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Idade Média: o Direito consuetudinário

As leis consuetudinárias existentes na Idade Média constituíram um dos maiores tesouros legislativos de todos os tempos. Foram elas o resultado de uma das mais terríveis catástrofes da História: as invasões dos bárbaros na Europa durante os séculos IX e X. Isso prova que quando o homem é reto e procura servir a Deus de todo o coração, apesar dos inconvenientes, das desvantagens e desgraças que possam lhe sobrevir, ele acaba fazendo maravilhas.

O assunto a ser tratado se enunciaria da seguinte maneira: leis dos feudos, dos municípios, das corporações e do reino.

Σωτήριος Παν. Γιαννακουλόπουλος (CC3.0)
Moisés – Claustro da Catedral de Palência, Espanha

A legisladora por excelência é a Igreja Católica

Para tratar desse tema somos obrigados a reunir certas noções gerais a respeito de diversos pontos da doutrina do Direito da Idade Média, porque a sociedade medieval é muito mais complexa do que a contemporânea.

A complexidade da lei medieval tem como ponto de partida a noção de que o verdadeiro soberano de um reino não é o senhor feudal, nem o rei, nem o imperador, mas o Direito, cuja origem é divina. Essa concepção de Deus como Autor da lei natural e fonte de todo o Direito é diretamente oposta à noção moderna de lei vigente em nossos dias, onde o Estado representado por uma assembleia elabora as leis e sua vontade é soberana.

Na Idade Média não se chegou a formar uma ideia muito exata do que seja o Estado, mas sim do Direito, fundamentado na lei natural, ou seja, Deus criou o mundo, e da ordem natural das coisas a inteligência humana é capaz de deduzir a existência de determinadas regras que constituem a vontade de Deus. Porém como a inteligência humana é susceptível de se enganar no conhecimento dessas regras, o Criador as revelou, fazendo-as constar do Decálogo. Esta é a Lei das leis, à qual estão submetidos todos os países do mundo e nenhum rei pode revogar.

Tours Jean Fouquet (CC3.0)
Coroação de Carlos Magno pelo Papa Leão III

Ora, como a interpretação da Lei divina cabe infalivelmente à Igreja, a lei básica de toda a Cristandade é aquela da qual a Igreja tem o depósito, sendo incumbida de ensiná-la, preservá-la de falsas interpretações e de impor, por meio de penas, o seu cumprimento. Assim, a arca, a guardiã, a mestra, a depositária da lei e, portanto, a legisladora por excelência de todas as nações católicas vem a ser a Igreja Católica.

De momento, vamos nos ocupar detidamente do Direito consuetudinário por ser o mais importante e interessante.

Quando é reto e procura servir a Deus, o homem faz maravilhas

Sem entrar em digressões de caráter jurídico, simplificando um pouco podemos dizer que, na estrutura do Estado moderno, todo homem é reputado livre. Ele possui a liberdade de fazer aquilo que bem entende e só tem duas espécies de limites: de um lado, os limites estabelecidos pela sua própria vontade. Quando faz um contrato e livremente se obriga a uma determinada coisa, ele não pode violar aquilo a que se obrigou. Mas há depois um outro liame que se põe aos homens, e é o da lei. Ela é uma ordem editada pelo poder competente, capaz de se impor à vontade dos cidadãos, quer queiram, quer não.

Como no Direito moderno só o Estado faz a lei, chegamos à conclusão de que em certos contratos livremente aceitos ninguém está sujeito a outra norma, a não ser a estabelecida pelo Estado.

Na Idade Média apareceu um tipo diferente de lei que é, a meu ver, a maior originalidade do Direito medieval: a lei consuetudinária. Consuetudo, em latim, quer dizer costume. A lei consuetudinária é a lei do costume. Para bem compreendermos como esse tipo de lei nasceu, temos de estudar as condições jurídicas e políticas da Idade Média.

As leis consuetudinárias, que constituíram um dos maiores tesouros legislativos de todos os tempos, foram para a Idade Média o resultado de uma catástrofe imensa, das mais terríveis da História. Isso prova quanto é verdade que quando o homem é reto e procura servir a Deus de todo o coração, apesar dos inconvenientes, das desvantagens e desgraças que possam lhe sobrevir, ele acaba fazendo maravilhas.

