Entre tudo o que existe nesta Terra, nada Dr. Plinio amava mais intensamente que a Santa Igreja. Sempre ao escrever sobre ela, esse amor se extravasava em verdadeiros poemas, como neste artigo de 1945.

A regularidade com que se sucedem no calendário da Igreja os vários ciclos do ano litúrgico, imperturbáveis em sua sucessão — por mais que os acontecimentos da história humana variem em torno deles, e os altos e baixos da política e das finanças continuem sua corrida desordenada —, é bem uma afirmação da celestial majestade da Igreja, sobranceira ao vaivém caprichoso das paixões humanas.

Nas horas de dor, a Igreja faz brilhar a luz da esperança

Sobranceira, não porém indiferente. Quando os dias dolorosos da Semana Santa transcorrem em quadras históricas tranqüilas e felizes, a Igreja, como mãe solícita, se serve deles para reavivar em seus filhos a abnegação, o senso do sofrimento heróico, o espírito de renúncia à trivialidade quotidiana e o inteiro devotamento a ideais dignos de darem um sentido mais alto à vida humana. “Um sentido mais alto”, não é dizer bem. É o único sentido que a vida tem: o sentido cristão.

Mas a Igreja não é mãe apenas quando nos ensina a grande missão austera do sofrimento. Ela também é mãe quando, nos extremos de dor e aniquilação, ela faz brilhar aos nossos olhos a luz da esperança cristã, abrindo diante de nós os horizontes serenos que a virtude da confiança põe diante dos olhos de todos os verdadeiros filhos de Deus.

Assim, a Santa Igreja se serve das alegrias vibrantes e castíssimas da Páscoa para fazer brilhar aos nossos olhos, mesmo nas tristezas da situação contemporânea, a certeza triunfal de que Deus é o supremo Senhor de todas as coisas, de que seu Cristo é o Rei da glória, que venceu a morte e esmagou o demônio, de que a sua Igreja é rainha de imensa majestade, capaz de se reerguer de todos os escombros, de dissipar todas as trevas, e de brilhar com mais luzidio triunfo no momento preciso em que parecia aguardá-la a mais terrível, a mais irremediável das derrotas.

Renascimentos e apostasias no mundo contemporâneo

A alegria e a dor da alma resultam necessariamente do amor. O homem se alegra quando tem o que ama, e se entristece quando aquilo que ama lhe falta.

O homem contemporâneo deita todo o seu amor em coisas de superfície, e por isso só os acontecimento de superfície — da superfície mais próxima à sua minúscula pessoa — o emocionam. Assim, impressionam-no sobretudo suas desgraças pessoais e superficiais: a saúde abalada, a situação financeira vacilante, os amigos ingratos, as promoções que tardam, etc. De fato, porém, tudo isto é secundário para o verdadeiro católico, que cuida antes de tudo da maior glória de Deus e, portanto, da salvação de sua própria alma e da exaltação da Igreja. Por isso, o maior sofrimento do católico deve consistir na condição presente da Santa Igreja.

Sem dúvida, essa situação apresenta muito de consolador. Entretanto, seria um erro negar que a apostasia geral das nações continua em um crescendo assustador; que a tendência ao paganismo se desenvolve vertiginosamente nas nações heréticas ou cismáticas, que conservavam ainda alguns resquícios de substância cristã. Nas próprias fileiras católicas, a par de um renascimento promissor, pode-se observar a marcha progressiva do neopaganismo: depravam-se os costumes, limitam-se as famílias, pululam as seitas protestantes e espíritas.

Imortal, a Igreja sempre ressurge de suas provações

A despeito de tantos motivos de tristezas, de motivos que fazem pressagiar quiçá para o mundo inteiro uma catástrofe não distante, continua a esperança cristã. E a razão disto nos é ensinado pela própria festa de Páscoa.

Quando Nosso Senhor Jesus Cristo morreu, os judeus selaram sua sepultura, guarneceram-na com soldados, julgaram que estava tudo terminado.

Em sua impiedade, eles negavam que Nosso Senhor fosse filho de Deus, que fosse capaz de destruir a prisão sepulcral em que jazia, que, sobretudo, fosse capaz de passar da morte à vida. Ora, tudo isso se deu: Nosso Senhor ressuscitou sem qualquer auxílio humano, e sob seu império a pesada pedra da sepultura deslocou-se leve e rapidamente, como uma nuvem. E Ele ressurgiu.

Assim como Cristo venceu os grilhões da morte, também a Igreja imortal sempre ressurgirá de suas provações (“A Ressurreição”, esmalte pintado por Léonard Limousin – Museu do Louvre, Paris)

Assim também a Igreja imortal pode ser aparentemente abandonada, enxovalhada, perseguida. Ela pode jazer, derrotada na aparência sob o peso sepulcral das mais pesadas provações. Ela tem em si mesma uma força interior e sobrenatural, que lhe vem de Deus, e que lhe assegura uma vitória tanto mais esplêndida quanto mais inesperada e completa.

Essa é a grande lição do dia de hoje, o grande consolo para os homens retos que amam acima de tudo a Igreja de Deus: Cristo morreu e ressuscitou; a Igreja imortal ressurge de suas provações, gloriosa como Cristo, na radiosa aurora de sua Ressurreição.

(Transcrito do “Legionário”, nº660, de 1/4/1945. Títulos e subtítulos nossos)