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Malícia do pecado de heresia

Os hereges armaram todo tipo de ciladas ao Papa São Silvério. Utilizaram-se até da péssima Imperatriz Teodora, que empregou a força bruta para conseguir os seus intentos em prejuízo do Santo. Está na índole da heresia ser brutal, falsa, querer o extermínio dos verdadeiros católicos. Desta forma, não se pode pretender combater os hereges por sorrisinhos e pequenas amabilidades.

Em 2 de dezembro, a Igreja comemora São Silvério, Papa e mártir. Daras, em seu livro Vie des Saints, diz o seguinte:

Pão da tribulação e água da angústia

Teodora, mulher de Justiniano, nomeara para a Sé de Constantinopla, em 535, como bispo a Antimo, partidário de Eutiques e inimigo do Concílio de Calcedônia. Embora a imperatriz tudo fizesse para que Roma aprovasse sua escolha, o Papa Agapito depôs o bispo e condenou seus adeptos.

Santo Agapito foi sucedido por São Silvério, em 536. Novamente Teodora tentou conquistar o novo pontífice para seus planos. O resultado foi negativo. Ordenou então a Belisário, seu general, que recorresse à força para obter o que ela desejava. Belisário dirigiu-se a Roma e, como a cidade estivesse sitiada pelos godos, acusou o Papa de entender-se com estes contra Constantinopla.

Petar Milošević (CC3.0)
Mosaico da Imperatriz Teodora (detalhe) Basílica de São Vital, Ravena, Itália

A acusação surtiu efeito entre a população e cartas falsas a confirmaram. Baseando-se nisso, o general procurou fazer com que São Silvério cedesse às suas exigências. O Papa recusou e retirou-se para a Igreja de Santa Sabina. Aí, dias depois, foi procurado por emissários para que voltasse ao seu palácio, pois nada sofreria. Os conselheiros do Pontífice avisaram-lhe que não confiasse nos gregos. O Papa pôs-se de joelhos, recomendou a Deus a Santa Igreja e deixou Santa Sabina, para não mais ser visto.

Exilado para a Ilha de Ponza, de lá escreveu ao Bispo Amator: “Eu me alimento do pão da tribulação e da água da angústia, mas não me considero deposto e não me demito do soberano pontificado.” Com efeito, reu niu ainda um concílio nessa ilha e decretou o que seria necessário para a defesa da Fé e o restabelecimento da disciplina. Duramente tratado, morreu a 20 de junho de 539.

A má fé é a suprema maldade…

Vemos narrado aqui um dos mil episódios da luta dos pontífices romanos contra as heresias, no qual se constata a crueldade, falsidade, intransigência dos hereges em relação ao Papa. Observem como contra São Silvério os hereges, sediados em Constantinopla, empreenderam todos os esforços, entretanto, nada conseguiram porque São Silvério se manteve firme, fiel.

Notamos da parte desses hereges uma grande má fé. Eles sabiam que não podiam levar a violência além de um certo ponto porque revoltariam contra si toda a população. Então, foram até onde conseguiram, mas o desejo era exterminar o Papa logo que pudessem. Alegaram conivência entre o Pontífice e os godos, uma acusação simplesmente absurda que não tinha cabimento, a qual, entretanto, faziam para difamá-lo e levantar a opinião pública contra ele. Ademais, uma mulher péssima, Teodora, que constantemente impunha arcebispos hereges a Constantinopla a fim de arrastar essa cidade para a heresia, serviu-se da força brutal para conseguir seus intentos.

Sailko (CC3.0)
São Silvério (detalhe) – Palácio dos Doges, Veneza

Devemos considerar que a heresia, enquanto pecado, tem uma malícia própria e até suprema, porque o pecado contra a Fé é o pior que existe. Todo homem que tem contato com a Igreja Católica recebe graça suficiente para saber que ela é a verdadeira Igreja de Deus; se ele recusa esta graça, nega a verdade conhecida como tal e rejeita a mais importante dentre estas verdades, a qual é exatamente que a Santa Igreja Católica é a única Igreja de Nosso Senhor Jesus Cristo.