O Império de Carlos Magno foi organizado à maneira do Império Romano, no qual a organização do Estado era parecida com a do Estado moderno, ou seja, o imperador encarnava o Estado, todo mundo era obrigado a obedecê-lo e só ele tinha o direito de fazer leis. O Império de Carlos Magno era, portanto, baseado nesse pressuposto.

Mas quando Carlos Magno morreu, e já nos últimos anos de sua existência, uma sombra de tristeza projetou-se sobre seus domínios: eram as segundas invasões de bárbaros que destroçaram completamente o Império Romano.

Hordas bárbaras moeram a Europa

Com efeito, durante os séculos IX e X a Europa foi literalmente devastada pelos bárbaros em todos os sentidos. Por um lado, eram as incursões de húngaros – remotos descendentes dos hunos – que, em corcéis pequenos e velozes, chegaram a penetrar na devastada Alemanha, arrasando o Norte da Itália, atravessaram a Áustria, a Suíça montanhosa e atingiram o coração da França, até Champagne.

De outro lado, os normandos oriundos da Escandinávia que, penetrando pelos rios, queimavam, saqueavam e devastavam tudo quanto encontravam pelo caminho, e cuja capacidade de navegação era tal que acabaram por invadir Constantinopla, dando a volta por todo o Mediterrâneo. Por aí se compreende bem qual era a ferocidade desse povo.

lwl.org (CC3.0)

Depois, um povo que desapareceu, os ávaros. Por fim, os sarracenos que entravam pelos Pirineus, pelo Sul da França, e adentravam pela Itália.

Assim, invasões de povos hostis entre si vindos de todos os lados moeram literalmente a Europa. Não se tratava de exércitos regulares que avançavam em ordem, porém de hordas bárbaras incapazes de estabelecer uma estratégia única de invasão, vagueavam sem itinerário definido, não para conquistar um país, mas apenas para devastar as regiões por onde passavam, sem nenhuma vontade de voltar nem de se fixar, tampouco de encontrar lugar para residir; sua intenção era pilhar e ir vivendo conforme os meios permitissem e não fossem enxotados.

Coloquemo-nos na posição de um rei que esteja sitiado, por exemplo, em Paris. Ele não tem nenhum dos meios de comunicação modernos, e só toma conhecimento dos fatos por mensageiros que vêm a cavalo dar-lhe informações. Porém esses mensageiros raras vezes chegam, porque as estradas estão obstruídas por bárbaros que os prendem. Com isso, as outras cidades do reino desanimam de mandar notícias ao rei, mesmo porque ele está preocupado em defender a sua própria capital e nem sequer pode estabelecer um programa de defesa para outras regiões. Se o monarca pudesse dizer: “Meu reino vai ser atacado em tal ponto; então, vou mandar para lá minhas tropas e oferecer resistência”, isso teria um sentido. Mas um reino acometido de todos os lados, picado, quebrado, moído em todos os sentidos, sem que possa mandar suas tropas salvar coisa alguma… Nesse regime, a única atitude possível é “salve-se quem puder”.

Nasce o feudalismo

A Europa começa, então, a se eriçar de castelos. Em cada lugar, um proprietário de terras constrói uma fortaleza e, na iminência de uma invasão, recolhe para dentro dela os seus servidores, as populações livres dos arredores com o gado, o trigo, o vinho, o que possam dispor, e ali resiste durante todo o tempo que consiga.

Por um fenômeno natural, cada proprietário começou a impor a sua autoridade, à maneira de um pequeno rei local. Nascia, assim, o feudalismo.

Tenho vontade de sorrir quando vejo alguns historiadores escreverem estas tiradas clássicas: “Na época do obscurantismo da Idade Média, os reis carolíngios decadentes não souberam conter em suas mãos trêmulas o cetro de Carlos Magno, nem o seu espírito embrutecido conseguiu discernir o pensamento do grande fundador do Império, de maneira a conservar a unidade…” Eu queria saber o que um desses declamadores, sitiado na capital de um reino nessas condições, faria do cetro de Carlos Magno. Provavelmente fugiria, deixando-o pela estrada… Quanto à unidade, ele nem pensaria nela. De fato, as coisas foram como forçosamente tinham que ser, em face do que as brutais circunstâncias impunham.

