jueves, noviembre 21, 2024

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A Contra-Revolução tendencial

“Revolução e Contra-Revolução” foi um dos temas centrais das explicitações de Dr. Plinio ao longo de sua vida. Por isso, entre suas conferências encontram-se, com frequência, aprofundamentos à sua obra-mestra. Com o presente artigo, damos início a uma série destas explicitações.

Quando se analisa os mil artifícios empregados pela Revolução no campo das tendências para penetrar na mente do homem — de certo modo sem que este o perceba —, tem-se a impressão de que ela é quase irresistível.

As pessoas que conhecem esses métodos têm tantos modos de agir e de influenciar, que quase não se compreende como um povo entregue às cogitações quotidianas, às preocupações comuns, pode se dar conta de que está sendo objeto de um tratamento revolucionário.

Até uma combinação de cores pode ser de acordo com a Revolução

Suponhamos uma dona de casa que deseja adquirir uma sacola onde possa colocar os objetos comprados por ela numa feira.

Ela compra a cesta mais resistente e durável, que lhe parece mais fácil de carregar, mas quase não presta atenção porque aquele objeto não tem uma intenção ornamental especial. Porém, não se dá conta de que a combinação das cores daquela cesta é revolucionária e que ela, portanto, indo e voltando para o mercado ou para a feira, está levando e trazendo Revolução.

Mais ainda, se ela, em sua casa, pendura aquela sacola num lugar qualquer da copa ou da cozinha, aquela combinação de cores pode estar influenciando tendencialmente, de um modo revolucionário, toda a sua família.

Que defesa pode ter uma pobre dona de casa contra uma coisa dessas?

Tem-se a impressão de que a Revolução tendencial não pode ser evitada pelo homem; é uma arma irresistível. E se tem a ilusão de que o mesmo acontece com a Contra-Revolução tendencial. Quer dizer, se uma pessoa normalmente leva uma cesta com bonita combinação de cores, e depois a prende numa parede de sua casa, está fazendo Contra-Revolução.

Não é simplesmente uma cesta, mas são mil coisas: o cabo da escova de dente, a forma do sapato, tudo está fazendo Revolução a toda hora e, de vez em quando, Contra-Revolução. Quem pode resistir a isso?

Mentalidades revolucionárias e contra-revolucionárias

Então, devemos analisar como deve ser o homem para não se tornar um joguete da Revolução e nem sequer da Contra-Revolução. Ele fica um verdadeiro contra-revolucionário pela Fé, pelo exercício de suas faculdades intelectivas e de sua vontade. O resto ajuda, condiciona, tem sua importância, mas não pode ser decisivo. Como a matéria é muito complexa, muitas vezes não se fala desse ponto fundamental, que não podemos perder de vista.

O autêntico contra-revolucionário, quando percebe que uma coisa é revolucionária, a recusa; quando nota que algo é contra-revolucionário, aceita-o.

Ele vê, julga, quer ou não quer. Aqui está a parte nobre da operação da alma humana. Para isso, como deve ser a sua mentalidade?

Depois da impressão, é necessária a reflexão

Dou-lhes um exemplo tirado de uma leitura que fiz.

Caiu-me nas mãos uma frase lindíssima de Santo Agostinho, extraída do livro “A divindade da Igreja Católica”, de Monsenhor Miguel Martins1.

Eis a frase de Santo Agostinho:

“Deus é infinitamente poderoso, mas não nos pode dar mais; é infinitamente sábio, mas não sabe nos dar mais; é infinitamente rico, mas nada mais tem para nos dar; porque na sagrada comunhão Ele se tem dado todo a nós.”

Há nesse texto aquele voo de Santo Agostinho, que é só dele. Tem-se a impressão de que é uma ave levantando voo e indo direto para alturas inexcogitáveis!

Mas é um voo do espírito, em comparação do qual o do avião não é nada.

A ideia dele é a seguinte:

Deus, infinitamente poderoso, pode nos dar algo mais do que a Sagrada Eucaristia? É Jesus Cristo realmente presente em Corpo, Sangue, Alma e Divindade! Dando-Se a Si próprio, não tem mais o que dar.

Então, quando, pela graça obtida através de Nossa Senhora, formos comungar, devemos tomar em consideração a beleza desse pensamento: vamos receber um dom tal que o próprio Deus não poderia dar outro melhor.

Ele é infinitamente sábio, mas não sabe nos dar mais!

Imaginemos a sabedoria de Deus criando o Céu e a Terra e todos os outros seres. Pois bem, Ele não sabe dar mais do que a Eucaristia!

É infinitamente rico, mas não tem nada mais valioso para nos dar, porque na Sagrada Comunhão Ele se tem dado todo a nós!

Tudo isso causa uma primeira impressão que vem acompanhada de uma graça.

