Dr. Plinio se encontrava em grande perplexidade… “Tudo está acontecendo de modo tão atravessado em nosso apostolado, tão diferente do que sempre esperei. Não será por minha culpa? Como ficará a derrota da Revolução?” Em meio a essas e outras pungentes cogitações, ao fitar uma estampa da Mãe do Bom Conselho de Genazzano, ele teve, inexplicavelmente, uma impressão viva, direta, de que as promessas de Nossa Senhora se realizariam.
Durante o período em que permaneci no hospital, encontrava-me perplexo com meu estado de saúde, porque nunca tinha adoecido. Eu era, e ainda sou, graças a Deus, um homem muito forte, entre outras coisas, com um apetite fenomenal. De repente caí enfermo e logo sofri a primeira operação de minha vida.
A maior provação da vida
E dizia de mim para comigo: “Que esquisito aparecer para mim, um homem tão robusto, esta doença que nunca houve em ninguém de minha família nem do lado paterno, nem do materno. Não entendo por que ela me apareceu. Se o indivíduo é extraordinariamente glutão de doces, e então abusa, pode aparecer-lhe uma diabetes, mas não é o meu caso, que sempre fui muito mais interessado em comidas salgadas… Como algum doce, mas não sou grande entusiasta deles”.
E naturalmente me veio ao espírito a ideia de que eu poderia morrer, havendo razão para temer, pois já estava com sessenta anos. Eu não tinha medo da morte. A principal preocupação era deixar a minha obra inacabada, morrer antes de ter cumprido minha vocação, sem ter realizado o que pareceria ser do desejo de Nossa Senhora; e que houvesse, portanto, um castigo d’Ela para mim, por algum defeito meu. Esse era o meu pavor, o que eu mais receava. Quando se tem a consciência tranquila, a morte é uma entrada no grande repouso, na glória de Deus. Mas eu sabia que ainda tinha muito a fazer. E estava tomado por essa provação interior muito forte.
Diante de qualquer fato surpreendente que nos sucede, nós devemos sempre nos perguntar se não temos culpa por ele. Toda pessoa que tem consciência da debilidade humana neste vale de lágrimas deve se fazer a si mesma essa pergunta. Evidentemente, eu era obrigado a fazê-la, e ela se me apresentava de maneira angustiante:
“Tudo está acontecendo de modo tão atravessado em nosso apostolado, tão diferente do que sempre esperei; logo, alguma coisa está errada. Não será por minha culpa? Será que eu fiz algo que desagradou a Nossa Senhora e pelo que Ela resolveu tirar-me a vida? O que eu fiz? Não terei eu cometido alguma infidelidade que me mereça como castigo que minha missão seja assim cortada ao meio? Será um castigo? Como fica minha vocação? Quem sabe se não a realizarei e morrerei agora?”
Essas perguntas pungentes eu poderia respondê-las, mas minha consciência não me acusava nada de positivo a esse respeito. E a questão era que há uma expressão da Escritura que fala do pecado oculto,1 o qual o indivíduo pode ter cometido sem o perceber, uma atitude desagradável a Deus que torna a alma passível de castigo, sem que o homem tenha a respeito dela uma noção clara. Não se trata aqui de um pecado no sentido de culpa teológica, mas de uma infidelidade que pode provocar um castigo.

Às vezes um defeito moral do profeta pode determinar o não cumprimento da profecia; não seria eu o miserável, o infiel, o indivíduo péssimo, por cuja infidelidade – pequena é verdade, mas quando de mim se deveria exigir uma fidelidade total – as coisas não estavam se dando como deveriam?
Poderiam acontecer duas coisas: uma, que Nossa Senhora enviasse um outro para cumprir minha missão. Se eu soubesse que ela se realizaria, diria: “Minha Mãe, eu me entrego nos braços de vossa misericórdia insondável. Expiarei confiando no vosso perdão”. E depois de um Purgatório mais ou menos longo, eu ainda teria a alegria de ver que aquilo que eu não tive valor para fazer, ao menos um outro realizou, e Nossa Senhora foi bem servida.
No entanto, o pior seria Nossa Senhora designar um homem para uma missão, ele não a cumprir e Ela não enviar outro, sendo este mesmo eternamente responsável pela missão não cumprida.
Considerar a extensão de nossa missão e o vazio que haveria se a TFP não a cumprisse; as razões que eu tinha de temer que eu, morrendo, ela ficasse gravissimamente prejudicada ou – causa-me horror pensar – se dissolvesse e, como consequência, as repercussões desfavoráveis que isso teria sobre o andamento da Causa ultramontana; que o plano, portanto, a derrota da Revolução, não se realizaria por infidelidade minha, rachava-me literalmente no que tem de mais profundo na minha alma. Compreende-se que, a menos que eu não tomasse a sério minha própria missão, assim deveria agir.
