Desde as minhas primeiras impressões a respeito do garbo e da beleza dos trajes com que certas corporações militares se apresentavam outrora, transformei-me numa espécie de colecionador, em minha memória, dos vários e lindos tipos de uniforme que conheci ao longo dos anos.
De maneira particular me entusiasmei quando, pelos idos de 1950, fui convidado a assistir uma cerimônia de canonização na Basílica de São Pedro, em Roma, e, em meio à pompa toda particular e grandiosa dessa solenidade, pude considerar de modo mais minucioso o uniforme da Guarda Suíça do Papa. A meu ver, concebido com extremo bom gosto e, no seu conjunto, manifestando um esplendor que culmina no seu capacete prateado, superiormente adornado por plumas vermelhas ou brancas.
Quando os vi, veio-me logo o desejo de comprar um daqueles capacetes a fim de trazê-lo para casa, como recordação desse maravilhamento que senti ao contemplá-los no meio dos fulgores de uma cerimônia de canonização.
Uniforme concebido com extremo bom gosto, cujo esplendor culmina no capacete prateado, ornado de plumas vermelhas ou brancas
De fato, antes de retornar ao Brasil procurei o comando da Guarda Suíça, onde fui atendido de forma muito amável pelo comandante, na época um fidalgo da Suíça alemã. Após nos cumprimentarmos, expus-lhe o motivo de minha visita e o meu intuito de adquirir um dos seus capacetes. Ele sorriu, conservando a sua nobre cortesia, e me disse: “Professor, eu lamento, mas não temos senão os capacetes necessários para nosso uso, porque são de prata”.
Pelo que consta, todo o traje da Guarda Suíça fora desenhado pelo próprio Michelângelo, o que o tornava ainda mais valioso. À medida que o comandante ia falando, aumentava meu desejo de ter o capacete. Como argumento mais persuasivo, ele acrescentou: “O senhor pode bem compreender que são quase peças de museu, e não sairia a preço acessível para qualquer um. Além disso, se eu lhe vendesse, desfalcaria o uniforme de um dos meus soldados”.
O meu nobre interlocutor percebeu que a explicação não me convencia inteiramente, e então arrematou: “Caso o senhor deseje comprová-lo pessoalmente, seria um prazer levá-lo até a sala de armas e ali poderá cotejar o número de capacetes com o de soldados que servem o Sumo Pontífice”.
A proposta me pareceu interessante, pois se não me era possível adquirir um dos capacetes, ao menos os contemplaria todos juntos, de perto. Aquiesci com gentileza à oferta do comandante e descemos juntos à sala onde, numa prateleira, os capacetes se achavam enfileirados. Realmente, não sobrava nenhum…
Essa reminiscência vem a propósito para salientar a beleza e a importância da instituição da Guarda Suíça. Esta é, na verdade, um rico florão na ponta desse fabuloso cajado que é um Papa. Chamado a velar sobre as dependências do Vaticano, a preservar seus tesouros eclesiásticos, a manter a ordem e guiar as multidões de fiéis na Praça de São Pedro, sobretudo disposto a dar a vida em defesa do Pontífice, o guarda suíço está à altura — com seu belo uniforme e seu heroísmo militar — da dignidade do Vigário de Cristo e Pastor Supremo da Santa Igreja Católica.
(Extraído de conferências em 4/4/1990 e 2/2/1993)