Essa situação durou cerca de duzentos anos nos quais, evidentemente, as pessoas compravam, vendiam, enfim, estabeleciam toda espécie de relações de cunho jurídico. Como é natural, com o passar do tempo essa vida jurídica foi sofrendo o impulso das circunstâncias novas. Nenhum país permanece dois séculos com suas leis intactas. Qual é o modo pelo qual essas leis foram se organizando?

F Rancis Raher (CC3.0)
Castelo da Aljafería – Zaragoza, Espanha

Em cada lugar, o costume foi alterando a lei primitivamente existente. Para enfrentar os problemas novos foram se criando novos direitos e obrigações, e se aperfeiçoando fórmulas de processo. Terminadas as invasões, a Europa ficou cheia de castelos, de barões que fizeram de cada feudo um pequeno Estado dentro do qual vigoravam leis inteiramente características, surgidas com o sabor da coisa que nasce da realidade. Não era a lei elaborada, como se faz hoje, por um homem que não tem nada a ver com as atividades a serem legisladas. A lei era feita pelos homens especializados no exercício daquelas atividades, que iam adaptando as regras à medida que o costume ia mudando, temperando-as, assim, em contato com a realidade. Esse foi o nascimento do direito consuetudinário.

Leis consuetudinárias

Durante esse tempo, o que era feito daquilo que designamos Estado? Nós chamaríamos de Estado o rei. E de fato o rei era o Estado. Se Luís XIV tivesse dito, naquela época, a famosa frase que lhe é atribuída – a qual parece que ele não disse–: “L’Etat c’est moi – O Estado sou eu, ele teria afirmado uma banalidade, porque todo mundo sabia que o único poder que representava o Estado era o rei. E o que fazia o rei? Durante todos esses séculos de invasão há decretos reais. Mas estes versam apenas a respeito disso: privilégios a favor de uma igreja, de um barão, privilégios a respeito da organização da vida de um determinado grupo de burgueses. Eram coisas muito pequenas, em geral concessões de privilégios locais.

Por exemplo, não consta do Direito francês durante essa época uma só lei de caráter geral, que se refira a todo o território nacional. Eram apenas casos individuais.

O que eu disse a respeito do Direito francês é muito mais compreensível ainda em relação ao Direito espanhol. Imaginem se durante sete séculos de Reconquista, em que palmo a palmo os guerreiros cristãos de origem visigótica vão reconquistando aos árabes a Península quase completamente perdida, os visigodos fossem fazendo leis. Eles lutavam e na retaguarda os costumes iam se tornando leis. E assim a Europa toda se encheu de costumes, inclusive os costumes muito bonitos de Portugal, que foi um dos países onde o Direito consuetudinário atingiu uma das suas manifestações mais interessantes.

Étienne Colaud (CC3.0)
Aula na Universidade de Paris, na Idade Média

Em cada lugar constituiu-se, pela força dos costumes, uma amálgama das várias leis estabelecidas. Essa amálgama de leis, já consuetudinária em si, foi sendo alterada pela transformação dos costumes ao longo dos séculos da Idade Média. Mas houve uma coisa curiosa: dentro dessas leis feitas assim, em cada região, em cada lugar, o estilo de relações entre homens foi tendo uma lei própria.

Por exemplo, os que trabalhavam em couro. Os negociantes de couro tinham entre si certos problemas comuns: relações de concorrências, de apoio, etc. Por outro lado, eles possuíam também relações com os clientes.

Como havia uma série de questões que interessavam só aos comerciantes de couro e o Estado não fazia leis, eles acabavam elaborando leis por si, as quais só valiam para eles. Por exemplo, uma lei muito comum para vários ramos de negócio na Idade Média era que, quando um cliente não pagava a um comerciante, todos os outros negociantes do ramo não lhe vendiam mais suas mercadorias, até que ele resolvesse pagar. Isso exprime bem o espírito de classe que se formava entre eles.

