jueves, noviembre 21, 2024

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Alegrai-vos no Senhor, ó justos!

Quantas preocupações, abatimentos e dores palmilham nossa existência! Em determinados momentos, pensamos tudo abandonar. E a frase do Eclesiastes brota em nossos pensamentos: “Vaidade das vaidades, tudo é vaidade! Vi tudo o que se faz debaixo do sol, e achei que tudo era vaidade e aflição de espírito!” (Ecl 1, 2.14). Como conservar a alegria em meio às adversidades? Como enfrentar o sofrimento com inteiro ânimo?

Dr. Plinio, comentando o Salmo 31, mostrará quão grande são as consolações daqueles que amam o Senhor, mesmo vivendo neste “vale de lágrimas”!

Continuemos os comentários que vínhamos fazendo a cada versículo do Salmo 31.

Tu és o meu refúgio na tribulação que me cercou; ó alegria minha, livra-me dos que me cercam.

A esse penitente que se arrependeu e confessou seus pecados, Deus permitiu fosse oprimido por dificuldades. Porém, no meio desse cerco, ele pensa no Altíssimo como sendo a razão de sua alegria. Assim, encontra recursos para resistir e ser feliz.

Como prêmio, o caminho do Céu

Inteligência te darei, e ensinar-te-ei o caminho que deves seguir.

Até aqui o Salmista tem se dirigido a Deus. Agora, é o Senhor quem lhe responde, prometendo-lhe uma recompensa nesta Terra. Mas esse prêmio não consiste em tornar a vida agradável, e sim ensinar o caminho do Céu.

Ou seja, Deus concede ao homem a compreensão exata de todos os princípios e verdades que temos conhecido ao longo dessas considerações sobre os Salmos Penitenciais. Dessa maneira, o homem encontra o que precisa, isto é, aquele caminho a ser seguido por ele. Para onde? Em direção à bem-aventurança eterna.

Portanto, Deus favorece a criatura humana com a inteligência e a força de vontade para trilhar as sendas que a conduzem ao Céu. Detrás das nuvens de todas as provações, ele diz ao homem: “Estou além dessas nuvens da dor. Atravessa-as, que tu me encontrarás. Vem a mim, ó meu filho!”

E Deus acrescenta:

Fixarei sobre ti os meus olhos.

É a recompensa extraordinária. Vê-se que certas pessoas comuns são sofredoras, e os olhos de Deus estão sobre elas.

Já tive oportunidade de recordar aqui a figura de uma senhora que me impressionava de modo particular, quando a observava se dirigindo para a igreja. Andava com um passo lépido, animada, levando freqüentemente uma sombrinha cuja utilidade parecia discutível, pois nem sempre havia ameaça de chuva ou sol forte. Entretanto, nela se notava algo como se fosse a bandeira da dor. Sua face era semi-encoberta por um pano, ocultando-lhe o nariz e a boca, sem impedir que pudesse falar à vontade. O véu, tanto quanto me era dado ver, invariavelmente limpo, de uma cor lilás profunda, quase azul-marinho, preso atrás da cabeça. Era patente que ela perdera o nariz.

A senhora suportava essa cruz com alegria, tendo o mais das vezes um olhar ridente, gracejador.

Deus a fitava. E nos olhos dela, percebia-se algo do lúmen do olhar do Criador.

Entendimento para fazer a vontade divina

Não queirais ser como o cavalo e o mulo, que não têm entendimento.

Deus guia os homens, não porém à maneira como estes conduzem os cavalos. Porque o animal tem a natureza de se deixar levar, sem compreender nada. Apenas executa o que lhe ordenam. Entretanto, ao homem Deus dá entendimento, inteligência, para que ele conheça e corresponda à vontade divina. Por sua bondade infinita, o Senhor nos oferece suas graças e seus dons celestiais, fazendo com que tenhamos atração pela santidade d’Ele.

“Alegrai-vos, ó justos, pois tudo conduz ao Paraíso, e a felicidade do homem nesta Terra é a esperança do Céu!”

V. Domingues
Imagem de Profeta, Catedral de Santiago de Compostela (Espanha)

O homem então caminha rumo à união com Deus, não como um cavalo que apanha quando não cavalga direito — e, portanto, mais ou menos se deixa conduzir — mas sua alma deseja o que Deus quer, entende a verdade que Deus revela e ama o bem que Deus indica. Estabelecido o vínculo entre o Altíssimo e a alma, tornam-se amigos, aplicando-se a eles o que diz o Salmista em outro texto: “Tu que comigo, à minha mesa, comias doces frutos” (Sl 54, 15).

A amizade é a convergência de duas almas no conhecimento e no amor de Deus; no amor e no conhecimento da Santa Igreja Católica Apostólica Romana.

