Dona Lucilia com cerca de 50 anos.

Com voz aveludada e discreta, Dona Lucilia sabia prevenir seu filho a respeito de coisas que, embora aparentassem ser sem importância, no fundo mereciam uma atenção especial.

Mamãe media bem o valor de cada previsão que faria. Ela falava com muita doçura, mas ao mesmo tempo com muita autoridade, sabendo possuir o direito de prever as coisas para o filho. Como eram estas previsões?

Comunicando suas previsões…

Naturalmente, elas se davam nas ocasiões mais diversas, estando ela em algum local de casa, em pé, sentada, e ao sabor de circunstâncias imprevistas. Mas em geral ela se punha em algum sofá, alguma cadeira ou poltrona, onde pudesse estar sentada com toda a tranquilidade, de maneira que o corpo não prejudicasse a atenção dada por ela ao que estava dizendo.

Dona Lucilia tomava uma atitude de especial afeto para com a pessoa a quem ia beneficiar com o presente de uma previsão, e começava a dizer: “Meu filho…” em tom mais baixo e depois ia subindo até chegar à previsão: “Sua mãe notou tal coisa, e daí deduz que há para ­você — ou para as Congregações Marianas, ou para a Causa católica — um perigo, um equívoco qualquer que pode fazer com que você se deixe enganar. Portanto, eu vou dizer-lhe: Tal coisa é assim e não de outro jeito, ­como ­você parece pensar. Preste atenção nisso.”

Quando eu era mais moço e a previsão dela contrariava algum gosto meu, não me zangava propriamente com ela, porque eu a queria tão bem que não era capaz de me zangar com ela. Mas eu ficava surpreso, desagradado e oferecia objeções:

— Mas mãezinha, a senhora não vê que tal coisa é assim e não concorda com o que a senhora está prevendo?

Ela dizia com muita bondade e doçura:

— Filhão, olha lá, hein! Isso você acha assim porque não viu tais outras coisas.

Se eu insistia, ela acrescentava:

— Bem, eu já lhe disse tudo que podia para convencê-lo; não o convenci, vamos ver o que vai acontecer. Mas se suceder alguma coisa, não afirme: “Mamãe não me preveniu; diga que você foi recalcitrante e não quis ouvir a opinião de sua mãe.”

Dona Lucilia media bem o valor de cada previsão que faria. Ela falava com muita doçura, mas ao mesmo tempo com muita autoridade, sabendo possuir o direito de prever as coisas para o filho.

Dona Lucilia em Paris, em 1912.

O passar dos tempos dava razão às previsões de Dona Lucilia

Embora não estivéssemos de acordo, eu saía com a alma cheia e ficava prestando atenção nos acontecimentos, para verificar se se realizava o que ela havia predito, ou não.

Em geral, levava um pouquinho de tempo para se cumprir, porque é próprio da previsão anunciar as coisas muito antes de acontecerem; essa é a previsão de categoria. Então ela previa com muita antecedência, mas acabava acontecendo.

Dona Lucilia não tinha a atitude que muitos previsores possuem: “Você está vendo, hein! Na próxima vez preste mais atenção no que eu disse, porque você deve ver que não erro, mas é você que erra; portanto, saiba torcer o pescoço de suas próprias ideias e aceitar as minhas.” É uma coisa que ela não diria.

Quando muito, ela apenas falava de passagem: “É! Acabou acontecendo que fulano deu um passo em falso.” Mas ela não dizia que o indivíduo fez a coisa que ela tinha previsto. Depois ela mudava de assunto com a maior suavidade e delicadeza possíveis. Assim eram as previsões que mamãe fazia.

A propósito de um recorte de jornal, Dona Lucilia faz importante previsão

De um modo geral, ela estava com a razão. Foi o que aconteceu quando eu era deputado e passava boa parte do tempo no Rio. Certo dia, recebi dela uma carta que, embora não a tenha guardado, conservo visualmente na memória. A missiva trazia num canto, preso por um alfinete, com muito esmero, muito gosto, um pedacinho de papel contendo uma notícia do jornal “O Estado de São Paulo”. Não sei por que ela não o anexou com um clipe. Pois, em geral, para prender papéis etc. se usa clipe, e ela os utilizava. Mas nessa carta, talvez porque não tivesse um clipe à mão, ela pôs um alfinete. E me causou uma minúscula surpresa por que ela fez isso.

Quando eu era mais moço e a previsão dela contrariava algum gosto meu, não me zangava propriamente com ela, mas eu ficava surpreso, desagradado e oferecia objeções.

Dr. Plinio quando jovem congregado mariano.

Nessa missiva Dona Lucilia tratava de vários assuntos e, em certo trecho, ela escreveu: “Agora, sua mãe vai passar a outro ponto. Leia a notícia acima, relativa ao professor francês Fulano de tal…”

A notícia do “Estado” dizia que esse professor da Sorbonne viera ao Brasil para lançar um movimento de jovens, tendo em vista difundir uma versão mais arejada e moderna da Doutrina Católica.

Então, mamãe escrevia:

“Que coisa esquisita, doutrinas arejadas na Igreja Católica, como se a Igreja fosse uma instituição mofada e à qual faltasse ar. Abra os olhos, meu filho, porque aí tem algo para destruir a você e ao movimento das Congregações Marianas! Veja como você se defende!”

Escrevi uma carta a mamãe, dizendo que eu tinha estado com esse homem, o qual veio com um jovem do Rio de Janeiro, aliás, bem educado, fino e sabendo bem manejar as coisas; eu não conhecia esse jovem e depois disso nunca mais o vi, nem ouvi falar dele. Ambos procuraram conversar comigo e espalhar umas ideias dessas, mas lhes dei o contra, também com muito jeito, muito educadamente.

E tinha ficado mais ou menos no ar que o jovem iria jantar comigo, e teríamos uma conversa só os dois. Na hora de eles saírem, o rapaz não me convidou para o jantar, e as nossas relações pararam aí.

Era uma previsão de Dona Lucilia…

(Extraído de conferência de 16/4/1994)