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O serviço de Deus acima de tudo

Dona Lucilia não permitia que seu filho arriscasse a vida por causa de uma revolução política qualquer. Mas preferia morrer ou vê-lo morto se ele não tomasse as armas numa guerra em defesa da Santa Igreja.

Em 1950, o Bispo de Jacarezinho fez questão fechada de que eu me candidatasse a deputado federal por aquela cidade. Eu estava chegando da Europa e tinha apenas quinze ou vinte dias para uma campanha eleitoral.

Divulgação (CC3.0)

Divulgação (CC3.0)
Jacarezinho, na década de 1950
Divulgação (CC3.0)
Estradas do Paraná, na década de 1950

Alegria por uma candidatura frustrada

Assim, passei repentinamente de Paris para as estradas que ligavam as várias cidades do Norte do Paraná, naquele tempo as mais poeirentas que se possa imaginar, sem falar nos solavancos e desconfortos da campanha eleitoral.

Quando me despedi de mamãe para ir ao Paraná, como também no retorno a São Paulo, após a campanha eleitoral, ela tratou-me, como de costume, com muito afeto e carinho, parecendo-me tudo normal. Nem prestei maior atenção às reações dela, tratando-a com aquela confiança sem limites que eu tinha nela, habituado à ideia de que tudo quanto ela fizesse era sempre o melhor possível, estava perfeito. Aliás, posso quase dizer que só prestava atenção nela para admirá-la, querê-la e imitá-la.

Arquivo Nacional (CC3.0)
Dom Geraldo de Proença Sigaud, Bispo de Jacarezinho, na década de 1950

Quando começaram a chegar os resultados da apuração, constatou-se que, embora eu tivesse recebido uma boa votação para tão pouco tempo de campanha, não completava o número suficiente de votos para minha eleição.

Ao receber a notícia de que eu não tinha sido eleito, Dona Lucilia, com aquela serenidade e aquele timbre de voz, ao mesmo tempo grave e doce, que lhe eram característicos, disse-me:

— Como eu fico alegre com a sua derrota!

Fiquei muito espantado e disse a ela:

— Mas, meu bem, por que a senhora diz uma coisa dessas? A senhora não vê que eu poderia ficar deputado e prestar serviços à Religião?

Arquivo Revista
Dr. Plinio trajado com o hábito de terciário carmelita, em fins da década de 1950

— Meu filho, é verdade. E se Deus assim o quisesse, eu também quereria. Mas fico alegre por Ele não ter querido, porque ao menos você não vai para o Rio e fica mais perto de mim.

— Mas a senhora não gostaria de ter um filho eleito mais uma vez como deputado?

— A vida, meu filho, não é isso. Abaixo do serviço de Deus, viver é estar juntos, olhar-se e querer-se bem.

Este é um conceito tão antimoderno, como mais eu não conheço. Notem que se eu tivesse que morar no Tonkin, para o serviço de Deus, ela teria concordado inteiramente. Portanto, não era uma palavra vazia.

Morrer pela Religião, sim; mas não por uma revoluçãozinha

Certa vez houve uma convocatória de reservistas para uma de nossas revoluções, e ela quis que eu fugisse. Então, um tio meu, brincando com ela, disse:

— Então, Lucilia, no dia em que o Brasil entrar numa guerra, não poderá contar com esse soldado?

Ela respondeu:

— Não, você se engana muito! Se for para uma guerra justa, eu preferia morrer, ou ver meu filho morto, a constatar que ele não tomou as armas, sobretudo em defesa da Religião. Mas por causa dessa revoluçãozinha não quero arriscar a vida de meu filho.

Meu tio, que era liberal até a raiz os cabelos, ficou horrorizado com essa impostação de morrer pela Religião.

Despediram-se, ela fechou a porta e voltou para dentro de casa com aquela calma recolhida, povoada de sobrenatural.

(Extraído de conferência de 24/5/1969)

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