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Como consolar nosso Redentor?

Na Paixão, Nosso Senhor Jesus Cristo sofreu muito mais pelos pecados e infidelidades da humanidade do que pelas dores físicas que Lhe foram infligidas. Levar uma vida íntegra é um modo de consolá-Lo.

Em breve entraremos na Semana Santa. Na Quinta-feira Santa se comemora a Instituição da Sagrada Eucaristia, na Santa Ceia, onde Nosso Senhor Jesus Cristo lava os pés dos Apóstolos e lhes perdoa, portanto, os pecados. Nesse dia Judas rompe com o Colégio Apostólico.

O Evangelho é muito expressivo: “Era noite” (Jo 13, 30). Noite em que Nosso Senhor começa sua Paixão com a Agonia no Horto. Daí toda a sequência de acontecimentos, ao mesmo tempo sublimes e dramáticos, que a piedade católica se compraz em reconsiderar todos os anos.

O Redentor sofreu mais na alma do que no corpo

Para esta ocasião, devemos ter um sentimento de compaixão pelo que aconteceu com Nosso Senhor. Mas não podemos nos esquecer do seguinte, pois, a meu ver, deve ser a consideração central da Semana Santa: Nosso Senhor sofreu muito mais pelos pecados dos homens do que pelos sofrimentos que Lhe foram infligidos.

Imaginemos, paradoxalmente, que Ele estivesse numa fogueira durante horas e horas, sofrendo o suplício de ser queimado vivo, mas soubesse que havia em torno de Si, genuflexa, uma multidão contrita de dor, e até os próprios autores desse crime estivessem contritos de dor; e soubesse também que, ao longo dos séculos, não se pecaria mais, porque Ele tinha sacrificado a sua vida. A dor física seria tremenda, mas o seu sofrimento seria muito menor do que o que Ele teve.

Na Paixão, sua dor física foi tremenda, mas sua dor maior foi a dor moral. Nosso Senhor Jesus Cristo, Deus, a Segunda Pessoa da Santíssima Trindade humanada, apesar de ver seu Sangue Divino vertido por nós, viu que este seria injuriado durante séculos e séculos. Viu os pecados que se cometeriam e os viu aumentar. De tal maneira que se aplica a Ele a passagem: “Quæ utilitas in Sanguine meo?” “Qual a utilidade do meu Sangue? (Cf. Sl 29, 10) Por que estou padecendo tudo isto?”

Há alguma coisa dessa pergunta no momento lancinante do “Deus, Deus meus, quare dereliquisti me?” “Meu Deus, meu Deus, por que Me abandonastes?” Como quem diz: “Este sacrifício todo, por quê, ó meu Deus?” De fato, essas palavras iniciam um Salmo profético (Cf. Sl 21, 2).

Ele deseja um ato de amor e reparação da nossa parte

Ele viu nossos pecados, viu o pecado de Revolução e padeceu por tudo isso. Nessas condições, Nosso Senhor sofreu e deseja nossa reparação, deseja um ato de amor e de indignação.

Se eu tenho um pai que está sendo esbofeteado e olho com mansidão para os malfeitores, eu não estou amando meu pai. Eu devo indignar-me, devo protestar, devo interpor-me entre ele e quem o ataca: “Não senhor! Isto é comigo! Eu assumo para mim este caso, quem está na luta sou eu!”

Nós devemos lamentar que o mundo inteiro não esteja nessa situação. Devemos lamentar que nós mesmos não tenhamos a postura de alma integralmente assim, que a fidelidade e o agradecimento a tantos dons exigiriam. Então, não podemos apenas apresentar aos pés da Cruz os pecados da humanidade. Devemos também pedir perdão pelos nossos pecados individuais.

Havendo almas interiores e puras, a Terra seria renovada

Ao mesmo tempo, devemos apresentar o Sangue de Cristo e as lágrimas de Maria ao Pai Eterno como modo de agradecer o benefício inestimável de fazermos parte dos poucos que disseram sim. Um sim mais forte ou menos forte; mais puro ou menos puro; mais durável e cheio de entusiasmo, ou como o de Nicodemos; mas, enfim, disseram sim.

Coloquemo-nos aos pés da imagem de Nosso Senhor flagelado para rezar, para pedir, para suplicar, por intercessão de sua Mãe Santíssima, que perdoe os nossos pecados e faça de nós aqueles homens de Deus contra quem nenhum adversário resiste.

Se houvesse na Terra muitos homens de Deus, muitas almas interiores que sacrificassem tudo para serem puras, para não pecar de respeito humano, de orgulho, de vaidade, de comparações, de rivalidades; se os tivéssemos em grande número, a face da Terra se renovaria. Peçamos para ser desses homens.

Renunciar aos defeitos ou ser um palhaço aos próprios olhos

Há um pensamento que a mim sempre me fez muito bem. Ou se renuncia ao amor-próprio, à impureza e suas sequelas, ou se é palhaço, e palhaço aos próprios olhos.

Estou proferindo estas palavras. Ora, elas só conseguirão fazer algum bem na medida em que eu for um homem puro, sem amor-próprio.

Ao término do dia, quando for para minha casa e, afinal, começar a descansar, devo examinar se pronunciei estas palavras com o coração reto. Se tenho consciência de ter combatido a impureza e o orgulho, eu posso deitar o meu corpo exausto e dizer: “Senhor, quando o cansaço se evolar do meu corpo pelo repouso, será como um sacrifício que sobe a Vós. Querei recebê-lo em odor de suavidade diante de Vós. Maria Santíssima, intermediária de todos os homens junto a Deus, dai ao meu sacrifício o que ele não tem, para que Deus o tenha por agradável.” Cerro os olhos e durmo tranquilamente.

Flávio Lourenço

Se não for isso, o que eu fiz? Renunciei a quantas comodidades, a quantos prazeres, a quantas vantagens na vida, mas não fiz apostolado. Levei uma vida dura e difícil, mas fui vaidoso, orgulhoso e, no fim do meu dia, gastei o tempo que Deus me deu fazendo uma comédia de apostolado. O que eu fui? Um palhaço!

Não basta ter os passos no caminho certo

Tomemos bem isso em consideração. É terrível a nossa situação. Recebemos uma opção admirável, pusemos nossos passos ao longo do caminho certo, mas neste caminho certo temos que levar a mente e o coração acertados.

Peçamos isso a Nossa Senhora, preparando-nos, assim, para a Semana Santa, com esta jaculatória que se reza no começo de todas as estações da Via Sacra:

Adoramus te, Christe, et benedicimus tibi, quia per sanctam Crucem tuam redemisti mundum.

Nós vos adoramos, ó Cristo, e Vos bendizemos, porque por vossa Santa Cruz redimistes o mundo.

Eu acrescento: Nossa Senhora das Lágrimas, Nossa Senhora das Dores, rogai por nós!

Entremos, pois, com ardor na Semana Santa.

(Extraído de conferência de 26/3/1986)

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