Qual é a definição de amigo? É aquele que — como eu — adora, entende e quer a Deus. Esse é meu amigo porque é um outro eu mesmo. A esse propósito, evoco o que por vezes acontece em nossa vida diária. Alguém me procura para expor seus problemas pessoais, não raro em horários inoportunos, transtornando meus afazeres, etc. Olho para o meu interlocutor e penso: “Como ele seria se fosse mau? Entretanto, ele é bom, vive habitualmente em estado de graça. Então, como o quero porque ele quer a Deus, como o amo porque ele ama a Deus, considerando o que nele há de católico, tomo-o como meu semelhante. E a semelhança atrai a amizade.”

Um necessário exame de consciência

Seria de grande proveito fazermos um exame de consciência diário, no qual rememorássemos todos aqueles do movimento com quem tratamos. E se nesse convívio pensamos o seguinte: “Como ele seria se não fosse do nosso grupo? E como ele é melhor sendo um dos nossos! O que poderá vir a ser, se for santo? De que modo brilhará? Como eu amo as esperanças que Deus deposita nesse meu irmão de vocação! Ah! Como me alegra o fato de ele perseverar e corresponder às graças divinas, aproximando-se o quanto possível dos desígnios de Deus sobre ele! Nosso Senhor o ama nessa perspectiva, eu também o quero assim!”

Nesse sentido, precisamos nos querer intensamente. E estimar nosso irmão de vocação, não porque seja engraçado, porque conte coisas jocosas, nem por sua esperteza ou por sua generosidade para comigo, mas sim porque ele ama Deus, Nossa Senhora, a Santa Igreja Católica. E por causa disso, embora possa ter esses ou aqueles defeitos, há nele fundamentalmente tal linha. Esta linha eu amo como a luz dos meus olhos.

Alguém poderia objetar: “Mas, ele não me entende, não gosta de mim”.

Então, devo amá-lo duplamente. Porque se ele me dá algum desgosto, mas lembro-me de que é um membro de nosso movimento, e no essencial de sua vida tende a realizar nosso ideal, é diferente dos que me são estranhos, ofendem a Deus e não se incomodam.

Em última análise, se um homem, ao pecar, agride o seu Criador, ele se torna digno de minha censura e rechaço. Se dá uma bofetada só em mim… que importância tem? Por mais especial que me julgue, sou uma mera criatura, “um verme e não um homem” (Sl 21, 7), como diz a Sagrada Escritura.

Então não devemos resmungar: “Ele não reconheceu que tenho grande inteligência….”

Ah! pobre miserável, você próprio não reconhece que não é nada?

Lutar pela glória de Deus

Com o cabresto e com o freio, sujeita as queixadas daqueles que não quiserem obedecer-te.

Quer dizer, o homem deve sujeitar as pessoas que não queiram obedecer-lhe.

Esse versículo encerra uma invulgar beleza, porque contradiz uma certa concepção piegas do católico, segundo a qual este deve apanhar sempre, ser um songamonga, incapaz de lutar, de se defender, de entrar numa querela, numa verdadeira discussão onde está em jogo a glória de Deus.

Contudo, dir-se-ia haver uma discrepância entre essa atitude e o que dissemos anteriormente sobre a necessidade de não darmos importância — ou pouca, na medida do razoável — ao que se faz contra nós. E agora, esse versículo afirma que é preciso sujeitar quem não nos obedece.

A explicação é a seguinte. Devemos desejar que todo homem, como nós, sirva e ame a Deus. E por isto, Deus declara: “Deixei um cabresto e um freio na tua mão, porque, se alguém não cumprir minha Lei e se revoltar, tu tens obrigação de sujeitá-lo”.

Regozijo dos que têm coração reto

Muitas dores esperam o pecador, mas o que espera no Senhor será cercado de misericórdia.

Frase sobremodo bonita: muitas dores esperam o pecador. Ou seja, não pensemos que Deus não castiga o ímpio nesta vida. Apenas não o faz com aquela clareza que desnaturaria as coisas.

E ao justo, o que acontece? Ele não sofre dores? Não está dito isso, mas sim que será cercado de misericórdia. Tudo para ele é clemência, até quando padece.

Alegrai-vos no Senhor e regozijai-vos, ó justos, e gloriai-vos todos os que sois de coração reto.

Cumpre nos indignarmos diante dos pecados torpes e as injúrias graves a Deus que se espalham pela face da Terra. Entretanto, ao ouvirmos o Salmista que canta: “Alegrai-vos no Senhor e regozijai-vos, ó justos…”, devemos nos entusiasmar e estarmos felizes. Porque aos justos, Deus não diz: “Ficai contente com as coisas do mundo”, mas: Rejubilai-vos, pois tendes o coração reto e Eu vos cerco de misericórdia.”

Mesmo a quem esteja sofrendo muito, padecendo martírios inenarráveis, a tal ponto que seja um milagre suportá-los, também é dirigida esta frase: “Alegrai-vos, ó justos”, etc., pois tudo conduz ao Paraíso, e a felicidade do homem na Terra é a esperança do Céu.

Com esse pensamento concluímos nossas considerações sobre este belo Salmo 31.

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