Há cento e cinqüenta anos, na manhã do dia 8 de dezembro, o Papa Bem-aventurado Pio IX proclamava o Dogma da Imaculada Conceição. Do alto deste Sinai do Novo Testamento que é a Cátedra Infalível da Verdade, o Pontífice declarou: “A doutrina que defende ter sido a Beatíssima Virgem Maria preservada de toda a mancha do pecado original, desde o primeiro instante da sua concepção, por singular graça e privilégio de Deus onipotente e em atenção aos merecimentos de Jesus Cristo salvador do gênero humano, foi revelada por Deus e, portanto, deve ser crida firme e inviolavelmente por todos os fiéis” 1.

Dando início às celebrações dessa magna data mariana, quis o Papa João Paulo II honrá-la com sua recente peregrinação ao Santuário de Lourdes, onde, quatro anos após aquela declaração dogmática, Nossa Senhora apareceu a Santa Bernadette Soubirous, dizendo-lhe (no dialeto local): “Eu sou a Imaculada Conceição”. Era, pelos próprios lábios da Rainha do Céu, uma espécie de ratificação da sentença pontifícia.

Mais. O milagre de Lourdes corroborando o dogma, afirmará Dr. Plinio em memorável artigo, representava uma retumbante vitória do bem sobre o mal, da Contra-Revolução sobre a Revolução, abrindo as vias para a implantação do Reino de Maria neste mundo:

“Ver um Vigário de Jesus Cristo erguer-se na plenitude e na majestade de seu poder, para proclamar um dogma em pleno século XIX, era presenciar um desafio admiravelmente sobranceiro e arrojado ao ceticismo triunfante, que já então corroía até as entranhas a civilização ocidental. (…)

“E não estava só nisto o que ousaríamos chamar o sal do glorioso acontecimento da definição do dogma. É impossível pensar na Virgem Imaculada sem ao mesmo tempo lembrar a serpente cuja cabeça Ela esmagou triunfal e definitivamente com o calcanhar. (…) Ora, ver assim afirmada [a apoteose] de sua máxima, de sua invariável, de sua inflexível inimiga, era, para o poder das trevas, a mais horrível das humilhações. De onde um concerto de vozes humanas e rugidos satânicos por todo o mundo, semelhante a uma imensa e fragorosa tempestade. Ver que contra essa tempestade de paixões inconfessáveis, de ódios ameaçadores, de desesperos furiosos, se erguia só, e intrépida, a figura majestosa do Vigário de Cristo, desarmada de todos os recursos da Terra e fiada apenas no auxílio do Céu, era fonte, para os verdadeiros católicos, de um júbilo igual ao que sentiram os Apóstolos vendo erguer-se, na tempestade desencadeada sobre o Lago de Genesaré, a figura divinamente varonil do Salvador, a comandar soberanamente os ventos e o mar: ‘Venti et mare oboediunt ei’ (Mt 8, 27).

“Assim como diante dos hunos se deixaram derrotar ou debandaram todos os generais e governadores do Império Romano, assim também, diante da Revolução, estavam em deplorável derrota ou debandada, em número incontável, os que na sociedade temporal deveriam defender a Igreja e a civilização cristã.

“Nesta situação, de uma nobre e solene dramaticidade, Pio IX, como São Leão Magno, era o único a enfrentar o adversário e a lhe impor a retirada. Recuar? A proposição parece ousada. Entretanto, nada mais verdadeiro. A partir de 1854, a Revolução começou a sofrer suas grandes derrotas.

“É certo que, na aparência como na realidade, ela continuou a desenvolver seu império sobre a Terra. O igualitarismo, a sensualidade, o ceticismo foram alcançando vitórias sempre mais radicais e extensas. Mas algo de novo surgiu. E este algo, que é modesto, apagado, insignificante de aspecto, por sua vez vem crescendo incoercivelmente e acabará por matar a Revolução. (…)

“O que quer dizer, afinal, que de acordo com a Mensagem de Fátima, os dias do domínio da impiedade estão contados. A definição do dogma da Imaculada Conceição marcou o início de uma sucessão de fatos que conduzirá ao Reinado de Maria.” 2

1) Bula Ineffabilis Deus, de 8/12/1854; 2 ) Catolicismo, nº 86, fevereiro de 1958.