples, dizendo clara e diretamente as verdades. Ele, que preparara um portentoso sermão, foi fazê-lo… grande fracasso. Aí ele tomou a lição, chorou aos pés de Deus e Ele lhe fez conhecer que deveria fazer pregações simples, inspirados na doutrina da Igreja, portanto também na Revelação – da qual a doutrina da Igreja não é senão uma explanação e uma interpretação autêntica –, e que precisaria dirigir-se ao povo com linguagem compreensível por todo mundo, falando mais pela piedade do que pelos grandes argumentos. Porque o pregador popular deve ser assim.

Depois Deus fez com que as suas palavras fossem tocadas pela graça, produzissem um número enorme de conversões. Essas conversões não vinham das sublimidades dos argumentos por ele invocados, mas do contágio da santidade do pregador, da solidez de sua doutrina, da simplicidade de sua linguagem, e do efeito que sua personalidade operava sobre os ouvintes.

De fato, sua santidade era contagiosa; os ouvintes escutavam suas palavras e ficavam entusiasmados, convertendo-se em grande quantidade.

No que consistia essa conversão? Eram pessoas que, por ignorância e falta de bons pastores, tinham abandonado a Religião. E o Beato Ângelo as levava em quantidade de volta à prática da Religião. Tratava-se, portanto, de pessoas católicas, na sua raiz, mas esfriadas. Portanto, eram esses católicos tíbios que ele convertia.

A Providência lhe concedeu o dom dos milagres

Danilo I.
Púlpito da Catedral de São Salvador, Jujuy, Argentina

Para tornar a sua pregação mais eficiente ainda, Deus lhe concedeu o dom dos milagres. Por exemplo, o mundo convenciona como sendo grande o milagre da travessia do Mar Vermelho, a pé enxuto, pelos judeus. Ora, o Beato Ângelo de Acri, por diversas vezes, aos olhos do povo atônito, atravessava cursos de água, torrentes, rios, e chegava seco do outro lado.

Ou então se dirigia com rapidez a lugares de acessos extremamente complicados. As pessoas viam que o frei tinha percorrido rapidamente uma distância enorme, quando nenhum cavalo podia levar um cavaleiro nessa velocidade. Logo, o milagre estava patente.

Podemos imaginar a impressão disso sobre o povinho, que não entende muito os argumentos apologéticos, mas que, vendo o pregador bom operar esses milagres, ficava entusiasmado e aclamava: “Deus está entre nós!” Aplausos e estava feita a conversão.

Que halo de santidade se constituía em torno desse pregador! Um homem alto ou baixo, magro ou gordo, pouco importa, revestido de simples burel franciscano, próprio a quem abandonou todas as pretensões da Terra, com o Rosário em cujo ponto de junção das três partes encontra-se o crânio de uma caveira, para indicar que o capuchinho deve ter a morte constantemente diante dos olhos. Grandes jejuns, sandálias com os pés aparentes, mortificação, abandono de todas as coisas, grande barba, numa época em que ninguém a usava, ou até mesmo era ridículo e feio deixá-la tão longa. Tonsura, com aqueles dois sulcos próprios dos franciscanos da era constantiniana.

Nos sermões atacava principalmente os erros da época

Imaginem a impressão causada por tudo isso numa igrejinha qualquer encarapitada num monte da Calábria, onde havia uma aldeiazinha com cem, duzentas pessoas, ao ser noticiada a vinda do padre! O sino da aldeia tocava, todos os camponeses dos arredores vinham trazendo suas crianças. Então, faziam uma grande concentração na cidade para ouvirem embevecidos a palavra do frade. Noitinha, mês de Maria, a igreja iluminada com poucas velas, porque eram pobres e não tinham dinheiro suficiente para fazer um culto estupendo. Começavam, presumivelmente, com cânticos, entoados por bonitas vozes afinadas, como as há no Sul da Itália; um cântico esplêndido, por exemplo, uma ladainha em honra de Nossa Senhora.

De repente, cessa tudo e o frei, tido como santo, sai da sacristia e sobe ao púlpito arranjado segundo o clássico sistema capuchinho: o Crucifixo fixado no púlpito, um pouco em diagonal. O pregador se ajoelha, enquanto o coro canta a Ave-Maria. Percebe-se que o Santo reza. O público fica à espera de que, a qualquer momento, ele se levante e realize um milagre. Frei Ângelo se ergue com singeleza e começa a falar, como diz a ficha, atacando principalmente os erros da época e exercendo aquela forma de eloquência popular e máscula, que caracterizou os capuchinhos, a qual consistia em larga medida não apenas em ensinar o bem, mas em vituperar o mal.

