jueves, noviembre 21, 2024

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Um holocausto que comprou a realização das promessas!

Lendo a autobiografia de Santa Teresinha do Menino Jesus, pareceu-me que seria muito mais útil para a Causa Católica se eu me oferecesse como vítima expiatória, a exemplo dela. Oferecer um sacrifício imediato que, enquanto tal, fosse de utilidade também imediata para a Igreja, e por efeito do qual, em poucos anos, a Contra-Revolução estaria senhora do terreno. Eu jazeria no Cemitério da Consolação1, quiçá inteiramente ignorado pelas gerações seguintes, mas sobre a minha sepultura teria brotado a árvore grandiosa do Reino de Maria e da Civilização Cristã.

Nessa perspectiva, eu me punha a questão de se isso não valeria mais do que todo o esforço que estava fazendo. Não seria melhor eu silenciar completamente as vozes interiores que me falavam de grandes lutas por Deus, por Nossa Senhora, pela Igreja, não dar atenção a elas, oferecer-me e caminhar para morte?

Pareceu-me que, estando em dúvida entre os dois caminhos, deveria preferir o mais desagradável. Ora, eu admirava profundamente a via de Santa Teresinha, mas tinha horror de segui-la. Todo o meu feitio se opunha a isso, sobretudo porque implicava na renúncia às vozes interiores nas quais eu encontrava o meu gáudio, meu amparo, minha consolação. Bastava me colocar na perspectiva da vítima expiatória, que tudo secava. Eu pensava: “Está bem, você deve trilhar o caminho de Santa Teresinha. Se tiver coragem, ofereça-se como vítima expiatória e vamos ver no que dá.”

De outro lado, o apelo das vozes interiores se fazia ainda mais premente, atraente e acariciante. Donde concluí: “Pois é isso mesmo que eu não escolho. Quero o caminho pior, mais triste, mais horroroso, porém mais fecundo. Eu prefiro este.”

Resolvi então entrar por uma via, ensinada por Santa Teresinha, de nunca pedir e nunca negar nada a Deus nosso Senhor, aceitar tudo o que acontecesse sem fazer sequer o pedido divino: “Pai, se for possível, afaste-se de Mim este cálice…” (Mt 26, 39). Não teria “se for possível”, o cálice não se afastaria; eu o beberia até o fim, logo que ele se apresentasse, e consumaria o meu sacrifício.

Divulgação
Corpo de Santa Teresinha do Menino Jesus, recém-falecida, exposto no Carmelo de Lisieux. À direita, estampa de Mater Boni Consilii, recebida por Dr. Plinio como presente

Arquivo Revista

Essa resolução me produzia um efeito tão prodigiosamente antinatural que era um verdadeiro tormento. Entretanto, cessei de pedir a Nosso Senhor e a Nossa Senhora qualquer coisa para mim, a não ser a santidade.

Em certa ocasião, eu estava na Igreja de Santa Cecília e o coro paroquial entoou um cântico em latim que, em determinado momento, continha esta frase: “Sanctifica nos in veritate”. Sem entender bem o latim, eu pensei: “É esse o meu único pedido! Que Nossa Senhora me santifique de verdade! Que eu fique um santo no sentido próprio da palavra. O resto não me incomoda.”

Algum tempo depois, fui a uma exposição de obras católicas e encontrei O Livro da Confiança. Qual não foi a minha surpresa ao me deparar com as palavras iniciais2 e descobrir nelas uma espécie de justificação teórica a uma via que, embora não fosse contrária à de Santa Teresinha, sob certo ângulo lhe era simetricamente oposta.

Mantive minha posição de não pedir nem recusar nada, mas surgiu no horizonte uma luz que me levava a esperar que algum dia Nossa Senhora me faria adotar outro caminho.

E, assim, andei por vales e montes até o momento em que sofri a crise de diabetes, com sério perigo de morte. Eu estava pronto para morrer quando houve a graça de Genazzano3, a qual como que me dizia: “Siga as vozes interiores!” Essa graça infundiu em mim a confiança de que Nossa Senhora maternalmente me levaria a cumprir minha missão.

Sempre tive como meta aquilo que a minha vocação indicava, ou seja, a plena realização das promessas que Nossa Senhora tornou conhecidas em Fátima: o castigo restaurador e o Reino de Maria.

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Contudo, o fato de eu esperar esses acontecimentos com desejos veementíssimos não evitava o seguinte: Deus continua Senhor de todas as coisas, e pode ser que Ele queira submeter-me à prova de passar a vida inteira à espera de algo que eu não veja se realizar.

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Como a minha alma se portaria diante dessa decepção? Porque morrer sem ver realizada a grande esperança da vida constitui evidentemente uma decepção. Não haveria nisso um desmentido à fé?

Arquivo Revista
Da esquerda para a direita: a 15 de outubro de 1988, em Saint-Laurent-sur-Sèvre, França, Dr. Plinio oscula uma imagem esculpida por São Luís Maria Grignion de Montfort; em 13 de maio de 1973, durante a cerimônia de consagração de sua Obra a Nossa Senhora; recebendo o Sacramento da Unção dos Enfermos, em 2 de setembro de 1995

Com efeito, por diversas disposições interiores inteiramente razoáveis, que produziam em minha alma efeitos dos mais animadores e convenientes à santificação, eu esperava a vinda dos acontecimentos preditos em Fátima. De maneira que tudo quanto me levava a Deus conduzia-me a essas promessas, e tudo nelas me levava a Deus.