Estava nessa perplexidade…
No hospital, a entrega da estampa
Em meio a esse sofrimento, muito aborrecido, lembro-me de que certo dia estava no quarto do Hospital Sírio-Libanês, sentado, deixando passar o tempo, como fazem os enfermos, conversando com alguns membros do Grupo que tinham ido me visitar. Eu já me sentia bem melhor. Eram cerca das seis da tarde e me encontrava perfeitamente acordado, sem estar sob a ação de remédios, como se diz em latim compos mei,2 tanto senhor de mim quanto se vê que estou no momento em que falo.
Quando, enfim, um deles apanhou um rolo de papel e me disse: “Olhe! Aqui está a estampa de Nossa Senhora de Genazzano que o senhor mandou pedir na Itália. Nós a trouxemos para o senhor”.
Era um amigo meu, membro do grupo de Minas, que viajara à Europa por aquele tempo e me trouxera a estampa a pedido meu. E eles fizeram a amabilidade de me levar lá, a fim de animar-me no estado em que me encontrava, como se faz a um doente a quem se procura mostrar coisas boas, piedosas, que animem.

Quando me apresentaram, eu estava longe de me lembrar do livro sobre Genazzano que tinha lido antes de adoecer. Não dei muita atenção àquilo, manifestei interesse, mas sem esperar nada de extraordinário, julgando que veria uma estampa popular, comum. Tiraram-na de um canudo e a desenrolaram. E o que eu vi?
Um sorriso e uma mensagem
Quando me deparei com ela, se deu algo de inesperado: eu senti uma consolação, um atrativo, tive a sensação singular de que Nossa Senhora de Genazzano me olhava com afeto, com muito amor e sorria para mim, não fisicamente, mas pelo olhar, com um sorriso inexcedivelmente bondoso.
Eu tenho certeza que a Virgem na estampa mudou de fisionomia quando eu a fitei. A expressão d’Ela era materna, amável. E, sem me falar, o olhar d’Ela, o jogo de fisionomia, me comunicou algo de um modo muito firme, nítido, como se Ela estivesse dizendo no interior da minha alma:
“Meu filho, pode haver muito contratempo que te faça sofrer. Tu ainda passarás por muitas situações difíceis, nas quais te julgarás perdido; muitos reveses te acontecerão e te darão a impressão de que a vocação não se realizará. Mas, está tranquilo, não temas, não te incomodes, caminha para a frente, confia, porque Eu não deixarei acontecer nada. Essa doença não te vai matar, eu conduzirei o teu restabelecimento de maneira a não haver solavancos, e tu voltarás à tua atividade normal. Tu tens minha promessa. Eu te ajudarei a levar até o fim a realização de tua vocação. Queres um argumento? Este argumento é o meu sorriso. Lembra-te sempre dele e nunca desanimes, e confia sempre que o que Eu estou prometendo, realizar-se-á! Tu cumprirás a tua missão!”
Não foi uma aparição, uma visão, uma revelação; não era propriamente uma profecia, não houve um milagre, nada se moveu ou se modificou no quadro, eu não vi resplendor, eu não vi coisa alguma, não ouvi voz, ela não estava dizendo: “Plinio!” Mas eu tive inexplicavelmente, com aquela promessa, uma impressão tão viva, tão direta como se eu tivesse ouvido a voz d’Ela… Uma impressão não, é como uma certeza de quem ouve claramente uma palavra dita; eu não posso explicar como foi, mas foi assim.
Passados anos hoje desse fato, eu não duvido que tenha sido uma comunicação d’Ela, porque foi algo cuja objetividade e autenticidade não podia pôr em dúvida.
Era uma segurança que eu nunca tinha tido, depois de uma provação tão grande como jamais tivera também. É o serrote: auge da provação, auge da segurança.
O que a estampa tinha feito para mim era uma mudança de fisionomia, mas que nas circunstâncias continha essa promessa, essa esperança. Debaixo desse ponto de vista, quase que ela poderia chamar-se Nossa Senhora do Sorriso. O que ela traz de apaziguante, de enternecedor, de especial, mas muito especial, me reconfortou extraordinariamente. No dia em que eu a recebi, nasci de novo.
Foi uma graça única! Foi a abertura de uma janela do Céu!
1) Cf. Sl 18, 13: “Quem pode, entretanto, ver as próprias faltas? Purificai-me das que me são ocultas”.
2) Do latim: senhor de mim.