Dona Lucilia em 1912

Pelo afeto com que Dona Lucilia tratava Dr. Plinio desde o berço, ele conheceu a bondade de Nossa Senhora e do Sagrado Coração de Jesus.

Durante as reflexões que, por ocasião de minha doença1, fiz sobre Nossa Senhora de Genazzano, me chamou muito a atenção a inteira intimidade do Menino Jesus com Maria Santíssima. Ele até passa a mão por trás do pescoço d’Ela.

Respeito, admiração, veneração e ternura

E me lembrava da intimidade que eu tinha com a minha querida e saudosa mãe, uma intimidade tão cheia de respeito, de admiração, de veneração e de ternura, mas uma verdadeira intimidade. Ela sabia ser pequena, afável, meiga ainda quando eu era um menino que dependia completamente dela.

Por isso, desde os meus primeiros dias, eu a chamava de “mãezinha”; não sabendo falar bem, eu dizia “manguinha”, mas já era a ideia do que havia nela de miúdo, de pequeno, de proporcionado a mim, de exorável por mim, de compassivo para comigo. Era a ideia que brotava em mim de toda a mansidão e bondade dela. A bondade de Dona Lucilia foi para mim o modo pelo qual eu conheci a bondade de Nossa Senhora e do Sagrado Coração de Jesus.

Do que minha mãe me legou, as duas coisas mais preciosas que eu conheço na ordem moral, não na ordem religiosa, foram exatamente, de um lado, a bondade e, de outro lado, a severidade sábia.

Mesmo na hora de perdoar as coisas em que eu andava mal, mamãe manifestava indulgência e suavidade. Jamais entrava reivindicação de um direito dela

Mamãe era tão bondosa que eu nem saberia dizer! Mesmo na hora de perdoar as coisas em que eu andava mal, ela manifestava uma indulgência, uma suavidade, e nunca uma reclamação porque algo a tivesse atingido. Portanto, jamais entrava reivindicação de um direito dela.

Os pitos de Dona Lucilia

Por possuir a cultura de uma senhora de antigamente, mamãe nem saberia bem explicitar um princípio, mas tinha os princípios em seu espírito.

Assim, nunca o pito dela era motivado por uma irritação pessoal, mas por um princípio ofendido, inclusive o da autoridade materna, e sempre com tanta bondade, tanto perdão, tanta paciência no que dizia respeito a ela. O que, em menino, eu fizesse de pior, ou outras pessoas faziam de horrível para mamãe — e que eu presenciava —, enquanto coisa ofensiva para ela, Dona Lucilia engolia quietinha e não dizia uma palavra.

Como eu me lembro dos pitos dela! Que seriedade no olhar, que compenetração de que se tratava de fazer prevalecer um princípio! Que convicção de que, se não conformasse minha vida com aqueles princípios, para ela eu valeria muito menos! Mamãe via em mim mais o filho que devia amar os princípios, do que o filho que precisava querer bem a ela.

Algumas das últimas fotos tiradas de Dona Lucilia, poucos meses antes de seu falecimento, em 1968

E quanta sabedoria no que ela dizia! Que voz grave! E ao mesmo tempo a bondade não estava ausente. A intransigência dela para comigo chegava a esse ponto; acho que já contei isso aqui, mas estou me expandindo um pouco.

De larvas que somos, Nossa Senhora nos transformará em crisálidas

Uma vez — foi o apogeu de minha vida colegial, mas nunca fui o primeiro de minha sala de aula — eu voltei da festa de distribuição de prêmios no Colégio São Luís, com quatro medalhas no peito; os meninos vinham na rua ostentando as medalhas, naqueles tempos ingênuos.

Lembro-me que eu vestia traje marinheiro; mamãe abriu a porta de casa e me agradou, foi uma alegria.

No ano seguinte regressei com três medalhas; ela abriu a porta, olhou e disse:

— Só três?

Mas, intransigente. E acrescentou:

— O que aconteceu para você decair?

Dizia isso misturado com tanto afeto, que posso afirmar ter sido uma preparação para eu compreender o que era a misericórdia de Nossa Senhora.

Muitos dos que estão aqui a conheceram — alguns até bem de perto — e poderão achar que há exagero no que eu digo, mas não que existe uma invenção.

Não quero dizer que as mães dos presentes neste auditório não lhes tenham ensinado isso; também não desejo afirmar que eu tenha aprendido inteiramente o que ela me ensinou. Falo isso para exemplificar um pouco o que estou pensando.

E não sinto que nossa devoção à Santíssima Virgem seja inteiramente assim. Neste sentido, nós somos ainda como larvas que se vão arrastando pelo chão até o momento em que Maria Santíssima nos transforme em crisálidas.

(Extraído de conferências de 6/5/1968 e 18/6/1968)

1) Diabetes, cuja crise durou de dezembro 1967 a maio de 1968.

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