Pregação de Nosso Senhor - Igreja do Sagrado Coração de Jesus, Montréal, Canadá

Quem deseja salvar o próximo, conduzindo-o pelo caminho que leva ao Céu, deve se empenhar em estimular nele suas boas inclinações, e em combater aquelas que o impelem para o mal. Agindo assim, explica Dr. Plinio, o católico trabalha para favorecer a verdade, o bem e o belo, e contribui para remodelar a sociedade de acordo com os desígnios de Deus, tanto nos seus aspectos espirituais, quanto nos materiais.

Em anterior exposição consideramos a razão de ser do mando nas relações humanas, como decorrendo e dependendo do mando superior do Papado infalível, a serviço do qual deve estar ordenado.

O mando posto a serviço da Igreja

Compreendo que alguém poderia levantar a seguinte objeção: “Dr. Plinio, esse princípio de autoridade evocado pelo senhor parece um tanto exagerado, pois não se pode pretender que, por exemplo, um dono de empresa de ônibus, cujo objetivo primordial é transportar pessoas, tenha a preocupação de servir a Igreja. Como uma coisa se relaciona com outra?”

De fato, é necessária uma certa elasticidade de espírito para bem entender o assunto.

Na verdade, o fim imediato de uma companhia de transporte é conduzir passageiros. Porém, o seu proprietário deve se compenetrar de que, antes de tudo, ela existe para prestar serviço à Igreja Católica. Como?

Por exemplo, não permitindo em seus veículos propagandas obscenas nem situações que agridam a moral e os bons costumes. Dessa forma, combateriam eficazmente o mal e favoreceriam a difusão do bem, e nisto estariam prestando inestimável serviço à Igreja, guardiã da virtude e da salvação das almas.

A exemplo do Divino Mestre, todo católico deve ser apóstolo e modelo para o próximo, procurando evangelizá-lo e conduzi-lo pelas vias da Igreja

Eco da voz de Deus, o católico deve ser respeitado e seguido

Vale lembrar que os donos das empresas de ônibus, assim como os motoristas, os cobradores, os passageiros, todos existem para a expansão da fé, pois nossa primordial finalidade é amar, servir e glorificar ao Criador. Em medida maior ou menor, conforme as circunstâncias e obrigações de seu estado, todo católico deve ser apóstolo, procurando evangelizar o próximo e conduzi-lo pelas vias da Igreja.

Nessa missão, tendo ele possibilidade de dar ordens a outros, exerce, em certo sentido, um mando. Os problemas que encontra para realizar seu apostolado se assemelham às dificuldades com as quais se depara quem governa e, embora muitas vezes não possua propriamente autoridade, sua voz é um eco da voz de Deus, e por isso deve ser respeitado e atendido.

Através do mando, uma renovação da face da Terra

Cumpre considerar, entretanto, que as pessoas têm tendências para o bem e para o mal, e quem deseja exercer a missão de salvá-las, levando-as para o Céu, deve procurar estimular nelas, continuamente, suas inclinações e convicções para o bem, e combater as que as empurram para o mal.

Agindo assim, o católico trabalha para favorecer a verdade, o bem e o belo, contribui para remodelar a sociedade de acordo com os planos de Deus, seja nos seus aspectos espirituais, seja nos materiais.

Compreendido dessa forma, o mando é, mais do que tudo, uma ação pela qual os homens empreendem todo o possível para contrariar a influência do mal e para promover a virtude, a beleza, a bondade, sob os auspícios da Igreja, almejando a tão necessária renovação da face da Terra.

Mestre e modelo para os outros

Há, ainda, outro aspecto desse tema que merece ser analisado.

Em relação ao seu próximo, todo homem desempenha um papel que se pode qualificar de mestre e modelo. Esses substantivos não são escolhidos a esmo, mas intencionalmente. Um interlocutor talvez me perguntasse: “E se uma pessoa é muito mais moça que a outra, ou teve menos ocasião de cultivar seu espírito, ou é inferior a qualquer título, como será mestre de seu superior?”

Respondo, dizendo que o exemplo dado pelo menor muitas vezes comove o maior, e se este leva uma vida desregrada, poderá se converter e abraçar o bom caminho.

