“Um homem tinha dois filhos. O mais moço disse a seu pai: Meu pai, dá-me a parte da herança que me toca. O pai então repartiu entre eles os haveres. Poucos dias depois, ajuntando tudo o que lhe pertencia, partiu o filho mais moço para um país muito distante, e lá dissipou a sua fortuna, vivendo dissolutamente. Depois de ter esbanjado tudo, sobreveio àquela região uma grande fome e ele começou a passar penúria. Foi pôr-se ao serviço de um dos habitantes daquela região, que o mandou para os seus campos guardar os porcos. Desejava ele fartar-se das vagens que os porcos comiam, mas ninguém lhas dava” (Lc 15,11-16).

Bem conhecida de todos é a parábola do filho pródigo. Dr. Plinio a tinha em alta consideração, não apenas porque ela reflete a condição daqueles que, extraviados, voltam à prática da fé, mas sobretudo por sua aplicação a países, a conjuntos de nações e à própria Cristandade. Correlacionando-a com a dramática situação na qual derrapou o Ocidente, ele prognosticava em 1958:

“Um profundo, um imenso, um indescritível mal-estar se vai apoderando do mundo. É um mal-estar muitas vezes inconsciente, que se apresenta vago e indefinido até mesmo quando é consciente, mas que ninguém ousaria contestar. Dir-se-ia que a humanidade inteira sofre violência, que está sendo posta em uma fôrma que não convém à sua natureza, e que todas as suas fibras sadias se contorcem e resistem. Há um anseio imenso por outra coisa, que ainda não se sabe qual é. […] O mundo inteiro geme nas trevas e na dor, precisamente como o filho pródigo, quando chegou ao último da vergonha e da miséria, longe do lar paterno. […] A experiência nos mostra que é de descontentamentos assim que nascem as grandes surpresas da História. À medida que a contorção se acentuar, acentuar-se-á o mal-estar. Quem poderá dizer que magníficos sobressaltos daí podem provir?”*

Um ano mais tarde, Dr. Plinio se expressava com clareza ainda maior:

“Segundo a História, afigura-se que as grandes conversões se dão o mais das vezes por um lance de alma fulminante, provocado pela graça ao ensejo de qualquer fato interno ou externo. […] Deus, embora não as prive [as almas] jamais da graça suficiente, espera, não raramente, que cheguem ao mais fundo da miséria, para lhes fazer ver de uma só vez, como num fulgurante ‘flash’, a enormidade de seus erros e de seus pecados. Foi quando desceu a ponto de querer se alimentar das bolotas dos porcos que o filho pródigo caiu em si e voltou à casa paterna.”

Ao adentrarmos 2003, cabe-nos perguntar se as circunstâncias não estão maduras para que o “filho pródigo” se ponha a refletir sobre seus desvios e se lembre da mansão paterna, despertando no fundo da alma saudades indizíveis. Quiçá desde esse momento até a hora da conversão haja apenas um curto espaço de tempo, durante o qual ainda deva enfrentar grandes provações. “De qualquer maneira, com mais ou com menos sofrimentos para os homens, o Coração de Maria triunfará” — concluía Dr. Plinio suas conjecturas de 1958, apontando para a promessa de Nossa Senhora em Fátima.

Enquanto o horizonte vai se carregando de negras nuvens, perpassadas no entanto por grandes clarões de esperança, apresenta-se cada vez mais premente a questão: estará próxima uma conversão das nações? Terá chegado a hora, tanto ansiada por Dr. Plinio, da volta do “filho pródigo” à casa paterna?

Rezemos e aguardemos.

* As citações são respectivamente de “Catolicismo”, fev./1958 e Revolução e Contra-Revolução, parte II, cap. 8, 3.