Em algumas regiões da Itália, havia outrora grandes áreas pantanosas. Durante séculos, as suas exalações contaminaram o ar, intoxicando os pulmões e oprimindo o ânimo dos habitantes das vizinhanças. Viam-se homens de olhar triste, pálidos como cera, remando sobre as águas lamacentas; e se alguém lhes perguntava amavelmente “come state?”, em lugar do acostumado “si vive” (vai-se vivendo), ouvia como resposta: “si muore” (vai-se morrendo). Réplica semelhante pode saltar com frequência aos lábios de certos espíritos, desta vez não envenenados por gases, mas pela inconformidade com uma situação inevitável, ao menos, durante certos períodos da existência de todo ser humano. Que situação é essa?
Está nas regras da natureza despertar com ímpeto, desabrochar com vivacidade. Ora vemo-lo na força da primavera, ora na vitalidade da infância. Ao passear pelas montanhas, é com certa emoção que nos detemos diante do estrépito de algum riacho impetuoso, serpenteando entre os penhascos. Como é árdua a tarefa desse fio de água: não descansa, não se detém um só momento; vai cavando continuamente o seu leito! Abre caminho no solo, vence a terra lamacenta, quebra-se de encontro às rochas para, dentro em breve, retomar com mais força a sua corrida. As suas águas, no embate contra os obstáculos, purificam-se assumindo a limpidez do cristal.
Mas, à medida que atinge a planície, a sua descida vai-se tornando mais serena: já lhe é permitido caminhar devagar, acomodar-se ao próprio leito, onde escorrega como seda, onde já não tem muito a fazer. Ó que agradável é a estabilidade! Vira preguiçoso, anda cada vez mais lentamente e quando as águas se detêm, estanca nas concavidades da terra para, em pouco tempo, transformar-se num pântano lamacento, pasto dos vermes e das bactérias. Serão estas também as regras da natureza? Após o élan próprio ao despertar da vida, advém fatalmente a monotonia e a inércia? À atividade da primavera deve suceder compulsoriamente a imobilidade do inverno? Numa palavra, qual é o papel da rotina? Dr. Plinio no-lo apresentará no artigo deste mês intitulado Fidelidade em meio à rotina.
A atual noção de rotina, distorcida pelo ritmo vertiginoso de nossa época, apresenta-se como os metíficos pântanos de certas localidades da antiga Itália. E com certa razão, quando ao peso inalterável do dia-a-dia se junta a ociosidade, pois esta “é a mãe de todos os vícios” (Eclo 33-29): quem permanece sem fazer nada, aprende a fazer o mal.
Escritores latinos, embora vivessem numa sociedade mais orgânica e proporcionada ao homem, deixaram consignado este ditado: Assueta vilescunt, o que é habitual envilece, começa a perder o seu valor. De fato, tanto antigamente quanto hoje, a rotina se apresenta, mais cedo ou mais tarde, na vida de cada um. Poderá ela trazer-nos algum proveito?