Gustavo K.
Cavalier d’Arpino - Santa Clara no Cerco da Cidade de Assis - São Petersburgo Rússia

Na situação atual, tão sombria, em que as forças do mal se agrupam e se preparam para desferir contra a Igreja de Deus o golpe que elas pretendem seja decisivo, é oportuno que lembremos certos princípios da doutrina moral católica que dizem respeito à virtude da humildade e ao vício da covardia.

De fato, a situação presente exige dos católicos uma atitude pugnaz, um espírito de luta, uma iniciativa pronta e uma coragem inflexível para, não só aparar os golpes do exército das trevas, mas desfechar uma ofensiva sem tréguas que o prostre vencido por terra.

Mas, objetar-se-á, isto não é contra a virtude da humildade? A humildade, que é o fundamento de todas virtudes cristãs, não exigirá de nós um pacifismo à outrance, uma perfeita impassibilidade em face dos ataques do inimigo, uma entrega de todos os pontos, antes mesmo do início do combate? Não deveremos inclinar, doce e meigamente, a cabeça para o lado, e com um sorriso beato esperar as bofetadas? Ora, tal comportamento nada teria a ver com a humildade autêntica, e não passaria de estupidez e covardia. Infelizmente há católicos que pensam assim, mas esse modo de pensar é uma deturpação do verdadeiro espírito da Igreja.

Toda a conduta da Igreja e dos Santos dá desmentido dessa passividade falsamente virtuosa, desde os Papas conclamando oficialmente as Cruzadas, até São Vicente de Paulo armando, à custa de seus penitentes, uma esquadra para bombardear os turcos da Argélia. Lamentavelmente, tais episódios viris são omitidos nas hagiografias correntes, que nos apresentam os Santos como verdadeiros potes de melado. Mas isto, repetimo-lo, é uma deturpação.

Lembremo-nos da solene advertência de Jesus Cristo a seus Apóstolos e, através deles, a todos os fiéis: “Não penseis que vim trazer paz à Terra; não vim trazer a paz, mas a espada” (Mt 10, 34). É verdade que Ele também disse: “Se alguém te ferir na face direita, apresenta-lhe também a esquerda” (cf. Lc 6, 29). Mas Jesus Cristo, esbofeteado pelo servo do Pontífice, não lhe apresenta a outra face. As palavras de Jesus encerram, pois, um ensinamento de paciência e de perdão, mas não devem ser tomadas ao pé da letra, embora alguns Santos o tenham feito por humildade.

Para bem estabelecer o sentido da humildade em face da covardia e da coragem, recorramos ao Doutor Universal, ao ínclito São Tomás de Aquino. Então aprenderemos que todas as virtudes são conexas e harmônicas entre si, não podendo existir umas sem as outras.

Segundo São Tomás, a virtude que completa a humildade é a magnanimidade. No homem existem qualidades que são um dom de Deus e defeitos que provêm da fraqueza da natureza. Quando, pois, o homem magnânimo se crê digno de grandes coisas, é pela consideração dos dons que recebeu de Deus. A magnanimidade faz com que ele tenda aos atos mais perfeitos da virtude. O mesmo se diga do uso dos outros dons, como a ciência e a fortuna. A humildade, porém, faz com que o homem se tenha em pouca conta, por causa da consideração dos próprios defeitos. Da mesma forma, a magnanimidade faz desprezar os outros na medida em que não correspondem e menosprezam os dons divinos, mas a humildade leva a honrar os outros e estimar os superiores, porque faz ver neles algo dos dons de Deus. Por onde a magnanimidade e a humildade não são contrárias, embora pareçam tender para coisas opostas1. Portanto, sem a magnanimidade, a humildade passa a ser pusilanimidade e até mesmo covardia, já que a magnanimidade pertence à virtude cardeal da Fortaleza, que se exerce principalmente nos períodos de guerra2.

Por fim, recordemos o que diz São Tomás, citando São João Crisóstomo, ao tratar da vingança3: É louvável sofrer com paciência as injúrias que nos fazem, mas é sumamente ímpio perdoar as injúrias feitas a Deus.4

1) Cf. II-II, q. 129, a. 3, ad. 4.

2) Cf. II-II, q. 133, a. 2.

3) Cf. II-II, q. 108, a. 1 ad. 2.

4) Cf. O Legionário n. 753, 12/1/1947.