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Escravos de Maria, humildes e puros, fortes contra o demônio

À maneira de uma gota de orvalho que parece conter todo o Sol quando sobre ela incide um raio de sua luz, assim é a alma humilde: eleva-se a uma altura e a uma harmonia verdadeiramente indizíveis, torna-se pura e combativa, e se faz escrava de Maria Santíssima louvando-A no mistério da Encarnação.

Em seu Tratado da verdadeira devoção à Santíssima Virgem, São Luís Maria Grignion de Montfort comenta:

[Os escravos de Maria] terão uma especial devoção ao grande mistério da Encarnação do Verbo, celebrado no dia 25 de março, que é o mistério próprio dessa devoção, uma vez que ela foi inspirada pelo Espírito Santo, para honrar e imitar a dependência inefável que Deus Filho quis ter de Maria, para a glória de Deus Pai e para nossa salvação. Essa dependência se manifesta particularmente neste mistério em que Jesus Cristo Se torna cativo e escravo no seio da divina Maria, onde depende d’Ela para todas as coisas.1

J.P. Castro
À esquerda, São José com o Menino – Basílica de São José e Nossa Senhora do Sagrado Coração, Cidade do México. À direita, Virgem da Anunciação – Pinacoteca Antiga, Munich

Flávio Lourenço

Durante sua gestação, o Divino Menino dependia em tudo de sua Santa Mãe

Nosso Senhor Jesus Cristo quis ser Escravo de Nossa Senhora porque, a partir do momento em que Ela aceitou a proposta do Anjo de dar à luz o Messias, o Espírito Santo atuou em seu interior e o Homem-Deus foi concebido. De maneira que, imediatamente depois do convite, Ela tornou-Se a Mãe de Deus.

Nosso Senhor Jesus Cristo passou no claustro santíssimo e puríssimo da Virgem Maria todas as fases da gestação. E continuamente o organismo d’Ela ia fornecendo o necessário para o desenvolvimento da criança mil vezes abençoada, do Menino Divino que estava ali Se formando para a salvação dos homens.

De maneira que se tem dito muito bem: Caro Christi, caro Mariæ.2 Porque no matrimônio comum, os filhos são produtos do pai e da mãe, mas no casamento virginal de Maria, Nosso Senhor não era filho natural de São José, que possuía um direito paterno ao fruto das entranhas de sua Esposa, mas não era o pai consanguíneo do Menino Jesus. Ela, entretanto, era a Mãe carnal d’Ele.

Excelsa santidade a que foi elevada a Esposa do Espírito Santo

Mas não podemos deixar de considerar que, sendo Nossa Senhora verdadeira Mãe de Deus, a partir do momento em que o Espírito Santo tornou-Se Esposo d’Ela, Ele teve também sobre a alma d’Ela direitos que se sobrepunham aos de São José; e São José, por sua vez, devoto ardentíssimo do Divino Espírito Santo e cheio do Espírito Santo, ajudava-A, por assim dizer, a conhecer o que o Espírito Santo queria para a plena execução da vontade d’Ele.

Assim, Nossa Senhora era Esposa do Divino Espírito Santo a um título muito particular, o qual devemos ponderar quando consideramos o mistério da Encarnação.

A Virgem Maria Se tornou sua Esposa e começou a receber d’Ele orientações, diretrizes, atos de amor, consolações, “flashes” – se podemos empregar a palavra – de uma sublimidade insondável, referentes ao relacionamento de Nosso Senhor com Ela, formando com o Padre Eterno um convívio altíssimo, no qual Nossa Senhora era, a um título muito especial, Filha do Padre Eterno; a um título único, Mãe do Verbo Encarnado; e Esposa do Divino Espírito Santo. Tudo isso veio para Ela em virtude da Encarnação.

No momento em que a Santíssima Virgem concebeu o Verbo Encarnado, houve, por assim dizer, uma promoção assombrosa, na qual Ela inteira foi elevada a uma condição superior à de todos os Anjos e Santos. E de tal maneira superior que, se a santidade pudesse ser objeto de uma operação matemática – ela é algo de puramente espiritual –, mas se somássemos a santidade havida em todos os Santos desde o início da Criação até o fim do mundo e comparássemos com Nossa Senhora, Ela seria incomparavelmente mais santa do que toda essa montanha santíssima dos Santos de todos os tempos que o Espírito Santo foi suscitando na História.

