A plenitude de autoridade conferida por Deus a um homem — ou seja, a do Papa sobre os fiéis —, oferece a Dr. Plinio a oportunidade de discorrer sobre o interessante tema do governo e do mando em todas as camadas da sociedade humana.
O mando. Tema por demais vasto, próprio a amplas análises e aprofundamentos, dele tratarei de maneira sucinta, mais adequada às nossas breves exposições.
Uma pessoa investida de autoridade, em qualquer campo da atividade humana, tem o direito de ordenar a um subalterno: “Faça tal coisa, porque é certa; não faça tal outra, pois é errada”. Assim, indiretamente, ela vai adquirindo determinado poder sobre o modo de agir do subordinado.
Com o Papado, estabeleceu-se o mando sobre o pensamento humano
Contudo, a mais excelsa autoridade, no sentido pleno da palavra, aquela que tem o direito e o poder de influenciar, não apenas a ação, mas também o pensamento de outrem, foi instituída pelo próprio Deus. Com efeito, Nosso Senhor Jesus Cristo a estabeleceu de forma sublime quando, com simplicidade e majestade divinas, disse ao Príncipe dos Apóstolos: “Tu és Pedro, e sobre essa pedra edificarei a minha Igreja; as portas do inferno não prevalecerão contra ela (Mt 16, 18). Nesta ocasião foi instituído um mando sobre o pensamento humano.
Ao confiar ao Príncipe dos Apóstolos as chaves do Céu e da Terra, Nosso Senhor Jesus Cristo instituiu a mais excelsa autoridade e o mando sobre o pensamento do homem
Claro está, dotado de livre arbítrio, nada impede o homem de pensar diferentemente do prescrito pelo Sumo Pontífice. Porém, essa mesma autoridade suprema o adverte que, se assim o fizer e no seu pensamento errado permanecer, professando idéias contra a fé, morrendo impenitente será condenado. Por outro lado, se pensar corretamente, de acordo com os ensinamentos da Igreja, poderá passar grandes dificuldades nesta vida, mas, ao findá-la, obterá o Céu. Portanto, as portas do Paraíso e as do inferno são os termos últimos do pensamento humano.
Deus fundou a Igreja infalível, cujo supremo hierarca, segundo as condições estabelecidas por ela, tem o direito de dizer aos homens: “Creiam em tais princípios, porque represento e falo em nome de Deus, conforme se acha consignado no Evangelho”. Em vista disso, alguém poderia objetar: “Ora, a pessoa que assim obedece torna-se um robô!”
Pelo contrário, é uma criatura racional, plena de certezas, convicta de que somente o Papa tem esse direito de influir no seu modo de pensar, porque o faz conforme a autoridade infalível que lhe conferiu Nosso Senhor Jesus Cristo.
O meio mais seguro de se conhecer a verdade
Como se sabe, por particular assistência do Espírito Santo, em matéria de fé e costumes o Papa é inerrante, e quem o segue nas suas orientações igualmente não cairá em erro. Além disso, o Filho de Deus também prometeu a Pedro e, na pessoa deste, a seus sucessores: “Tudo o que ligares na Terra será ligado nos céus; e tudo o que desligares na Terra será desligado nos céus” (Mt 16, 19). Quer dizer, mais uma demonstração de primazia incontestável sobre os desígnios do homem.
Donde se poder considerar que o meio mais seguro de utilizar minha razão falível para conhecer a verdade, com total certeza, é seguir inteiramente aquele que é infalível. Obedecendo-o, não errarei.
O dogma da infalibilidade papal foi definido pelo Concílio Vaticano I, em 1870, presidido pelo [Beato] Papa Pio IX, com a participação dos bispos de todo o mundo. A partir dessa definição dogmática, a autoridade pontifícia se fez sentir com mais firmeza, mais vigor e desembaraço do que nas épocas anteriores. Nesse sentido, alcançou sua genuína plenitude. Este é o mais augusto de todos os graus de mando.
Sem uma autoridade infalível, o mundo seria caótico
Já tivemos ocasião de comentar que, se não houvesse na Terra uma autoridade infalível, capaz de mandar na ordem do pensamento, ensinando a verdade, o mundo se arrastaria num caos. Pois a respeito dos mais variados assuntos, os homens pensam de modo diferente, discutem e raramente chegam a um acordo. E a unicidade de idéias sempre será obtida quando todos, convictos de que o Santo Padre é infalível nas circunstâncias mencionadas, voltem-se para ele, dizendo: “Nos ensinamentos do Papa estão a certeza, o caminho para o bem, o fundamento da ordem — o verum, o bonum e o pulchrum. A verdade, o bem e a beleza. Para o Vigário de Cristo se vive e por ele se morre.”
Estando sujeito ao erro, o homem entretanto possui suficiente lume para saber, com inteira segurança, que o Papa tem o poder de guiá-lo para onde deve ir. E nele deposita sua confiança plena, sem nenhuma sombra de dúvida.
O mando do qual dependem os outros mandos
A esse propósito, lembro-me de estar certa vez, numa hora tardia, à espera de condução em frente à igreja de Santa Cecília, em São Paulo. A rua se achava deserta, num bairro então eminentemente residencial, apenas com casas, sem prédios de apartamentos. Sozinho naquele cenário urbano, eu aguardava o ônibus, enquanto olhava para a fachada da igreja. Em determinado momento, o relógio de sua torre bateu as horas, e me veio este pensamento que nunca mais abandonou meu espírito:
“Nessas residências, cujos moradores estão provavelmente dormindo, os relógios continuam a funcionar, como o da torre da igreja de Santa Cecília. Nesse local, o único relógio que indica a hora certa é o da igreja. Quando ele toca, todos os outros se acertam por ele. E quem, estando com as luzes apagadas, não consegue conciliar o sono, fica sabendo qual é a hora exata, porque esse relógio soou.
A vida neste mundo se arrastaria num caos, sem a voz do Papa infalível que dita a hora certa para o agir humano
“Este é um símbolo de que o pensamento correto do homem é ditado pela voz do Papa. Se o mundo a abandona, vai se deixando invadir pelo desatino e por toda sorte de extravios.”
Portanto, a autoridade pontifícia é o mando por antonomásia. O Papa é o mestre supremo da verdade, sob cuja direção todos os homens devem pensar. E quem deseja exercer o mando autêntico deve ter o olhar e o coração continuamente voltados para o Sucessor de Pedro, com a intenção de servi-lo, para a defesa e a expansão da Igreja Católica. Do contrário, será um mando vão, sem sentido.
Então, a autoridade exercida por um mandarim — palavra originária de “mando”, com a qual os missionários da China no século XVI designavam os governadores das províncias daquele império —, por um banqueiro, um dono de jornal, etc., deve ter como objetivo, em última análise, servir ao Papa, isto é, à Igreja Católica da qual ele é a cabeça. Essa é a verdadeira acepção do mando.