Então, dentro dessas unidades pequenas começaram a aparecer as leis consuetudinárias para as várias classes, os vários grupos sociais. Assim, temos leis vigorando só para determinada igreja e terras circunvizinhas; leis apenas para os clérigos, nobres ou burgueses de um determinado lugar; leis só para determinados ofícios e, por fim, leis válidas apenas para uma determinada parte do feudo.

O Direito Romano

A partir do século XII, começou a aparecer o estudo do Direito Romano nas faculdades europeias e, consequentemente, um tipo de organização onde não há quase costumes e a lei é feita pelo próprio Estado. Principiou-se a aplicar o Direito Romano nos julgamentos, e o povo de tal modo não gostou que no Sul da França, por exemplo, houve reações violentas.

O Direito Romano acabou entrando ali, mas no Norte não penetrou. Então a França dividiu-se em duas categorias de zonas: as de Direito consuetudinário, não escrito, porque esses costumes não tinham nascido de um documento escrito; e depois a zona do Direito escrito, que era o Direito Romano. Mas o curioso é que o Direito Romano entrou como um costume também. Não houve um rei pondo em vigor o Direito Romano. Simplesmente começaram a aplicá-lo porque acharam bonito.

O costume assim conceituado pode definir-se da seguinte maneira: é um uso jurídico, ou seja, que produz força de direito, de formação espontânea – não se fizeram estatísticas, nem houve a escola de Sociologia e política para dizer a última palavra –, aceito por todo um grupo social interessado e vigorando só para esse grupo.

Quais são os requisitos para que um costume exista? Primeiro requisito: é preciso que sejam atos repetidos. Realmente não existe um costume se não houver repetição. Repetidos durante quanto tempo? Eles fixaram um limite que é necessariamente arbitrário, porque não há limite fixo para essas coisas. Eles determinaram um limite de quarenta anos. Mas os costumes bons eram costumes que vigoravam há tempos imemoriais e era um prestígio quando se podia dizer: “Esse costume vigora desde tempos imemoriais”.

Outro requisito é que esses atos sejam públicos. É claro que o costume concernente a atos não públicos não pode prevalecer como lei. O terceiro requisito é que os atos sejam pacíficos. Eles entendiam como atos pacíficos os que não tinham tido por sua origem uma violência e que se praticavam sem nenhuma contradição séria.

Fala-se tanto de democracia, mas a democracia verdadeira é aquela em que o homem legisla só naquilo que ele entende, sem ser por meio de legislador, mas diretamente, contribuindo para formar o costume e entregando a regulamentação deste à vida social. Isso é imensamente mais autêntico, tem muito mais sabor de realidade do que qualquer outra coisa.

Gabriel K.
Adão e Eva sendo expulsos do Paraíso Catedral de Gloucester, Reino Unido
Émile Signol (CC3.0)
São Luís IX – Palácio de Versailles, França

Dois extremos hostis

Depois de termos estudado a assombrosa elasticidade dos costumes, compreendemos bem quanta estupidez há em afirmar que a Idade Média foi um período de tirania, em que o homem era um verdadeiro escravo.

Há uma coisa muito curiosa que a História comprova continuamente: o demônio é o pai da mentira; sempre que ele promete ao homem uma coisa, podemos estar certos de que aquilo o demônio não vai dar. E o programa dele já está enunciado na mentira: aquilo é que ele vai tirar.

Adão e Eva tiveram um obscurecimento de inteligência pavoroso em consequência do pecado original. Decadências internas, psíquicas, de toda ordem. E perderam o Céu. O que há de mais diferente, nesse processo de decadência e nessa marcha para o Inferno, do que a promessa do demônio: “Sereis como Deus”? É justamente o que não vai acontecer.

O homem tinha a liberdade, mas o demônio quis roubá-la prometendo a liberdade. Vimos a margem enorme de liberdade dos grupos sociais na Idade Média. Entretanto como o demônio roubou à humanidade a liberdade, nas sucessivas revoluções que nos conduzem ao totalitarismo!