Samuel Holanda
Aparição a Santa Catarina Labouré – Rue du Bac, Paris

Nós não temos ideia de qual foi e qual é a santidade de Maria. Moisés, quando pediu para ver a Deus, ouviu esta resposta: “Não poderás ver minha face, pois o homem não me poderia ver e continuar a viver” (Ex 33, 20). Eu me pergunto, às vezes: se nos fosse dado ver nesta vida terrena Nossa Senhora face a face, com todo o esplendor d’Ela, será que não morreríamos também?

Convívio com Nossa Senhora, convite à perfeita obediência

É verdade que a Virgem Maria tem aparecido a vários Santos. No entanto, Ela provavelmente encobre algo de sua santidade para esses não morrerem, ou confere graças muito especiais para aquele instante, a fim de eles poderem aguentar vê-La.

Santa Catarina Labouré, religiosa francesa do século passado que divulgou a Medalha Milagrosa, conta as aparições da Mãe de Deus assim: ela estava dormindo e, quando acordou, apareceu-lhe um menino que ela percebeu ser o Menino Divino, que disse para ela ir com Ele até a capela, porque sua Mãe a esperava lá. Ela mais do que depressa se alinhou e foi para a capela.

Havia muitas dependências entre a capela e a cela onde ela dormia e, ao longo de todo o caminho, todas as luzes estavam acesas como se se tratasse de uma grande festa.

E mais: quando ela chegou à capela, encontrou Nossa Senhora no presbitério, sentada numa cadeira de madeira que até hoje se oscula, se pode venerar. A Santa acercou-se d’Ela e, segundo consta, conversou com Ela tendo os cotovelos apoiados nos joelhos de Nossa Senhora.

O que deve ter restado em sua alma a vida inteira por aquilo que viu! A conclusão que tiro daí é que Nossa Senhora, falando com Santa Catarina Labouré, comunicou-lhe uma grandeza de alma e também uma obediência pelas quais, cada vez que a Santa era engrandecida nas sucessivas visões, ficava mais obediente.

Por que razão? Porque ela ia compreendendo cada vez mais a santidade inefável de Nossa Senhora e, portanto, cada vez admirando mais. E lhe ficava mais claro o absurdo que haveria em desobedecer à Mãe de Deus e àquele universo de santidade existente em seu Imaculado Coração.

A essência do espírito contrarrevolucionário

E, por causa disso, o crescimento na santidade, que deveria na aparência gerar uma espécie de sensação quase de igualdade, suscitava pelo contrário uma situação de inferioridade deliciosamente experimentada, vivida na exclamação: “Que paraíso é obedecer!”

Flávio Lourenço
Nossa Senhora “La Blanca” Catedral de León, Espanha

A essência do espírito contrarrevolucionário é isto: admirar tanto o poder no qual existe a autoridade para mandar em nome de Deus; em venerar e adorar tanto a Deus que manda por meio daquele poder, que quanto mais obedecemos, mais nossa alma se enche de graças. E, pelo crescimento na obediência, ela se eleva a uma altura e a uma harmonia verdadeiramente indizíveis.

Se alguém quer ser grande, procure ser pequeno. E peça a Nossa Senhora a graça de conhecer, intuir e avaliar a santidade d’Ela tanto quanto seja possível à fraqueza humana. Os que avaliarem crescerão enormemente em santidade e assim crescerão em humildade, porque não há santidade sem humildade. E se crescerem em humildade, quanto mais tiverem que obedecer, mais encantados ficarão.

Desse modo, para a alma humilde que gosta de obedecer, de admirar e de fazer-se pequena, o ideal nesta Terra é fazer-se escrava de Nossa Senhora. Mas no sentido de considerar-se, aos pés d’Ela, literalmente, como um “vermezinho e miserável pecador”, como diz São Luís Grignion. Porque pecados o homem os comete, embora insignificantes e minúsculos, ainda quando se trata de um grande Santo; e, portanto, qualquer ser humano é um miserável pecador, um vermezinho da terra… Deus o esmaga quando quiser, tira-lhe a vida quando entende, dá-lhe a saúde ou a doença conforme Lhe apraz. Nós estamos na completa dependência de Deus para tudo quanto Ele queira.

