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Certa ocasião, refletindo a respeito das penas do Inferno, passou-me pela mente a ideia, transformada desde logo em convicção, de que ao ser condenada, a alma é expulsa da Igreja Católica Apostólica Romana. Apesar de ter pensado em todos os horrores do Inferno, nenhum deles amedrontou-me tanto quanto a hipótese de ser expulso da Igreja Católica. Pareceu-me, naquele momento, que sofrer tudo aquilo, mas continuar na Igreja era muito menos dolorido do que não sofrer nada estando, porém, fora dela. Por aí se pode medir bem o quanto Nossa Senhora me ajuda a prezar a graça inestimável de ser filho da Santa Igreja Católica.

Por minha natureza, sou uma pessoa tranquila e equilibrada. Entretanto, creio que se eu não fosse católico, teria ficado louco, pelo próprio fato de ser calmo, tranquilo, lúcido e ter podido avaliar, portanto, até que extremo vai a miséria de quem não encontra para os enigmas da vida uma explicação como a que é dada a quem pertence à Igreja Católica. É só olhar pelos prismas da Santa Igreja esses incontáveis problemas entrelaçados, terríveis, de recíprocas interações dilacerantes, que tudo se explica. Tudo reluz de verum, bonum e pulchrum, têm-se ânimo e coragem para tudo. E, ao expirar, morre-se tranquilo, mesmo no seio dos mais terríveis fracassos terrenos, porque se sabe que a Terra é efêmera, a eternidade é que fica.

Considerem todos os deleites e graus de felicidade de que uma alma é capaz no mundo, tudo isso é nada em comparação com a felicidade do menor dos católicos membros da Igreja Gloriosa, e que celebra a sua vitória eterna no Céu. Tudo quanto o homem pode ter de alegria, beleza, bem-estar, grandeza, em graus diversos, os bem-aventurados possuem numa plenitude incomparável, porque cada um está em contato direto com Deus.

Sem dúvida, o Céu Empíreo dará aos seus corpos uma felicidade que completará a que gozam na alma, mas nada é igual à seguinte felicidade: “Eu sou membro da Igreja, filho de Deus, em mim está uma participação da natureza divina, e por toda a eternidade serei um príncipe neste Céu, onde os menores são príncipes.”

Meu desejo é que todos os que recebemos a graça inefável do Batismo vamos para o Céu, onde nos lembraremos do nosso Batismo com amor indizível. Chego a pensar se Deus, depois de ter incendiado todo o orbe, conservará alguns objetos especialmente relacionados à salvação dos bem-aventurados, e se em algum lugar serão guardadas as pias batismais que os desastres dos acontecimentos humanos não tenham destruído. De maneira que, por exemplo, seja-me dado, de vez em quando, descer à Terra e visitar a pia batismal da Igreja de Santa Cecília, junto à qual o caminho do Céu se abriu para mim.

Nessa ocasião, cada um de nós será um ente glorioso, com corpo e alma, pois teremos ressuscitado, e iremos – com que alegria e suavidade de alma! – oscular a pia batismal e louvar aquele momento bendito em que o padre disse: “Eu te batizo em nome do Pai e do Filho e do Espírito Santo”; e as portas do Céu se abriram, o sol de Deus entrou e, por assim dizer, a eternidade começou.*

* Excertos da conferência de Dr. Plinio em 7/6/1991, por ocasião do 82º aniversário de seu Batismo.