Seria tanger a injustiça se considerássemos este ou aquele povo, esta ou aquela nação, muito acima de quaisquer outros, simplesmente por um gosto pessoal. Cada país, cada povo, se corresponder aos desígnios que sobre ele tem a Providência divina, realiza e manifesta maravilhas incomparáveis, que apenas ele é capaz de conceber e concretizar. Desse modo, a soma das mais variadas excelências nacionais rendem ao Criador a glória que lhe é devida.
Sem lesar essa justa apreciação das coisas, é-nos legítimo, portanto, admirar um povo exatamente pelos seus aspectos peculiares, suas grandezas e qualidades particulares, pela beleza de suas expressões culturais, artísticas e religiosas que só ele é chamado a mostrar ao mundo.
Assim, é com afeto e esperança que meus olhos sempre se voltaram para a nação peruana, por ver nela um objeto da especial predileção de Deus. Afeto de quem a considera uma nação irmã pelos vínculos da mesma fé católica; esperança de quem almeja para ela todo o esplendor temporal e espiritual digno de um povo tão amado pelo Criador.
A meu ver, no conjunto da América Latina, o Peru é destinado a exercer papel análogo ao da França no continente europeu. A Europa é constituída por grandes povos, com qualidades, características insignes e importância no concerto mundial que seria supérfluo enaltecer. Basta pensarmos numa Alemanha, numa Espanha, num Portugal, na Inglaterra ou na Itália, para compreender que os mais altos valores da humanidade se acham ali representados de forma única.
Porém, verdade é que, entre essas nações, a França reluz como a filha primogênita da Igreja, por ter sido o primeiro povo a se converter ao catolicismo depois da queda do Império Romano do Ocidente. Nessas condições, coube-lhe sempre esse quê de predileção por parte da Providência, que a favoreceu não só com uma profusão de santos e heróis da fé, mas também com uma formosura de alma especial, incomparável, que a destaca à frente dos outros povos europeus, todos eles — insisto — também senhores de belezas morais invulgares.
Ora, o mesmo se poderia dizer do Peru, incrustado no continente americano. É o país do charme, do bom-gosto, da inteligência, da distinção. Após um período de civilização pagã, espargiram-se sobre ele as bênçãos do catolicismo, e teve início o que poderíamos chamar a sua era das predileções. As águas do Batismo o cristianizaram, os expoentes do povo se tornaram também filhos eleitos da Igreja Católica, considerados irmãos do rei de Espanha, da Espanha católica que colonizou o Peru e lhe abriu os caminhos para que se tornasse uma das jóias da Civilização Cristã.
Teve então origem uma ordem de coisas cuja beleza e orientação católicas ainda se fazem sentir nos seus antigos monumentos, como se pode contemplar na famosa Praça de Armas, de Lima. Sobretudo, surgiram igrejas, catedrais e mosteiros magníficos, brilharam artistas inspirados por uma profunda piedade, reluziram santos como São Martinho de Porres, Santa Rosa de Lima, São Toríbio de Mogrovejo; cintilaram almas fervorosas que deram ao Peru esse caráter de verdadeiro relicário das Américas e uma das imorredouras glórias desse continente.
Se corresponder aos dons divinos, estão reservados ao Peru esplendores inimagináveis, perto dos quais os de outrora não serão senão esboços…
Sabemos que tais dons não são concedidos em vão pela Providência. Ela os despende com vistas a dar ainda mais, caso o beneficiado corresponda às graças recebidas. Se assim suceder com o Peru — conforme desejamos, pelos rogos de Maria Santíssima — este poderá alcançar esplendores inimagináveis, perto dos quais os que hoje admiramos não serão senão esboços. v