viernes, noviembre 8, 2024

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Ornato e simplicidade

As igrejas do Brasil colonial eram bonitas, nobres e muito dignas. Manifestavam o contraste entre a intensa ornamentação e a simplicidade, causando aos olhos uma impressão agradável.

Juniorpetjua (CC 3.0)

A diferença entre York1 e Olinda é manifesta. É quase um pouco desconcertante! Mas a igreja de Olinda, construída no século XVII, tem isso de agradável: sente-se melhor a doçura e a suavidade do “à vontade” do matagal brasileiro. Ela emerge toda branquinha, muito aprazível, desta abundância de verde, que no fundo é provavelmente o mato. A localização, portanto, é muito bonita.

Não é fácil fazer um comentário sobre esta igreja, porque todos nós conhecemos uma porção de igrejas parecidas com ela. Nunca se copiam, são sempre diferentes, mas o mais possível iguais. O que comentar a este respeito?

Atmosfera de grandeza

Ela possui duas torres. No corpo central alguma coisa é vagamente à maneira de um triângulo, com três janelas. E, por assim dizer, em cada andar da torre uma janela também. A fachada muito cuidada, mas a parte lateral da igreja meio lambida e sem nenhum ornato por fora; em geral, as igrejas deste estilo são muito bonitas por dentro. Não tem mais nada para comentar, exceto isto: há uma certa cor local, um certo ambiente de brasilidade, sobre o qual chamo a atenção para dois pontos.

Assim são os grandes e os pequenos na Terra: completam-se aos pés de Deus. Como o mundo seria árido e sem graça se só existissem grandes! Como ele é vulgar quando só há pequenos!

Juniorpetjua (CC 3.0)
Juniorpetjua (CC 3.0)

Quando consideramos este edifício, temos a impressão de algo que, em comparação com a Catedral de York, é muito primitivo; e notamos que a igreja é bonitinha. Entretanto, fica por detrás uma atmosfera de grandeza que talvez não saibamos definir, e que julgo resultar da conjunção muito discreta de dois elementos: todo esse verde dessas árvores dá uma ideia da enorme fecundidade do solo, e de um país com uma natureza rica, generosa, dir-se-ia quase agressiva. A produção jorra de dentro do solo!

Percebe-se que ninguém trabalhou muito para que isso fosse assim… Qualquer grão que se joga na terra já disputa com outros o espaço vital, e lá vai germinando e crescendo, como uma promessa enorme de uma grandeza vindoura!

Por outro lado, vemos no fundo o mar imenso, de um colorido lindíssimo! Nesse ponto não percebo que esteja picotado por nenhuma ilha, por nenhum recife, por nada: é o mar, o mar, o mar! Duas grandezas juntas: vastidão e a ideia de grandeza.

O tempo pode adornar e proporcionar certa dignidade

A Igreja de Nossa Senhora das Neves, no convento de São Francisco, em Olinda, é a construção mais antiga dos franciscanos no Brasil.

Há algo de imponderável aqui, ao menos para meu gosto, e que dá muito sabor a isto. Se essas telhas fossem todas vermelhinhas e novinhas, isto não perderia algo? Observem que é uma telharia velha e manchada. O que tem isto que, se fosse novinho, perderia? Se esta torre tivesse sido recentemente caiada, mas de tal maneira que desse ilusão de uma torrezinha novazinha em folha, não perderia também? O que há de beleza em uma coisa, quando sobre ela passa o tempo, para que, em última análise, o tempo a adorne, até mesmo quando ela fique estragada?

Vejam, por exemplo, essas pedras da torre. Em alguns lugares tem-se impressão que o tempo manchou, as intempéries mancharam. Calores de arrebentar, chuvas violentas, frescor nunca, pedra trabalhada, corroída, torrada pelo sol, mas íntegra! Percebe-se que o tempo passou sobre ela e lhe deu uma doçura, uma dignidade, um ar assim pensativo do ancião ou da anciã que está na cadeira de balanço, pensando e dizendo: “Fugite irreparabile tempus! Como eu, quando era jovem, não gostava disso! Mas o tempo fugiu mesmo…” Tem sua poesia.

Juniorpetjua (CC 3.0)
Adam63 (CC 3.0)

prefeituradeolinda (CC 3.0)
Convento de São Francisco e Igreja Nossa Senhora das Neves – Olinda, Brasil

Como poesia tem, a meu ver, esse tufo de palmeira que está embaixo.