Mas é bom que se faça depois uma reflexão. O que está sendo dito é um pensamento profundamente sério, o qual deve ser guardado na alma.

G. Kralj

Esta operação que se faz a respeito desse pensamento — não é indispensável fazer isso com cada pensamento que se tem — é perfeita, quando a pessoa se impressiona, se convence e ama tanto aquilo que ouviu ou leu, que nunca mais deixa de ter isso em conta quando vai comungar. Sua memória conserva aquilo para a vida inteira.

Quando me leram essa frase pela primeira vez, tive alegria. Agora, ao relembrá-la diante dos que estão neste auditório, minha alegria se renovou, ao ver a primeira alegria dos presentes diante desse pensamento. E foi uma alegria intensa, altissonante, que levanta voo!

Choque das mentalidades

Hoje é sexta-feira e muitas pessoas estão se preparando para toda espécie de diversões, enquanto que nesse auditório muitos jovens bradam de alegria, portanto de felicidade de alma, porque ouvem um pensamento desse gênero.

Imaginemos um indivíduo que pretenda ir amanhã cedo para Guarujá e colocou sobre seu automóvel uma lancha, com comida e outras coisas para o passeio. O carro já está voltado para a rua, a fim de apressar a saída.

Digamos que ele passe nesse momento aqui em frente e, ouvindo as exclamações, pergunte a alguém:

— Por que razão esta alegria?

E esse alguém lê para ele o texto de Santo Agostinho.

O indivíduo pensa: “Como eles se entusiasmam com esse pensamento que eu não estou entendendo bem? Tenho aqui essa lancha e vou amanhã para Guarujá, isso que é uma coisa gostosa. Eles vão ter um dia de oração, de trabalho, de reunião… Coitados! E essa reunião que estão tendo agora irá até a uma hora da manhã!”

S. Hollmann
Santo Agostinho.

Esse homem poderia dizer: “Ou estou completamente errado ou errados estão eles, porque não me alegro com isso. Noto que eles passam diante da minha lancha e nem param para olhar! Nem sabem qual é sua marca, que está escrita do lado de fora numa plaquinha! Eles saem conversando entre si a respeito de coisas de Religião, de Sociologia, de História.

“Alguns estão falando de Maria Antonieta. Penso que é uma moça que eles conhecem, mas não! Trata-se daquela rainha da França, que teve a cabeça cortada pelos revolucionários! Realmente não entendo.”

Julgo que com esse exemplo torno claro o contraste e o choque de mentalidades.

O feitio do homem se molda conforme sua meta

Esse homem tem a alma voltada para uma determinada meta e nós, pelo favor e pelas preces de Nossa Senhora, estamos orientados para outra meta. E conforme a meta se forma o feitio da pessoa. Em função disso — talvez meus ouvintes tenham pensado que eu perdi o rumo, e não esteja mais tratando da Revolução e da Contra-Revolução — vem a questão da resistência do homem à ação tendencial revolucionária ou contra-revolucionária.

Há dois tipos de homem. Um deles é este sobre o qual falei — tipo que já era corrente nos longínquos tempos da minha infância. O modo de viver os fins de semana mudou muito, mas a mentalidade era a mesma.

Naquela época, o fim de semana era só o domingo. A vida em São Paulo era muito menos tensa, não sendo preciso descansar sábado e domingo. O cansaço acumulado durante a semana era muito menor.

A Sãopaulinho de outrora era ao mesmo tempo muito mais aristocrática e sossegada do que esta São Paulo industrial que vemos febricitar e transudar poluição em todos os lugares.

Já na Sãopaulinho a meta normal do homem era o prazer

Já naquele tempo, a meta normal do homem era o prazer. Ele seria inteiramente feliz se tivesse prazeres contínuos e na proporção de seus desejos.

Há pessoas que gostam de grandes prazeres. Outras, de mentalidades ora mais apoucadas, ora mais finas, se contentam com prazerezinhos e apreciam sorver a vida com colherinhas de chá e não com enormes goles. Há, portanto, diferentes modos de viver em busca do prazer.

Tinham muito pálida e remotamente a ideia de que o domingo é o dia do Senhor. Iam à Missa porque é uma exigência de Deus, e não havia como evitar. A mentalidade era essa.

Trabalhavam nos dias de semana para ter os recursos a fim de gozar a vida no domingo. Mais ainda, procuravam levar durante a própria semana a vida mais gostosa possível.

O que era a vida gostosa?

Antes de tudo consistia em não ter preocupações nem aborrecimentos.

Em segundo lugar, fazer o que quer: ir a Guarujá, à fazenda, ao Rio de Janeiro, ficar dormindo até meio-dia, levantar-se às cinco horas da manhã para escalar o Jaraguá2, etc. Em suma, fazer o que é gostoso é a lei.