Portanto, os hereges que possuíam a oportunidade de conhecer a Igreja e de se elucidar, como era o caso dos bizantinos, mas não a aceitaram, ficaram numa posição de má fé, que é a suprema maldade perto da qual a crueldade, a falsidade deles não passavam de corolários. Quer dizer, está no espírito, na índole da heresia ser brutal, falsa, visar o extermínio dos verdadeiros católicos.

…e não é vencida com sorrisos, mas com luta

É assim que precisamos considerar todos os hereges com os quais nós tratamos, desde que tenhamos a razoável certeza de que eles possuíram o suficiente para conhecer a Santa Igreja Católica.

Basta ter estado em algumas igrejas, assistido a cerimônias religiosas, à Liturgia, ouvido o canto, o órgão, conversado com pessoas piedosas, para determinar no indivíduo um princípio de Fé que o deve levar avidamente a instruir-se.

E há uma recusa da Fé quando qualquer espécie de herege ou cismático, tendo oportunidade dessas frequentações e desse contato, acaba não se instruindo e não se tornando católico.

Arquivo Revista
Dr. Plinio em 1973

Então, nós compreendemos como é uma tolice pretender combater os hereges por meio de ditos ecumênicos, imaginando que gente tão péssima, simplesmente por sorrisinhos e pequenas amabilidades pode ser trazida à Fé Católica. Eles recebem o sorriso permanente, contemplam o espetáculo do amor contínuo para com todos os homens, a bondade da Santa Igreja ao mesmo tempo tão elevada, tão séria, tão aprazível, que é considerada uma mãe verdadeiramente cheia de ternura e uma mestra plena de sabedoria.

Se eles recusam isso estão de má fé, a qual não pode ser vencida simplesmente com uma meia dúzia de piruetas. Ela precisa ser derrotada por meio de objurgatórias, que façam sentir ao homem o horror da má fé em que se encontra. E através de atitudes que o desmoralizem aos olhos de terceiros, para que ele não possa ser nocivo. Numa palavra, a Igreja é militante e a má fé tem que ser vencida na luta; é com espírito de luta que se deve combater as heresias.

Única inimizade da qual Deus é autor

Portanto, nós compreendemos quanto há de disparatado no ecumenismo levado à outrance1, quer dizer, no desejo de aplicar métodos de uma doçura estúpida, traiçoeira, facinorosa, contra aqueles que estão empreendendo a demolição da Santa Igreja Católica. É preciso pegar o látego, à imitação de Nosso Senhor quando expulsou os vendilhões do templo, empregar as palavras de fogo d’Ele contra os fariseus hipócritas, ter a espada incandescente de São Miguel Arcanjo, precipitá-los para fora da Igreja. E, no momento oportuno, ser o instrumento do castigo de Deus. Esse é o nosso espírito de luta e de intransigência. Estamos numa guerra declarada e a mais terrível de todas porque é a guerra entre os “filhos da serpente” e os filhos de Nossa Senhora.

Flávio Lourenço
Jesus expulsa os comerciantes do Templo – Catedral de Santa Maria, Astorga, Espanha

São Luís Grignion de Montfort disse muito bem que nunca ninguém destruirá essa recíproca inimizade. A única inimizade que Deus fez é a existente entre os filhos do demônio e os filhos de Nossa Senhora. E como tudo quanto o Criador realiza é bem feito, essa inimizade é perfeita, quer dizer, vai ao extremo do ódio sobrenatural que ressalva o desejo de salvar essas almas. E é dessa inimizade, desse ódio sacral que as nossas almas precisam estar cheias. Ódio que deve fazer de nós os Apóstolos dos Últimos Tempos, combativos, zelosos, intransigentes e nunca apóstolos abobados e traidores da causa que deveriam defender. É essa a grande lição que se desprende para nós da vida de São Silvério.

(Extraído de conferência de 19/6/1967)

1) Do francês: excesso, exagero.

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