Orações, sacrifícios, tentações, vitórias

As palmeiras são muito bonitas e não impedem que se veja esta espécie de portal, de uma linha um pouco fantasiosa, mas elegante e bonito, que esta aí. Não se pode ter uma ideia inteira dele. Quanto à fachada do convento, pode-se dizer que qualquer casa de fazenda do interior tem exatamente isto. É uma residência de fazendeiro antigo, com janela de guilhotina: três janelas embaixo, três janelas em cima. Dir-se-ia uma caixa, na qual alguém recortou à tesoura as janelas, e está feito o plano da casa.

Alguém dirá: “Apreciação severa!”

Não. Ela é feita para que nós compreendamos o que é o sabor das antigas eras. Como nós sabemos que aqui não residiu uma família, mas há bastante tempo mora uma Ordem Religiosa — que durante muitos séculos foi uma Ordem recolhida, de pobreza, impregnada pela doçura do Poverello —, podemos imaginar a continuidade, a sucessão de frades que se revezavam ao longo das décadas nesse convento, sempre servindo, sempre rezando, sempre trabalhando, sempre afastados das coisas da Terra. E começa-se a pensar: “Através de cada uma dessas janelas, que mundo de orações, que mundo de sacrifícios…” Não nos iludamos: que mundo de tentações, que mundo de vitórias, que mundo de ação de graças, que provações, que doenças, que preocupações!

Aí está a expressão que se desprende desse edifício.

A palmeira aristocrática e as plantinhas completam-se

Consideremos a Igreja de Nossa Senhora dos Prazeres dos Montes Guararapes. O nome diz tudo! Nós não temos que acrescentar nada.

A fotografia situa num ângulo muito agradável e muito poético a igreja. Mas precisamos reconhecer que ela quase teve mais a preocupação de dar a moldura verde da igreja, do que a igreja propriamente dita. A moldura é muito agradável.

Eu nunca estive lá, mas tenho a impressão que embaixo deve haver um valo e um cursozinho de água qualquer ali. O elemento indispensável da paisagem brasileira, e sobretudo da paisagem nordestina, está presente: as palmeiras.

Josue121 (CC 3.0)

Tetraktyrs (CC 3.0)
Igreja Nossa Senhora dos Prazeres – Montes Guararapes, Recife, Brasil
Batalha de Guararapes – Museu de Belas Artes, Rio de Janeiro, Brasil

Chamo a atenção particularmente para aquela palmeira esguia, tendo no alto um mundo de folhas que o vento está sacudindo em todas as direções. Isso nos dá um pouquinho a ideia da hierarquia na criação botânica.

Há plantinhas mais comuns do que estas que se veem ali? Tenho a impressão de que, desde quando o mundo foi criado, há plantas destas. Como elas são vulgarezinhas, comunzinhas, apagadas em comparação com a palmeira aristocrática, esguia que ostenta as suas folhas como se fossem um brasão!

É inegável que, batidas pelo sol, consideradas no seu conjunto, estas plantinhas dão uma ideia de pujança, de fertilidade, de variedade, de grandeza, são indispensáveis para o panorama! Se imaginássemos que houvesse só palmeiras aqui, como o panorama seria nada! Se não houvesse palmeiras, mas só estas plantinhas, não havia panorama!

Assim são os grandes e os pequenos na Terra: completam-se aos pés de Deus. Como o mundo seria árido e sem graça se só existissem grandes! Como ele é vulgar quando só há pequenos! Pequenos e grandes conjugados dão a ordem que Deus quis.

Fato concreto é este: se alguém me sugerisse abater tudo isto, fazer um gramado lindo nas duas margens desse córrego, passar asfalto por debaixo do córrego para ficar bonito, eu diria: “Você não entendeu nada! Deixe assim, e acabou se!”

Lembrando as batalhas dos Guararapes

Em frente à Igreja de Nossa Senhora dos Guararapes vemos o clássico Cruzeiro. A igreja tem uma nota que não é de qualquer igreja do tempo colonial. Nessa época, as igrejas, com certa frequência, visam ao horizontal, não ao esguio, ao alto. Esta tem isto, que é para mim um grande mérito: ela visa ao esguio, ao alto!

Notem que ela é um pouco estreita em comparação com sua altura. As janelas dela também são de uma altura um pouco maior do que o comum, e um pouco desproporcionadas, mas no sentido louvável da palavra, em relação à altura de cada janela. E aquele ornato central, também todo ele se volta especialmente para o alto. Dir-se-ia que há uma sede do esguio, do ascético, do voltado para o Céu e para as realidades de além desta Terra, que aposta corrida com as duas palmeiras que se veem do outro lado, e que não conseguem ter a altura da igreja.