Por vezes, segundo a praxe dos capuchinhos do tempo, dirigia-se às pessoas do auditório para censurar algum costume ou vestimenta imoral: “A senhora ali, vestida com tal traje, se dá conta de que esse decote é uma ofensa a Deus? A senhora não tem vontade de se cobrir com o xale de sua amiga que está ao lado? Tenha a bondade de fazê-lo.” Isso, no povo italiano do Sul, muito vivo, produzia comentários: “A Pepa agora ficou com a cara no chão!”

Ou então desvendando o estado de alma de um ou outro ouvinte: “O senhor pensou tal coisa, mas não é verdade.” O indivíduo formula por dentro uma objeção e o pregador diz: “Também isto que o senhor acaba de cogitar é errado, por tal razão.”

Após esbordoar o auditório, falava da confiança em Nossa Senhora

Compreende-se o impacto disso sobre a população. O zelo aumenta, o entusiasmo ferve, acentua-se a sensação de que Deus está presente, enfim mil movimentos interiores da alma se fazem sentir.

Depois de ter esbordoado bem seu auditório, começava então a parte da misericórdia, da bondade: “Não desespereis, confiai em Nossa Senhora, Mãe de toda bondade!” Cita algum episódio bonito do Evangelho, e termina recomendando a oração e a confiança ilimitada em Deus. Choro e contrição. O padre espera acabar a bênção do Santíssimo Sacramento, vai para o confessionário e fica às vezes até de manhãzinha, na hora da Missa, ouvindo os pecados daquela gente e dando a absolvição, recomendando penitência.

Três, quatro dias da estada de um padre assim numa paróquia, e ela estava regenerada. Durante anos citavam-se de memória trechos de seus discursos. Contavam-se casos narrados por ele, apontavam-se milagres… A passagem daquele padre por lá era como uma bênção que deixava um perfume durante anos, às vezes ao longo de uma geração inteira. Assim passava um capuchinho do grande estilo e da grande clave por aquelas populações.

O movimento dos sanfedistas

Os resultados eram apreciáveis. Por exemplo, São Luís Maria Grignion de Montfort, grande missionário, pregou na Vendée, e aquela região da França veio a ser foco da reação contra a Revolução Francesa. Sabe-se menos frequentemente que houve uma espécie de Vendée nessa zona evangelizada pelo Beato Ângelo de Acri, que foi o movimento dos chamados sanfedistas, camponeses que lutavam contra os erros da Revolução e a favor da Santa Sé, tendo à sua frente o Cardeal Fabrizio Ruffo, que armou e manteve uma Cruzada no Sul da Itália, esbordoando violentamente os partidários da Revolução. Eram as pregações de homens como o Beato Ângelo que produziam essas transformações e preparavam esses lindos movimentos de alma.

Compreendemos melhor, através desses exemplos, o disparate dos que apresentam os meios clássicos de evangelização da Igreja como decrépitos, peremptos, e proclamam que se a Igreja não se modernizar completamente e não abandonar os seus velhos métodos, não terá fecundidade alguma. Esses, muitas vezes, apresentam como argumento sua própria experiência, dizendo: “Sermão, hoje em dia, não adianta mais. Olhe o resultado do meu sermão! Confissão, nenhum efeito produz. Veja o que acontece quando eu atendo confissões…”

Tem-se vontade de responder: “Não percebe que o mal está em você? É claro, um sermão pregado sem zelo, sem entusiasmo, sem dedicação, à maneira de um burocrata insípido, evidentemente não vai mover ninguém. Para um sermão mover alguém, precisa ser pregado por quem tem Deus consigo. Ora, se você não está junto de Deus é um mundano pervertido com as máximas do século. A quem espera converter? Um perverso não converte, antes perverte quem o escuta. Fosse você um homem como o Beato Ângelo de Acri, veria como de sua pregação sairiam outros resultados. O mesmo se aplica ao Sacramento da Confissão. Esses meios não envelheceram. O problema é que em você entrou em decrepitude a graça. Se você abusa do seu sacerdócio, pelo menos não blasfeme contra ele cunhando-o de ineficaz; reconheça que você não o usa como seria de desejar.”

