Em nossos dias se formou, entre os inimigos declarados da Igreja e os fiéis católicos, partidos intermediários que pretendem conciliar o espírito do mundo com o dos Evangelhos.
Entre os sinais característicos desses semicatólicos podemos destacar principalmente a pretensão de tudo conciliar. Desse falso espírito de conciliação nasce a diminuição e confusão das verdades sobrenaturais, o laxismo, a indiferença religiosa, a deturpação de nossa Fé como, por exemplo, a visão unilateral das verdades reveladas: realçam-se as suaves e consoladoras, ocultam-se as austeras. É o império da prudência da carne.
Para o verdadeiro católico, a paz não consiste em cruzar os braços diante dos erros procedentes do espírito do mundo. “Disse-vos isto para que tenhais a paz em Mim. No mundo passareis tribulações; mas tende confiança! Eu venci o mundo” (Jo 16, 33). É neste sentido que o Divino Mestre nos assegura que não nos veio trazer a paz, mas a espada.
A paz, diz Santo Agostinho, é a “tranquilidade da ordem”. Ora, é a Fé que nos faz conhecer as relações cuja harmonia constitui essa ordem desejada por Deus no mundo.
Em primeiro lugar, será necessária a aceitação prática do soberano domínio do Criador sobre todas as obras de suas mãos; portanto, sobre os povos e as nações. Em segundo lugar, a afirmação da supremacia do espírito sobre os sentidos, isto é, sem desconhecer o que há de animal em nossa natureza, devemos nos lembrar de que é a nossa alma com suas potências que nos distingue dos seres irracionais e nos coloca na dignidade de filhos de Deus. Por fim, o amor sincero e prático a nossos semelhantes. Sem essa tríplice harmonia, nenhuma “tranquilidade da ordem” é possível.
Em resumo, a paz para o cristão se reduz no Reino de Deus que está dentro de nós (cf. Lc 17, 21). E como ele – afirma São Luís Maria Grignion de Montfort – também o Reino da Santíssima Virgem encontra-se principalmente no interior do homem, isto é, em sua alma, onde a Rainha dos Corações é mais glorificada com seu Divino Filho do que em todas as criaturas visíveis.
Em Fátima, para alcançar a paz para o mundo, a Celeste Medianeira de todas as graças não propôs aos homens um programa de assistência material ou de reajustamento de fronteiras, mas nos veio exortar a mudar de vida e a não mais afligir com o pecado a seu Divino Filho. Para obter a tranquilidade que tanto almejamos neste mundo conturbado por misérias e sofrimentos, convida-nos a Mãe de Deus a recitar o Santo Rosário e a fazer penitência pelos nossos pecados.
Entretanto, não foram esses remédios que, em plena Idade Média, a Santíssima Virgem confiou ao zelo de São Domingos contra os erros e devastações dos hereges albigenses, os mesmos recomendados à humanidade por meio de três crianças, as quais, em 1917, usavam cilícios como se ainda vivessem no tempo de São Jerônimo ou São Francisco de Assis? Não estamos no século da energia atômica? Maria Santíssima não vê, então, que os tempos modernos não comportam essas velharias?
Certamente a Rainha dos Céus não Se deixa levar pelas opiniões dos sábios e orgulhosos desta Terra. Ela não ignora que seu Divino Filho é o mesmo ontem, hoje e para todo o sempre, e que o problema do mal e das misérias humanas se prende àquela mesma serpente antiga, o pai da mentira que roubou a paz e a felicidade terrena de nossos primeiros pais.
Hoje, como ontem, para a conquista da paz e da concórdia entre os homens é preciso trabalharmos para que Cristo reine nos corações.
A fim de obtermos este dom, volvamo-nos à nossa Mãe e Advogada. Não impeçamos, através de nossos atos e malícia, que se realizem as comunicações sobrenaturais entre o Céu e a Terra, mas, pelo contrário, tenhamos abertos os corações às moções da divina graça e não poupemos esforços, sacrifícios e orações para que, mediante a Rainha dos Corações, Cristo volte a imperar em nossas almas, em nossas famílias, em todas as nações.*
* Cf. O Legionário n. 684, 16/9/1945.