É interessante comparar os dois elos extremos da cadeia: de um lado, uma sociedade que vive de respiração consuetudinária; e no outro extremo, a sociedade totalitária na qual não se espirra sem um regulamento. Se espirramos fora do regulamento, vamos parar num campo de concentração. Por quê? Porque as coisas saem de uma certa ordem prevista pelo sociólogo para o bem comum. O totalitarismo e o direito consuetudinário são os dois extremos hostis.

Uma pessoa poderia me fazer esta pergunta: “Mas isso não cai no caos? Imaginemos os homens de hoje regidos pelo costume e veremos o tumulto que vai nascer.”

Em primeiro lugar é preciso notar o seguinte: com um material podre não se constrói uma casa forte. Numa época de decadência moral tremenda como a nossa, soltando-se, dá na desordem, prendendo-se, surge a tirania. Se se nomeia alguém para governar, acaba sendo um gatuno ou carrasco. A solução não é outra senão moralizar. O direito consuetudinário supõe evidentemente um teor de moralidade, uma ordem cristianizadora.

Eu não seria favorável à aplicação brusca, pura e simples de um sistema consuetudinário no Brasil de hoje. Entretanto, se em cada lugar fossem entregues paulatinamente certas funções consuetudinárias às forças sociais verdadeiras do local, tenho a impressão de que a coisa terminava bem. Porque a legítima autoridade social, por uma espécie de molejo interno, é capaz de resolver bem os casos; enquanto que a autoridade política como nós a concebemos, distanciada da vida social, é artificial e não resolve nada bem.

Revogação de costumes contrários à Moral ou ao bem comum

O direito de revogar um costume competia só ao rei, que o exercia apenas em dois casos: quando o costume era contrário à Moral cristã ou ao bem comum da sociedade.

Nesse sentido, é bonito notar que o grande protetor dos costumes foi São Luís IX, que não só deu todo apoio aos costumes justos, mas se tornou um extirpador tremendo de maus costumes.

No século XIII, como a função do rei começou a se desenvolver, o parlamento de Paris principiou também a receber essas funções de extirpar os maus costumes. Na Inglaterra alguns desses costumes estão em uso até nossos dias.

Arquivo Revista
Dr. Plinio durante uma conferência, na década de 1950

Na França o processo foi diferente. Estudados os costumes dos vários feudos grandes, verificou-se que tinham traços comuns, que constituíram o Direito consuetudinário de certas regiões: Normandia, Champagne, Auvergne, etc., ao lado dos direitos consuetudinários menores das pequenas unidades. E assim formou-se a estrutura: lei de Estado feita pelo rei, costumes regionais que são os denominadores comuns dos costumes locais e, por fim, os costumes locais. E dentro dos costumes locais, os costumes para as várias classes, para os diversos pequenos lugares: rios, lagos. Temos, assim, a imensa diversificação do Direito medieval.

O Direito consuetudinário fixou-se em todo o território europeu. Com o tempo esses costumes transformaram-se em documentos chamados cartas, que eram convenções particulares nas quais havia referências aos costumes. Nos séculos X e XI essas cartas já são numerosas. No século XII começaram a aparecer estatutos municipais, consentidos por reis e outros senhores, para determinadas cidades. Principiaram a surgir também os registros das cartas feitas pelos particulares ou pelo rei. Mais tarde surgiram os livros de costumes, escritos por juristas para uso próprio. E quando esses livros eram bem feitos generalizavam-se de tal maneira que acabavam tendo, até certo ponto, força de lei. Por fim, no século XII, começaram a aparecer as compilações de decisões de juízes com base nos costumes, e constituíram uma espécie de complemento do Direito consuetudinário. Sobretudo no século XIII isto se desenvolveu.

Assim nós temos uma visão de como se estabeleceu o Direito consuetudinário e de que modo podia haver ordem dentro dele. Deixo posto um problema a ser tratado futuramente: Nesse pulular de leis e de corpos sociais, como estabelecer a ordem e a medida? Dessa orquestra com milhares de instrumentos, como podia nascer uma sinfonia?

(Continua no próximo número)

(Extraído de conferência de 1954)

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