Em 1917 a primeira conflagração mundial caminhava para seu declínio. Para os políticos de alto bordo e os observadores militares já não era duvidoso o êxito final da luta. Toda a estratégia alemã se baseara na esperança do triunfo do Blitzkrieg. A primeira cartada se jogaria com intensas possibilidades de êxito, mas era a única. Os alemães a tinham perdido. O resto, para os aliados, era apenas questão de tempo. Os financistas, os sociólogos, os politiqueiros já começavam seu burburinho de antecâmaras e bastidores para saber como o mundo se reorganizaria no pós-guerra. Isto, enquanto nos campos de batalha a luta ainda ia acesa e os canhões germânicos troavam não muito longe de Paris.
Esse burburinho tinha real importância, até mesmo muito mais importância do que o troar dos canhões. Nos campos de batalha se liquidava uma guerra já decidida in radice. Nos gabinetes não se liquidava uma guerra, mas se elaborava uma nova era. O futuro já não estava na retranca das metralhadoras, e sim nas negociações dos bacharéis e dos técnicos.
Quando começavam a se delinear apenas, timidamente, os primeiros esboços desse mundo novo, verificou-se um dos fatos mais consideráveis da História contemporânea. Em nosso mundo são muitos os céticos que não acreditam nesse fato. Os que não são céticos são tímidos, e não ousam proclamar os fatos em que acreditam. Uns por falta de fé e outros por falta de coragem não ousam incorporar à História contemporânea esse acontecimento. Mas os mais graves motivos sobre os quais a inteligência humana pode basear-se aí estão patentes a atestar que Nossa Senhora baixou dos Céus à Terra, e manifestou a três pequenos pastores de um recanto ignorado e perdido do pequeno Portugal as condições verdadeiras, os fundamentos indispensáveis para a organização do mundo. Ouvida essa mensagem, a humanidade encontraria verdadeiramente a paz. Negada, ignorada essa mensagem, a paz seria falsa e o mundo imergiria em nova guerra. A guerra veio.
A mensagem da Senhora, que sobreveio precisamente no momento crucial em que se preparava o pós-guerra, desprezando as manifestações aparatosas de falso patriotismo e de cientificismo dos técnicos, colocou com grande simplicidade todas as coisas em seus termos únicos e fundamentais. A guerra fora um castigo do mundo por sua impiedade, pela impureza de seus costumes, por seu hábito de transgredir os domingos e dias santos. Isto resolvido, todos os assuntos se resolveriam por si. Isto não resolvido, todas as soluções de nada adiantariam… E se o mundo não ouvisse a voz da Senhora, se ele não respeitasse esses princípios, a nova conflagração que viria, precedida de fenômeno celeste extraordinário, seria muito mais terrível que a primeira.
Ora, Fátima não é um fato ocorrido apenas em Portugal e nem mesmo interessa apenas a nosso tempo. Fátima é a verdadeira aurora dos Tempos Novos cujos albores despertaram no momento em que Nossa Senhora baixou à Terra e comunicou a três pastorinhos as lições severas sobre o crepúsculo de nossos dias, e as palavras esperançosas sobre os dias de bonança que a Misericórdia Divina prepara para a humanidade quando finalmente se arrepender.
“Hodie si vocem eius audieritis, nolite obdurare corda vestra – se hoje ouvirdes sua voz, não endureçais vossos corações”, diz a Escritura (Sl 94, 7-8). Inscrevendo a festa de Nossa Senhora de Fátima no rol das celebrações litúrgicas, a Santa Igreja proclama a perenidade da mensagem da Mãe de Deus dada ao mundo através dos pequenos pastores. Em nossos dias, mais uma vez, a voz de Fátima chega a nós. Não endureçamos nossos corações, porque só assim teremos achado o caminho da paz verdadeira.*
* Cf. O Legionário n. 614 de 14/5/1944 e n. 661 de 8/4/1945.