No chão, é preciso bem reconhecer que não existe apenas a mãe natureza, mas existe o “pai relaxamento”. É uma tristeza, mas é assim.

O todo esguio da igreja é mais propício a lembrar as batalhas dos Guararapes, a ascese, os heróis, a luta religiosa, etc., do que se fosse uma igreja atarracada e mais dada para as comodidades dos grandes domingos tranquilos.

Vejam que belo ladrilho reveste as torres! Ladrilho, uma arte dos portugueses – dos espanhóis também. Em Portugal especialmente atingiu uma beleza excepcional, e esses ladrilhos vinham de Portugal. Mas no Brasil também se começou a fazer ladrilhos, por vezes bem bonitos. Os jogos de cores desse ladrilho, sobretudo, me parecem muito agradáveis.

Juniorpetjua (CC 3.0)

Tetraktyrs (CC 3.0)
Igreja de São Pedro dos Clérigos Recife, Brasil

Observem o desenho. Parece uma coroa, e no alto tendo uma espécie de coroazinha. E coroando tudo isto, a Santa Cruz de Nosso Senhor Jesus Cristo.

Altaneira, ascética e com senhorio

Considerem também o arvoredo e a ideia de pujança da natureza que se tem aí. É o velho convento beneditino, muito simpático, respeitável, antigo da cidade de Olinda. Mas este é mais dado ao horizontal.

A Igreja São Pedro dos Clérigos, antiga catedral de Recife, levou o esguio até onde se podia levar. Agrada-me muito a arquitetura dela: é altaneira, ascética, tem senhorio…

A Igreja de São Cosme e Damião está precisando muito de uma renovação, pois se encontra muito mal tratada. Aqui o tempo fugiu muito irreparavelmente! Ela é venerável, mas para ser bela precisava de uns retoques!

Não há muito comentário a fazer sobre o interior da Igreja de São Pedro dos Clérigos. Vemos que o esguio e o esbelto ali se mantêm. Notem como a parte equivalente ao presbitério é profunda, alta e esguia. E toda a igreja é muito alta. Poder-se-ia dizer que tem três andares. O restante corresponde à configuração bonita, nobre, muito digna das igrejas antigas do Brasil.

Contraste entre o entalhado e o liso

Valdiney Pimenta (CC 3.0)
Tetraktyrs (CC 3.0)

Juniorpetjua (CC 3.0)
Igreja e Mosteiro de São Bento – Olinda, Brasil

Também conheço o Mosteiro de São Bento, em Olinda. Vemos aí o contraste que a arquitetura desse tempo às vezes explorava de modo muito feliz, entre o altar todo muito carregado e a simplicidade das paredes caiadas. Depois, estalas de novo muito carregadas. E esta justaposição do extremamente carregado e do extremamente simples causa para os olhos uma impressão agradável. Essa impressão é visada e atingida pelo artista que fez isto!

Está primorosamente conservada. Chão muito limpo, muito bem arranjado, e tudo muito bem adornado.

Chamo a atenção para a beleza dessas cômodas, com enormes gavetas de ambos os lados, para guardar paramentos, e que toma toda a parede. Provavelmente tomam as quatro paredes da sacristia. Quadros muito interessantes, encaixados na própria boiserie, e não só acima das cômodas, mas no teto, como é o estilo.

Vê-se um quadro no teto. Deve haver mais de um quadro, ao longo da imensa sala.

Uma mesa esguia, elegante se deixa ver ali, e um grande candelabro. Realmente uma bela peça.

Um púlpito. Os púlpitos naquele tempo ficavam bem altos e muito mais para o centro da igreja. Porque, como não havia esses aparelhos de som, o pregador tinha que ficar o mais alto possível para a sua voz alcançar de modo cômodo, ou relativamente cômodo, todo o edifício sagrado. Mas o púlpito alto dava outra majestade ao pregador, que ficava pairando nas nuvens, por assim dizer, para pregar o seu sermão.

O púlpito é todo muito trabalhado, revestido de ouro e com uma parede por detrás, caiada e extremamente lisa. Podemos sentir aqui melhor, talvez, o agrado do contraste entre esses dois elementos: o entalhado e o liso.

(Extraído de conferência de 22/5/1985)

1) Referência aos comentários à Catedral de York. Ver Revista Dr. Plinio n. 161, p. 32-35.

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