Dr. Plinio na década de 1920. Ao fundo, hall do Teatro Municipal de São Paulo

Desde os albores de sua juventude, Dr. Plinio renunciou às tentações de mundanismo e imoralidade, optando pela pobreza e isolamento a fim de se manter fiel à Doutrina Católica.

Na minha juventude, no ambiente frequentado por mim, as coisas passavam-se da seguinte maneira:

Dois caminhos a seguir: o da renúncia ou o da devassidão

Um rapaz, quando completava 15 anos, passava a usar calças compridas. Até essa idade, mais ou menos, vestia calças curtas. A partir de então, o pai dava-lhe a chave da casa, símbolo de que, dali por diante, o jovem poderia entrar em casa a qualquer hora, pois a família não controlava mais seus horários.

A mesada aumentava, o rapaz começava a frequentar festas na sociedade, bailes, e eram dois mundos que se abriam para ele. Naquele tempo, mundos muito separados: o da vida social em família e o mundo da devassidão.

O mundo da vida social em família era brilhante, tinha uma elegância, uma distinção, uma gala que hoje se perderam completamente.

Não posso me esquecer da primeira vez que fui ao Teatro Municipal: eu, como os outros moços, de smoking, todos os homens de casaca, as senhoras usando vestidos de gala, com joias, diademas na cabeça, etc.

Tratava-se, naquela ocasião, da representação de uma ópera de Verdi, La traviatta — aliás, de um enredo moralmente reprovável.

Lembro-me de que, a certa altura da representação, a atriz italiana que fazia o papel da personagem principal começava a agonizar, acometida de tuberculose. Então, ela cantava de maneira a fingir a falta de ar.

Ora, há em mim um reflexo nervoso pelo qual, quando vejo uma pessoa com falta de ar, sinto também asfixia.

E a traviatta começou a “ach! ach! ach!”. Tive que sair para o hall do teatro para respirar um pouco, e esperar a mulher morrer para entrar novamente na sala. De fato, eu não aguentava aquela lenga-lenga…

Contudo, lembro-me do esplendor daquilo e de uma espécie de fascínio que causava, por ser uma sociedade muito hierarquizada e, sobretudo, porque os rapazes de boa família e com algum dinheiro viam abertas diante de si as portas para as maiores culminâncias.

A tentação era: Que carreira não farei, que possibilidades não haverá diante de mim, desde que eu seja bem visto por esta gente?! Era o mundanismo que se insinuava, com seu espírito do mundo, tão diferente do espírito católico.

Arquivo Revista

A outra tentação era a da imoralidade. No meu caso concreto, graças a Deus, não se tratava da tentação contra a castidade. Embora seja uma inclinação permanente no homem, eu já a tinha vencido nos seus primeiros aspectos. Contudo, era a tentação do seguinte: um rapaz que não frequentasse lugares ruins, no meu tempo de jovem todo o mundo da mesma sociedade saberia, e ele ficava completamente ridicularizado.

De maneira que precisava escolher entre ficar totalmente ridicularizado, debochado, posto de lado pelos outros como um pária — e por isso também não podendo fazer carreira naquele mundo brilhante das sociedades e das famílias — ou cair na devassidão, ser bem visto e, depois, glorificar-se naquele mundo brilhante.

Minha dor era a de ter que fazer esta renúncia, a qual me pesou enormemente: renunciar aos meus círculos sociais. Tratava-se da renúncia de toda possibilidade de futuro, de carreira, condenando-me a não ser ninguém na vida.

Fidelidade, graças a Nossa Senhora

Eu me lembro de que, numa residência frequentada por mim, o dono da casa, conversando comigo e sabendo que minha família era abastada, mas que meu pai tivera insucesso num negócio comercial, me perguntou:

— Plinio, o que você vai fazer?

Respondi:

— Advogar. Vou me formar em advocacia.

Ele me disse:

É pena… Você é um rapaz inteligente e daria um ótimo advogado. Entretanto, se há uma coisa que você não vai conseguir exercer é a advocacia.

Eu retruquei:

— Mas com que direito você afirma uma coisa dessas?!

Então ele explicou-se:

— Com a honestidade que você tem, não conseguirá que nenhum escritório de advocacia o receba, e nenhum cliente quererá ser defendido com essa honestidade própria de um católico intransigente como você. Você vai ter um escritório de advocacia às moscas e, por causa disso, será obrigado a fazer um concurso para ser juiz numa cidadezinha do interior. Na melhor das hipóteses, quando ficar velho, você vai ser juiz de Direito na capital.

Guilherme Gaensly (CC3.0)
Teatro Municipal de São Paulo

Pensei: “Ele tem razão. Agora escolha: o desprezo, o isolamento, a pobreza, ou a perdição de sua própria alma…”

Esta foi a luta que eu tive de travar. Nossa Senhora me ajudou e optei pela pobreza, pelo isolamento, pela fidelidade. Não fui um juiz no interior, mas estive várias vezes ameaçado de tornar-me um professor público no interior, por não ter com que me manter, e nem à minha mãe.

Nossa Senhora continuou a me ajudar. Tive um escritório de advocacia movimentado, muito honesto e com os principais clientes eclesiásticos de São Paulo. Fiz o dinheiro suficiente para viver. Em certo momento, fui perdendo os clientes eclesiásticos e tive que fechar o escritório.

Quando encerrei o escritório, fui fazer as minhas contas. Eu possuía o necessário para viver sem o escritório. Então, continuei a dedicar-me à Causa Católica.

Não sou o tal juiz da cidadezinha do interior, nem o professorzinho, tão completamente desconhecido como vaticinava aquele homem. Porém, tinha aceitado de o ser, se fosse esta a vontade de Nossa Senhora.

(Extraído de conferência de 6/4/1972)