Dona Lucilia aos 91 anos

Há dez anos, em abril de 1998, vinha a lume a primeira edição da revista “Dr. Plinio”, destinada a dar a conhecer a vida e ensinamentos de Plinio Corrêa de Oliveira, sua vida, como também sua vasta obra de varão católico, apostólico e plenamente romano.

Apesar de nos encontrarmos na publicação deste 121º número, em meio ao abundante tesouro do pensamento e das explicitações de Dr. Plinio, continua ainda o embaraço da escolha…

Profundamente reconhecidos, pois, pelo infalível amparo da Santíssima Virgem que até aqui nos tem assistido, de toda a alma esperamos que este significativo marco editorial se multiplique pelos tempos vindouros.

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Por uma particular concordância de datas, este décimo aniversário coincide com os 40 anos do passamento de Dona Lucilia, mãe de Dr. Plinio, à qual ele tributou entranhado amor de filho, tendo-a como exemplo de alma cristã e como apoio no quotidiano de seu apostolado.

Naquela manhã de 21 de abril de 1968, após fazer um grande Sinal da Cruz, Dona Lucilia — como mais tarde diria alguém — “saía com majestade de uma vida que soube levar com honra”. Conservou em seus últimos instantes a mesma serenidade com que, durante nove décadas, arrostara muitos sofrimentos, sem surpresa nem inconformidade.

Para Dr. Plinio, a despedida não significou propriamente um adeus, pois a sentiu sempre presente junto a si, conforme ele mesmo se comprazia em frisar:

“Na hora do corpo de mamãe deixar a casa em direção ao cemitério, comecei a sentir que o apartamento estava todo impregnado da presença dela, como se ainda estivesse lá. Essa ação de presença suave, essa forma de tranqüilidade post mortem que ela me comunicou, dentro da existência e das condições comuns do dia-a-dia, tudo tão normal, tão corrente, tão autêntico, representa para mim uma fonte de contínua alegria.

“Eu peregrinei dentro do olhar dela, feito de doçura, desde os meus primeiros olhares de criança recém-nascida, até o derradeiro olhar do último ‘boa noite’, depois do qual não nos vimos mais em vida. Eu, que tanto amei essa doçura, que tanto fiz dela um gáudio, uma razão de bem-estar para minha vida, sinto-a pairar ainda a todo momento na casa, que é dela, não minha.


“Dona Lucilia se foi, mas nunca deixei de sentir sua presença junto a mim, como a sentia quando era viva. E, devo dizer, durante o nosso convívio terreno, esse sentimento se enriquecia por uma peculiar consonância entre o espírito de mamãe e a atmosfera da igreja do Coração de Jesus. Não posso me esquecer de quando, durante a Missa ou uma visita ao Santíssimo Sacramento, ajoelhava-me ao lado dela e, observando-a, notava como se embebia daquela atmosfera da igreja, quase como se fosse uma segunda natureza.

“De tal maneira que, ao retornarmos à casa, um ambiente digno, porém sem a espiritualidade própria ao edifício sagrado, eu pensava: ‘É pena que minha casa não possa ser como a igreja’. Contudo, ao ver mamãe caminhar de um lado para outro, eu me dava conta: ‘Bem, mas é como se um raio de luz da igreja reluzisse por aqui…’

“E é interessante que, quando eu precisava me ausentar em viagens curtas ou longas, separando-me de Dona Lucilia, consolava-me a idéia de que a lembrança dela e a do ambiente da Igreja do Sagrado Coração de Jesus me acompanhariam. E que assim eu conservaria na minha memória uma espécie de presença dela, tão grata, tão afim comigo, que não representaria para mim propriamente uma separação.

“Nesse caso, o provérbio francês tão adequado — partir, c’est mourir un peu1 — não se aplicava. Partir era apenas tomar distância. E no outro extremo da distância estava ela e, sobretudo, a Igreja do Sagrado Coração de Jesus…”2

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Com as vistas postas no benefício espiritual que essas e outras tocantes recordações propiciarão às almas de nossos leitores, rendemos nestas páginas uma penhorada homenagem a Dr. Plinio e à sua querida mãe, Dona Lucilia.

1) Partir é morrer um pouco.

2) Conferências em 7/5/1977, 21/4/1981 e 22/4/1983.