E as coisas gostosas eram aquelas que direta e imediatamente dão gosto ao corpo. Para os espíritos um pouco mais elevados — não numerosos — o gosto do corpo se conjugava com certo prazer da alma. Então, alguns gostavam de música — mas que músicas! —, outros, de uma exposição artística, porque dão certo prazer de alma através dos sentidos. Quem se metia nessa vida, cujo diapasão é o gostoso, evidentemente não tinha alma para apreciar pensamentos elevados, como esse de Santo Agostinho; era cego, surdo e mudo para coisas dessa natureza.

Arquivo revista
Dr. Plinio na década de 30.

Os temas das conversas indicavam o feitio de espírito

No meu tempo de moço — hoje não deve ser muito diferente, mas talvez muito pior — certos tipos de conversa indicavam superlativamente este feitio de espírito. Por exemplo, contar de modo exagerado e com fanfarronada as coisas que fez no domingo anterior: tomou uma lancha e quase houve um acidente, mas o indivíduo conseguiu evitá-lo de tal maneira; foi um herói. E narra o caso até o último pormenor, ou seja, até a última mentira que ele encontrou para chamar a atenção.

Enquanto isso, um outro pensava: “Deixa este acabar de falar, para eu contar meu grande feito.” E se não tinha nada para jactanciar-se, ficava com vontade de mudar de assunto.

Outro tema muito querido era as viagens de automóvel — as estradas de rodagem naquele tempo eram relativamente novas. As surpresas que houve em certo lugar; o freio que quase falhou; o indivíduo teve que ir a pé para comprar uma peça, mas foi muito feliz porque no caminho encontrou um conhecido que o levou de automóvel e o trouxe, e ainda lhe agradeceu, porque lhe disse que conversava muito bem. O que equivale a dizer: “Vocês não sabem apreciar a minha conversa, mas sou um colosso; saibam me apreciar melhor.”

De vez em quando, conversas a respeito de negócios ou política.

Voo da alma às coisas elevadas

Em consequência, essas almas não tinham nenhuma capacidade de entender e amar os pensamentos elevados.

Uma pessoa, ouvindo a leitura desse texto de Santo Agostinho, se entusiasma quando está voltada para outra ordem de valores. Ela compreende que as coisas materiais podem ser aprazíveis e devem, em certas circunstâncias, ornar ou tornar deleitável a vida do homem. Mas o principal não é o corpo; há uma forma de deleite, uma beleza, uma santidade, uma verdade nas coisas, que, quando a alma percebe, ela se rejubila, sobretudo quando são bem expressas. A alma, então, voa em direção a coisas mais elevadas.

Para se ter ideia completa do que é um deleite desses, deve-se ler, nas “Confissões” de Santo Agostinho, a conversa dele com Santa Mônica, no porto de Óstia. Sua mãe havia rezado por ele durante muitos anos e, afinal, Santo Agostinho se convertera. Ia para Cartago, cidade então florescente do Norte da África, e estavam no porto de Óstia. Enquanto esperavam o navio, conversavam sobre o Céu junto à janela de uma hospedaria — colóquio de um santo com uma santa — e tiveram uma espécie de êxtase. Santo Agostinho conta essa conversa de um modo incomparável.

Santa Mônica disse-lhe:

— Meu filho, já obtive a tua conversão para que sigas no caminho da Fé. Teu pai morreu, e eu não tenho mais deveres nesta Terra; desejo apenas o Céu.

Vê-se que, apesar de querer muito bem a Santa Mônica, ele não fez insistência para ela continuar na Terra. Santo Agostinho poderia dizer-lhe: “Mamãe, não pense nisso, a senhora ainda está moça e tem muita saúde…” Ou então: “Ser-me-ia muito duro resignar-me a viver sem a senhora; procure ficar na Terra.”

Mas não o fez porque entendera haver chegado o momento dela, e que as coisas devem se realizar nas horas de Deus e não dos homens. Daí a poucos dias, ela adoeceu e morreu, tendo sido sepultada na própria cidade de Óstia.

Ele conta tudo isso de modo muito bonito e percebe-se o equilíbrio da alma católica. Narra seu próprio pranto e que levou seu corpo ao cemitério. E voltou tão triste que, para se consolar, tomou um banho! E com uma bondade de um coração episcopal, escreve ele: “Aconselho a todos que tiverem uma provação muito grande, que tomem um banho, porque ajuda a suportá-la.”

Não é, portanto, uma alma estranha às realidades da Terra, que desdenha ou ignora qualquer forma de apoio ou de conforto para o irmão corpo. Mas depois voa muito acima disso.

Continua no próximo número…

(Extraído de conferência de 9/11/1984)

1) São Paulo: Editora da Escola Profissional Liceu Coração de Jesus, 1917.

2) Jaraguá: pico situado nas cercanias de São Paulo.

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