Está na natureza do homem o valer-se dos sentidos externos para adquirir conhecimento. Neste processo se explica o papel dos símbolos, os quais tornam possível o conhecimento de Deus através das criaturas. É por isso que as almas santas despertam entusiasmo nos bons e instigam o mesmo ódio que Deus provoca nos maus.
Deus ornou a Criação com símbolos para dar aos homens a possibilidade de O amarem. E se é verdade que as criaturas existem para servi-Lo, o principal serviço que prestam é tornar presente aos homens a ideia d’Ele, Deus.
Se a Providência Divina criou tantos símbolos é porque eles têm uma importância enorme. Qual?
Finalidade dos símbolos: visão de Deus
Há fotografias da ida dos homens à Lua. Ao vê-las, espantei-me com a cegueira das pessoas que procuram vê-la em si e não naquilo que ela representa; não refletem, não deduzem, como seria devido. Ora, ela é um símbolo de Deus como todas as criaturas, a seu modo, o são.
O homem é um ser composto de corpo e alma e adquire conhecimento através dos cinco sentidos. Isso a tal ponto que, se alguém passar a vida sem nenhum dos sentidos não poderá diferenciar as impressões e formar as ideias; não terá, portanto, elementos para amar a Deus.
É pelos sentidos que adquirimos os conhecimentos, e os símbolos têm por função nos proporcionar uma como que visão de Deus.
Pelo raciocínio podemos compor uma ideia a respeito de Deus, o que é enormemente precioso. No entanto, é diferente daquilo que nos diz um símbolo.
Por exemplo, sabemos pela Fé e pela razão o que é a virgindade e qual é o seu valor. Podemos construir uma ideia intelectiva a respeito de Nossa Senhora, Virgem das virgens. Mas, para amar aquilo que o espírito concebeu, quanto ajuda ao homem ver um bonito lírio! Ele exprime aquilo que a razão concebeu.
Está na natureza do homem a necessidade de ver, de tal maneira que no Céu veremos a Deus face a face. Não há um de nós que não deseje contemplar Nossa Senhora, os Anjos, os Santos no Céu. Queremos vê-los, porque o ver é essencial para nós. E o símbolo nos faz ver realidades superiores.
Símbolo, simbolismos e simbolizados…
O gládio, por exemplo, o que me diz? Ele traz em si todas as ideias a respeito de heroísmo. O que é uma guerra santa, graças a Deus, eu o sei. O que foram as Cruzadas, eu sei. Mas, por que a visão do gládio me dá tanta alegria? Porque ele é um símbolo da guerra santa, da coragem, que me faz como que ver aquilo que eu já conhecia.
Para entendermos a importância desse ver, imaginemos que fôssemos de um país muito pobre, no qual cada grupo de indigentes fosse entregue à generosidade de um grande benfeitor de um outro país. Ora, um determinado doador se revela magnífico em sua obra: ele não só dá todo o necessário, mas manda com carinho e várias vezes até o supérfluo. E, para manter a minha vida, vamos imaginar que o doador tivesse dado até seu sangue para fazer uma transfusão em mim. É um benefício insigne, depois do qual eu ficaria muito grato a ele; e o normal é que eu quisesse conhecê-lo e assim ter uma ideia mais completa da bondade que percebi.
Imaginem, no entanto, que eu não conseguisse vê-lo, mas soubesse da existência de uma música na qual ele se visse muito bem simbolizado e expresso. Eu teria vonta de de conhecer a simbologia dessa música para conhecer o benfeitor. Seria um modo de vê-lo e ouvi-lo.
Pois bem, esse é o papel dos símbolos no que diz respeito a Deus.
A alma humana, a mais perfeita imagem de Deus
Se um Anjo é símbolo de Deus, o homem também o é. Como? Ele não é puro espírito, mas tem espírito e alma espiritual.
Se através do corpo eu consigo perceber a alma, através dela eu conseguirei perceber algo que é, no universo visível, o que há de mais parecido com Deus. Uma alma é o mais alto símbolo de Deus na Criação e o que uma pessoa tem de mais simbólico é o olhar.
Nós todos conhecemos a magnificência do Sol. Mas ele próprio não simboliza tão bem a Deus quanto uma alma virtuosa, em estado de graça.
Qual foi a alma que melhor simbolizou a Deus? Antes de tudo a de Nosso Senhor Jesus Cristo, porque era Homem-Deus. Alguns hereges antigos queriam supor que Ele fosse unicamente Deus, sem alma humana1. Com efeito, o Verbo está unido substancialmente à natureza humana e a alma d’Ele é, na ordem do espírito, o que de mais perfeito foi criado.
Portanto, se conhecêssemos pessoalmente Nosso Senhor, teríamos um conhecimento de Deus extraordinário, exímio. Se nós conhecêssemos Nossa Senhora, conheceríamos de modo excelente Nosso Senhor e Deus.
No que a alma humana reflete a Deus? Quase não há palavras para responder. Seria como perguntar: no que um quadro bem pintado se parece com o personagem vivo? É indefinível. Se a pintura é bem-feita, em tudo se assemelha.
Assim se passa conosco: somos como que quadros bem pintados de Deus. Ou, com mais exatidão, somos símbolos adequados d’Ele, se queremos ser bons; a questão é querer ser bom. É por isso que as almas santas despertam o entusiasmo que as coisas divinas despertam nos bons, ou todo ódio que Deus provoca nos maus.v
(Extraído de conferência de 25/5/1983)
1) Referência feita à heresia monofisista, do século V, a qual afirmava a existência de uma só natureza em Cristo, a divina.