Pode-se então calcular a dureza extrema da prova de chegar ao fim da vida e Ele me dizer: “Não verás a realização das promessas!” Quantos trabalhos perdidos, quantos esforços inutilizados, quantas dores sofridas em vão, quantas esperanças anuladas… Tudo jogado ao chão, como um lacaio que tem por missão junto ao rei carregar um jarro precioso, mas que de repente tropeça, cai e o jarro se desfaz em pedaços; o próprio lacaio se machuca e morre. No meu caso, esse “jarro precioso” era a conservação entre os homens da esperança nas promessas de Nossa Senhora.

Diante dessa perplexidade, tomei a seguinte deliberação: se Deus, por uma razão que ignoro, submete-me à monumental frustração de morrer sem que meus olhos, exaustos pela extensão da caminhada da minha vida, vejam o amanhecer das promessas, eu devo reconhecer que Ele quis me provar e que minha morte se parecerá com a do Divino Redentor, o qual, do alto da Cruz, proferiu aquele brado terrível: “Meu Deus, meu Deus, por que Me abandonaste?” (Mc 15, 34).

Aos pés da Cruz, Jesus via sua Mãe que chorava, mas tanto Ele quanto Ela Se mantiveram na perfeita obediência ao Pai Eterno: “Deus quis, Deus fez. Ainda que tudo tenha acontecido ao contrário do que esperávamos, seja Ele bendito.” Logo, bendito seja também o momento em que a meu respeito Deus decidiu: “Este homem vai sofrer o tormento do revés!”

Porque do fato de eu morrer sem ver as promessas se realizarem, dessa decepção aceita com integridade de amor e de obediência, pode resultar, para logo depois da minha morte, no começo do cumprimento das promessas.

Portanto, se eu morrer sem ver implantado o Reino de Maria, morrerei em face dele como São Francisco Xavier diante da China. A graça o convidava a conquistá-la para a Fé Católica, e Deus lhe impôs esta frustração: morrer numa ilha a caminho dela, olhando-a e rezando por ela. Pois bem, se for da vontade de Deus, morrerei antevendo o Reino de Maria e rezando por ele. Assim terei salvado a minha alma!

É possível que a fidelidade à vocação nos peça o sacrifício de termos a impressão de que toda a nossa vida foi em vão e que a Providência não atenderá a nossos anseios.

Não será que, para entrarmos no Reino de Maria, teremos de passar por provas como essa, que nos imporão, ademais, uma longa separação?

Samuel Moraes
Quando, na eternidade, Dr. Plinio compreendeu que sua missão seria cumprida, no corpo já inerte floresceu um sorriso

Estou certo de que, nas grandes provas de nossas vidas, Nossa Senhora intervirá como Mãe de um modo incomparável, dando, por exemplo, a possibilidade de nos comunicarmos, mesmo à distância, em todos os momentos. Para tais ocasiões, sugiro esta oração:

“Mãe minha, dai-me a graça de nunca me sentir longe de Vós. Porque, se é verdade que muitos estão longe, Vós, Senhora, estais sempre perto. Convencei-me de que estais ao alcance, não de mãos que se estendem, mas de mãos que se juntam para rezar seriamente.

“Fazei-me compreender esta verdade: se nunca se ouviu dizer que alguém que tenha recorrido à vossa proteção e reclamado vosso socorro fosse por Vós desamparado, não serei eu o primeiro a não ser atendido. Assim, pois, régia Senhora, fazei com que sempre me volte a Vós com confiança. Assim seja.”

A Providência poderá dispor que meus filhos espirituais se sintam longe de mim, como tantos religiosos sentiram-se longe de seus fundadores, e tenham de passar por essa sensação de abandono. Nossa Senhora, porém, nos dá esta garantia: Ela estará presente ou, pelo menos, lhes fará sentir a minha presença. De maneira que tenham a certeza: na hora decisiva, estarei junto à cama de doente de cada um, apertando-lhe a mão.4

1) Necrópole da cidade de São Paulo, localizada no Bairro da Consolação.

2) “Voz de Cristo, voz misteriosa da graça que ressoais no silêncio dos corações, vós murmurais no fundo das nossas consciências palavras de doçura e da paz” (SAINT-LAURENT, Thomas de. O Livro da Confiança. São Paulo: Retornarei, 2019, p.13).

3) Estando convalescente da crise de diabetes que o acometeu no ano de 1967, Dr. Plinio recebeu de presente uma estampa do milagroso afresco da Mãe do Bom Conselho venerado na cidade de Genazzano, Itália. Ao fitar a imagem, ele recebeu uma insigne graça mística pela qual, sem que houvesse qualquer modificação nos traços da fisionomia, Nossa Senhora com que lhe sorriu, incutindo-lhe uma profunda confiança em seu auxílio maternal.

4) Cf. Conferências de 31/5/1989, 9/10/1991, 23/1/1994 e 16/7/1994.

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