O traje do capuchinho simbolizava sua ruptura com o mundo

Tivéssemos mil desses Beatos, o Brasil não seria uma outra nação? Nem precisaríamos de televisão para isto. A televisão supre isto? Será que ver um Santo pela televisão é o mesmo que o contemplar na igrejinha velha, no púlpito cuja escada estala quando ele a sobe, mas num contato pessoal de alma a alma, diretamente? Muito mais eficaz do que gravar discos ou filmes para o cinema é a presença pessoal do homem de Deus, com a ação pessoal que ele desenvolve. É isto que verdadeiramente move os homens.

Não sou contrário à televisão católica. Sobretudo não sou contrário à imprensa católica. Isto fica patente por várias atividades que tenho exercido. Mas a própria imprensa, nem de longe, produz o efeito da ação pessoal. Esta é a primeira e a mais eficaz das ações, e é insubstituível. Quando um clero é incapaz de exercer a ação pessoal, ele não é capaz de absolutamente nada. Porque este é o ponto essencial da atuação do clero.

Divulgação (CC3.0)
Cardeal Frabizio Ruffo

O capuchinho produzia um efeito próprio porque o seu traje simbolizava sua ruptura com o mundo. Era um traje em que estava anunciado que ele não tinha nada a ver com o século. Podemos imaginar aquela época em que tantas pessoas usavam roupa com seda magnífica, veludos estupendos, bordados a ouro e prata, formas elegantíssimas, chapéus com plumas, joias magníficas, carruagens que pareciam andores, calçando sapatos de verniz e, sendo nobre, com saltos vermelhos. De repente, chega um capuchinho com aquele burel rústico, pés de fora, e dizendo todas as verdades sem rebuços. Que efeito uma coisa desta produzia!

Devemos abandonar a maldita ideia de que se arrastam os outros, sobretudo, com sorrisinhos e amabilidades de caixeiro-viajante. A habilidade para conquistar uma alma não é a mesma que precisa ter um indivíduo para vender um canivete, uma peteca ou uma laranja. São ações completamente diferentes.

O gemido do mau é uma manifestação de admiração tão segura quanto o aplauso do bom

Precisamos, pois, entrar nos ambientes, como arautos, querendo apenas conquistar as almas para Deus e, portanto, proclamando a verdade à maneira de sinos no alto de um campanário, cujos sons descem e a cidade inteira ouve.

Poder-se-ia objetar que essa atitude não atrai a admiração de ninguém.

Para responder a essa objeção é preciso definir o que é admiração. Habitualmente se tem a respeito da admiração um conceito dos mais primitivos. São objeto de admiração as pessoas que provocam elogios.

Na realidade, o sentimento mais raramente externado pelas pessoas é o da admiração. Pode-se até admirar e ficar quieto, mas a palavra elogiosa não é o sintoma necessário da admiração, porque muitas vezes as pessoas elogiam, mas de fato não admiram. Enaltecem alguém porque é moda, por causa de conveniências de toda ordem.

Qual é o verdadeiro sintoma de admiração? No fundo é admirado aquele que atrai o olhar, em quem se fixam as atenções e provoca a reflexão. Este conseguiu um primeiro grau de admiração. Quando a palavra dita não é aceita, mas se torna algo à maneira de uma batata quente na cabeça do ouvinte, o qual continua durante muito tempo a refutar quem a pronunciou, essa é a prova de que este foi admirado. Ele marcou com o fogo dele aquela alma. Quem disse a verdade pode se tornar objeto de campanha de silêncio, ser criticado, eventualmente expulso. Isso acontecerá precisamente por ele constituir uma dificuldade para a consciência de todo mundo. Este é admirado.

Por certo, a admiração não está, necessariamente, em se fazer expulsar, mas certamente ser expulso, em certas circunstâncias, é uma sólida prova de admiração. Nosso Senhor Jesus Cristo foi admirável em tudo. Ora, o Profeta Simeão disse que Ele tinha sido posto em Israel para que se conhecessem as cogitações de muitos corações. Realmente, assim faz o homem verdadeiramente admirado. Ao bom, ele edifica, deixando na alma a marca da virtude; ao mau, ele abala e incomoda. O gemido do mau é uma manifestação de admiração tão segura quanto o aplauso do bom.

Se tivéssemos tudo isso bem presente no espírito, como seria diferente o nosso apostolado!

(Extraído de conferência de 30/10/1971)

1) Cf. ROHRBACHER, René-François. Vida dos Santos. São Paulo: Editora das Américas, 1959. v. XIX, p. 85-87.

2) Termo cunhado por Dr. Plinio para designar a aspiração que todo ser humano tem para contemplar as verdades, virtudes e perfeições divinas de um modo próprio e único, pelo qual dará sua glória particular ao Criador. Cf. Revista Dr. Plinio n. 54, p. 4.

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