Seja como for, cada um de nós acaba sendo mestre em relação a outro, ou seja, devemos saber, pelo uso da palavra, conduzi-lo ao verum, bonum, pulchrum: à verdade, ao bem e à beleza. Trata-se de um modo de mandar, no sentido de atuar sobre sua inteligência, fazendo-o entender o que ele não compreendia, por meio de uma frase ou um raciocínio expressos com a maior clareza e da maneira menos tediosa possíveis.

O exemplo arrasta

Tratemos da condição de modelo.

Pareceria, sobretudo para os espíritos “quadrados”, que basta cada um de nós ser mestre em relação ao próximo. Julgam que, com uma explicação teórica bem feita, convence-se qualquer pessoa.

“O bem espiritual que nos proporcionou a figura daquela senhora idosa, ungida de bondade e virtude, ainda repercute como o eco de um sino que custa a emudecer…”

M. Shinoda
Acima, altar-mor do Convento da Luz, em São Paulo; na página 12, Dr. Plinio aos 85 anos

Ora, quando ouvimos a leitura do Evangelho, percebemos o que há de maravilhoso em Nosso Senhor Jesus Cristo exercendo sua missão como divino Mestre. E alguém poderia se perguntar: “Quando Jesus veio à Terra, não bastaria que fosse conhecido apenas por duas ou três pessoas, às quais Ele ditasse sua doutrina e depois retornasse ao Céu?”

Não. Era necessário vê-Lo vivo, como modelo daquilo que Ele mesmo havia ensinado. Diz um conhecido provérbio: Verba volant, exempla trahunt — as palavras ­voam, os exemplos arrastam. Quer dizer, não é suficiente falar ou escrever para mover as pessoas. Importa dar-lhes o exemplo. Mais do que a leitura de um tratado de moral, o exemplo vivo de um ato de virtude serve como modelo, completa o efeito da palavra e pode arrastar as pessoas a segui-lo.

T. Ring

Se, nessa exposição, através de minhas palavras e meu exemplo, estou edificando meus ouvintes, amanhã esse dínamo (na falta de comparação mais adequada) de amor de Deus, dedicação, entusiasmo, etc., aqui existente, funcionará melhor e se multiplicará por trezentos ou mais, conforme o número de pessoas reunidas diante de mim.

Compreendemos, desse modo, a eficácia do exemplo, do modelo, da ação de presença que completa a palavra e sem a qual esta última produziria resultados menores.

Uma anciã tocada pela graça…

Gostaria de encerrar essas reflexões narrando um episódio que bem ilustra nossos comentários.

Certo dia, acompanhado de um membro do nosso movimento, visitei a igreja da Luz, no Mosteiro das Concepcionistas, e ali permanecemos algum tempo em oração. Estávamos adorando o Santíssimo Sacramento no tabernáculo, e também contemplando a bela imagem de Nossa Senhora que se ergue acima do altar-mor, quando entra uma anciã e se ajoelha junto a um altar lateral, em honra a Santo Antônio.

Continuamos a rezar e, em determinado momento, meu acompanhante fez-me um sinal para que eu observasse a velha senhora. Reparei então que, penetrando através de uma janela, um raio de sol a iluminava, dando a impressão profunda de que ela era ouvida em suas preces e recebia uma graça especial. Esta a tornava tão recolhida, suave, benfazeja, que seu chapéu de veludo preto desbotado, e sua roupa já gasta pareciam renovados e reluzentes.

Encantados, ficamos algum tempo olhando para a velhinha, a qual se achava tão absorta em suas preces que não prestou atenção em nós. Ela não nos viu, mas foi observada por dois servidores de Nossa Senhora, e um deles narraria o fato a um auditório repleto de outros devotos da Santíssima Virgem.

Talvez essa boa anciã já tenha morrido, mas o bem feito por ela, por sua figura ungida de bondade e virtude, ainda repercute como o som de um sino que se prolonga, custando a emudecer.

Eis um lindo exemplo de apostolado de presença. Aquela velha senhora foi, a seu modo, mestra e modelo para os dois que, enlevados, a observaram imersa em oração.