Mas que felicidade para nós pensar: é verdade, somos tão pequenos perto d’Ele que quanto mais reconhecemos nossa pequenez, mais nos unimos a Ele e mais Ele nos coloca em seu Sagrado Coração!

União com a Santa Igreja, militância no Céu

É amando cada vez mais a Nosso Senhor Jesus Cristo em Nossa Senhora, amando a ambos na Santa Igreja que nossas almas vão progredindo e tomando uma dimensão de compreensão cada vez mais profunda de como é a Igreja.

De maneira a termos, em certos momentos, a impressão de que nos fizemos um só com a Santa Igreja e que, surgindo um problema, antes mesmo de saber como ela o resolveria, nós mesmos adivinhamos, pela estreita união com ela, cujo espírito possuímos inteiramente.

Compreende-se por esta forma que a união inteira com a Igreja deva ser o nosso último e supremo ideal. E o que eu quero ter em vista antes de tudo é que, quando eu morrer, subirei para ser um membro da Igreja gloriosa, mas gloriosa militantemente. E que, no Céu, uma das minhas alegrias será a de lutar como lutei na Terra.

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Nós sabemos pela Teologia, Cornélio a Lápide diz isso, que os demônios têm certo conhecimento do que se passa no Céu, mas um conhecimento cheio de ódio, no qual não entra um pingo de admiração, apenas inveja ou revolta; e eles têm ódios especiais a certas coisas. Por exemplo, eles veem na vida celeste as almas que eles quiseram perder e levar para o Inferno e, vendo-as naquela felicidade altíssima junto ao trono de Deus, eles blasfemam, injuriam. E muitas vezes os Bem-aventurados os contestam e com isso ferem o seu orgulho.

E assim há uma espécie de continuação da militância no Céu. Imaginem quando nós estivermos cantando as glórias de Deus, de seus Anjos e Santos por toda a eternidade e, de vez em quando, no meio de nosso cântico, pudermos entrar em contenda contra o demônio, ação com a qual se rejubilam todos os Anjos que lançaram no Inferno aquele canalha. De maneira que há uma associação maravilhosa de relações.

Pequenos e puros, como gotas de orvalho

Enfim, neste dia da Anunciação, pensemos nas glórias da Santíssima Virgem Maria. Filha do Padre Eterno Ela foi sempre; Mãe do Verbo e Esposa do Espírito Santo tornou-Se com a Encarnação.

Maria subiu com isso a alturas inexcogitáveis, desde as quais olha e acompanha a vida de cada um de nós. E queira Deus que Ela perdoe as imperfeições que há no interior de todos nós; que não olhe para elas, mas apenas para sua misericórdia e que sorria ao Divino Espírito Santo, sorria a Jesus Cristo Nosso Senhor e ao Padre Eterno, e diga à Santíssima Trindade: “Vede, tende pena e compaixão deles, ajudai-os a serem inteiramente aquilo para o qual foram criados, e neste ponto sejam fiéis como verdadeiros escravos, fazendo inteiramente a minha vontade que é a vossa, Trindade Santíssima! E fazei com que esses escravos fidelíssimos sujeitem ao meu império o demônio rebelde”.

Arquivo Revista
Dr. Plinio em 1995

Eis as graças que neste 25 de março compete, a meu ver, suplicar: rezar a Nossa Senhora para pedir uma tal união com a Santa Igreja Católica, que sejamos como Ela; não tanto quanto Ela, mas à maneira d’Ela, como uma gota de orvalho na qual bate um raio de sol é como o Sol.

A gota de orvalho é linda, é pura, ela encanta; um raio de sol que incide sobre ela fá-la brilhar inteira. Mas o que é a gota de orvalho em relação ao Sol? A desproporção entre Nossa Senhora e cada um de nós é muito maior do que a que há entre a gota de orvalho e o Sol.

Peçamos que, à maneira da gota de orvalho, sejamos humildes e pequenos, mas puros, fortes, e que do entusiasmo de nossa pureza e de nossa força parta um constante ataque contra os inimigos eternos de Deus.

(Extraído de conferência de 25/3/1995)

1) Cf. SÃO LUÍS MARIA GRIGNION DE MONTFORT. Traité de la vraie dévotion à la Sainte Vierge, n.243. In: Œuvres Complètes. Paris: Du Seuil, 1966, p. 650.

2) Do latim: “A Carne de Cristo é a carne de Maria”.

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