Dr. Plinio no início da década de 1930

Dir-se-ia que uma operação de amígdalas, hoje tão simples e freqüente, não mereceria o realce desta coluna biográfica. Porém, em se tratando da vida de Dr. Plinio, até os menores fatos podem se revestir de circunstâncias e ensinamentos que lhes conferem cidadania entre os marcos de sua gesta católica. Vejamos como ele próprio narrou o acontecido:

“Nunca em minha existência encontrei mamãe tensa. Posso tê-la visto algumas vezes aborrecida, aflita por uma coisa ou outra, na perspectiva de infortúnios, sem contudo se deixar tomar de nervosismos. Lembro-me que essa atitude de Dona Lucilia me impressionou, por ocasião de um episódio à primeira vista simples, mas para ela muito importante.

Quando eu tinha uns 23 anos decidi extrair as amígdalas, e combinamos em casa de não contar a mamãe, a fim de lhe poupar uma preocupação desnecessária. Curiosamente, fiquei apreensivo, pois na véspera visitei o Arcebispo de São Paulo, Dom Duarte Leopoldo e Silva, para tratarmos de assuntos correntes de apostolado, e lhe disse:

— Sr. Arcebispo, passarei alguns dias fora, porque vou fazer uma operação de amígdalas, mas quando voltar telefono ao seu secretário para saber das novidades.

No fim do encontro, ambos já de pé, ele me surpreende com um conselho:

— Vossemecê vai mesmo fazer essa operação?

— Sim, Excelência. Está marcada para amanhã.

— No seu lugar, eu não a faria…

— Mas, por quê?

— Porque, embora não se comente, essa operação oferece riscos eminentes.

Claro, interessei-me pelo assunto:

— Qual é o perigo, Sr. Arcebispo?

— Vossemecê pode ter uma hemorragia, como eu conheço o caso de um paciente cujo sangue esguichou até o teto da sala de cirurgia, só estancado depois de muito trabalho dos médicos. Mas, nem sempre se consegue…

Percebi que Dom Duarte realmente não queria que eu me submetesse àquela operação. Porém, como nossa obediência à disciplina eclesiástica não chega a tanto, eu era propenso a fazê-la, e assim procedi. Na manhã seguinte me dirigi ao hospital, onde me esperava o marido de uma tia minha, médico dermatologista, o qual assistiria à cirurgia. Acertamos que, tudo terminado, ele se dirigiria à minha casa, e só então comunicaria o fato a mamãe.

Esta ainda se achava deitada quando recebeu o aviso. Muito impressionada, levantou-se imediatamente, aprontou-se, tomaram o automóvel e foram juntos para o hospital. Ali se despediram e Dona Lucilia entrou no meu quarto. Quando nos encontramos, ela me acariciou muito e, após verificar meu bom estado de saúde, sentou-se e passou a me contar como recebera a notícia da operação. Observando-a enquanto falava, tornou-se-me patente essa disposição dela: estava na pós-aflição e, portanto, meio traumatizada pelo caso. Porém, em nada tensa. Não havia tido tensão alguma.

Quer dizer, sua atitude denotava muita confiança: ‘Era preciso que isso acontecesse; aconteceu. De um jeito ou de outro, Nossa Senhora sempre nos ajudará, e assim se vive’…”